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Por que reduzir o imposto de renda é ruim do ponto de vista fiscal?

Corte no imposto de renda pode ser popular, mas não faz sentido do ponto de vista econômico; recursos poderiam ser usados para aliviar a Previdência e incentivar a criação de novos postos de trabalho

Por The Economist
Atualização:

Uma das mais surpreendentes políticas adotadas pelo governo de coalizão britânico nos últimos anos é a ampliação da faixa de isenção do imposto de renda. Desde 2010, o valor a partir do qual os contribuintes começam a pagar imposto no Reino Unido passou de 6,5 mil libras (US$ 9,6 mil) em 2009, para 10 mil libras (US$ 15 mil) no ano passado. O orçamento deste ano, divulgado em 18 de março pelo ministro das finanças George Osborne, prevê que a faixa de isenção será ampliada em mais mil libras (US$ 1,5 mil) até 2017, a um custo de 2,7 bilhões de libras (US$ 4 bilhões) para o Tesouro. "Trata-se de um corte de impostos que beneficiará 27 milhões de pessoas, isentando quase 4 milhões, entre os que ganham menos, do recolhimento do imposto de renda", disse Osborne.

À primeira vista, parece estranho que um governo empenhado em implementar medidas de austeridade fiscal tão severas tenha encontrado espaço para fazer cortes tributários. A explicação está no fato de que o ônus da arrecadação vem sendo discretamente transferido das contribuições diretas para as indiretas, e isso ao ritmo mais acelerado desde a década de 1980. Majorações tributárias que somam 64 bilhões de libras (US$ 95,1 bilhões) tiveram como contrapartida uma redução equivalente a 48 bilhões de libras (US$ 71,3 bilhões).

Governo britânico beneficiará 27 milhões de contribuintes com cortes no imposto de renda Foto: The Economist

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O entusiasmo do governo com a elevação da faixa de isenção do imposto de renda advém da popularidade da medida. Quase 83% dos eleitores apoiam a ideia, segundo levantamento divulgado em 18 de março pelo instituto de opinião YouGov. Desde o início, foram os liberais democratas que mais ferrenhamente defenderam a implementação dessa política no interior do governo. A elevação do teto de isenção fiscal para 10 bilhões de libras foi a primeira das promessas assumidas no manifesto propagandeado pelo partido nas últimas eleições gerais. Agora, tanto os conservadores, como os liberais democratas assumiram o compromisso de que, se reeleitos, isentarão totalmente do recolhimento de imposto de renda as pessoas que ganham até o teto de 12,5 mil libras - um valor que corresponde, grosso modo, ao auferido por aqueles que ganham um salário mínimo.

Embora seja uma arma eleitoral poderosa, ampliar ainda mais a faixa de isenção já não trará benefícios para os contribuintes das faixas de renda mais baixas. A maior parte do último pacote de bondades irá para os 50% mais ricos ou para grupos como os aposentados que não trabalham (ainda que na faixa, porcentualmente pouco significativa, das famílias mais endinheiradas, os contribuintes não tenham direito a isenção). E, no ano passado, os 17% mais pobres entre os assalariados simplesmente não recolheram imposto de renda. Em suma, é um corte tributário que, embora disfarçado de operário, beneficia essencialmente a classe média.

E é uma política que já não faz o menor sentido, pois, ao reduzir o número de pessoas que contribuem com o Tesouro, acabou concorrendo para a atual desaceleração no ritmo de crescimento da arrecadação tributária. Além disso, representa um subsídio maior aos trabalhadores autônomos, cujas contribuições previdenciárias são menores, distorcendo o regime de incentivos no mercado de trabalho.

Seria mais razoável usar essa renúncia fiscal para elevar o piso das contribuições previdenciárias. Como um porcentual dessas contribuições é pago pelos empresários, a redução nos encargos os estimularia a criar mais empregos. Em meados do ano passado, o ministro Osborne até cogitava uma fusão dos dois sistemas. Dificuldades práticas e a proximidade das eleições gerais, a serem realizadas em maio, fizeram com que os planos de reformar a Previdência fossem para o espaço. Infelizmente, a redução no imposto de renda é uma arma eleitoral mais poderosa.

© 2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.

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