Preço de passagens aéreas nas alturas frustra planos de quem sonha em voltar a viajar

Demanda reaquecida e querosene de aviação mais caro por conta da guerra na Ucrânia provocam aumentos de até 62% nos bilhetes este ano

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Por Márcia De Chiara
5 min de leitura

O sonho do casal de professores Rafael e Natália Sassi de viajar pela primeira vez para fora do País teve de ser novamente adiado. Em janeiro de 2021, eles tinham comprado um pacote de viagem de sete dias para o Chile. Próximo do embarque, a viagem foi cancelada devido às restrições sanitárias sob a pandemia. A saída foi trocar a viagem do Chile pelo Nordeste.

“Com a queda do câmbio nas últimas semanas e a flexibilização das regras sanitárias, a gente se animou em ir para fora do País”, conta Rafael. Eles procuraram a agência na qual tinham um crédito de R$ 4,5 mil por conta da troca do pacote. O destino escolhido foi Bariloche, na Argentina. Mas os novos planos também foram frustrados.

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Sonho de viagem internacional do casal Sassi já foi adiado duas vezes Foto: Taba Benedicto/Estadão

Pela viagem de sete dias a Bariloche, o casal teria de gastar quase R$ 20 mil. No ano passado, o custo dessa viagem girava entre R$ 14 mil e R$ 16 mil, segundo cotações da época. Mais uma vez, o casal trocou o destino internacional pelo nacional para encaixar a viagem no bolso. Em julho, embarcam para Lençóis Maranhenses (MA), viagem que, entre hospedagem, passagens e passeios, saiu por R$ 10 mil. “Desta vez adiamos o sonho de ir para fora por causa da passagem aérea, que está bem cara.”

Depois de dois anos de pandemia, muitos brasileiros, assim como Rafael e Natália, voltaram a planejar longas viagens. No entanto, foram surpreendidos com a disparada do valor das passagens aéreas. Em março ficou nítido o estrago que a guerra entre Rússia e Ucrânia provocou na cotação do petróleo, a base do querosene usado pelos aviões.

Maiores aumentos

Entre janeiro e março, os preços médios dos bilhetes de ida e volta para os destinos nacionais mais procurados subiram até 62% e os de rotas internacionais, até 32%, segundo o site de busca Kayak. O destino nacional com maior reajuste foi Brasília, com preço médio do bilhete de R$ 1.058 em março. Barcelona, na Espanha, ficou no topo da lista dos aumentos das rotas internacionais, com tarifa média de R$ 4.541 no mês passado.

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Pesquisa da Decolar, agência virtual, mostra que, de fevereiro para março, o preço médio das passagens aéreas internacionais mais buscadas, partindo dos aeroportos de São Paulo, registrou alta de até 22%. A passagem para Orlando, nos EUA, teve o maior aumento. O preço médio do bilhete de ida e volta em março era de R$ 2.075,71. Para os destinos nacionais, a alta do preço das passagens foi de até 40% no mesmo período, encabeçada por Recife (PE), com tarifa de R$ 559,82.

A inflação das passagens aéreas medida pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fipe entre janeiro e março atingiu 6,02% - mais da metade da alta foi em março (3,55%). “Teve um baita aumento de custos, o combustível de aviação subiu muito, mas, no fundo, subiu muito a procura por viagens também”, diz o coordenador do IPC da Fipe, Guilherme Moreira. Com custos pressionados, este aumento de demanda é a oportunidade para as companhias aéreas recuperarem margens, observa.

Passagens aéreas estão entre 32% (internacionais) e 62% (nacionais) mais caras Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Segundo a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), a justificativa para a disparada de preços das passagens é o peso do querosene de aviação, derivado do petróleo que responde por 40% dos custos das companhias. Em 2021, o preço do combustível subiu 92% e, neste ano, impulsionado pela guerra, aumentou mais 38%. Em 15 meses, a alta foi um pouco mais de 140% no principal custo. “Esta é a causa fundamental para o aumento das passagens”, diz Eduardo Sanovicz, presidente da Abear.

Demanda reprimida

Agências de turismo observaram nos últimos meses uma descompressão da demanda por viagens que havia sido reprimida pela pandemia, especialmente entre os endinheirados.

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Voltada ao público de maior renda, a Cactus Travel, de Jundiaí (SP) registrou salto nas vendas nunca visto em quase 30 anos. Alexandre Rossi, proprietário da agência, diz que nos últimos três meses a demanda por destinos nacionais aumentou 50% e a para viagens ao exterior mais do que dobrou. 

“Quem foi no ano passado para Gramado (RS), Fortaleza (CE), por exemplo, e sempre costumava ir para Nova York e Paris, quer viajar e não se importa com o valor da passagem”, diz o empresário. Ele lembra que vários países deixaram de exigir o teste de PCR contra covid-19 e o câmbio também recuou. Nos pacotes internacionais vendidos pela agência para julho, a maior dificuldade hoje é conseguir passagem em classe executiva e vaga em hotéis cinco estrelas. “O mercado de luxo está arrebentando, mas não deixo de vender pacotes baratos também.”

Daniela Araújo, diretora de voos da Decolar, concorda com Rossi. Mesmo com o aumento das passagens, ela observa que, entre o público em geral, há mais gente disposta a viajar e fazer adaptações para driblar os aumentos e viabilizar a viagem. Na forma pagamento, por exemplo, parcelando no boleto e reservando o cartão de crédito para outras despesas.

Em março, as buscas no site por passagens internacionais cresceram 25% sobre fevereiro e 53% ante janeiro. Para os destinos nacionais, houve aumento de 12% em março em relação a fevereiro e de 19% ante janeiro. E para a Semana Santa o acréscimo foi de 80% na procura por passagens ante o mesmo feriado do ano passado. “Antes da pandemia, quando a procura por voos internacionais dava uma puxada, o doméstico se retraia. Hoje tanto a demanda por voos internacionais como por nacionais têm curva crescente”, conta Daniela.

Desde o ano passado a CVC, maior agência de viagens do País, registra a retomada do turismo. Para a Páscoa, a empresa teve crescimento de 60% na procura por viagens em comparação com a mesma data de 2021. Os destinos mais buscados são Porto Seguro (BA), Maceió (AL), Natal (RN), Fortaleza (CE) e Balneário Camboriú (SC).

Apesar de mais de 80% da procura estar voltada para pacotes nacionais, a companhia observa uma recuperação na demanda por viagens ao exterior, porém em ritmo mais lento. O maior interesse é por destinos no Caribe; nos Estados Unidos, Nova York, Miami e Orlando; na América do Sul, Buenos Aires e Santiago; e na Europa, Paris e Lisboa.

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