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Problemas estão em fermentação na gigante das cervejas ABInBev

Em meio à estagnação do setor de cerveja, espaço para AB InBev crescer por aquisições se esgota

Por The Economist
Atualização:
Espaço para ABInBev crescer por aquisições se esgota Foto: David W Cerny/Reuters

Especialistas na bebida zombam da Budweiser, que se autoproclamou a “rainha das cervejas”. Ninguém, no entanto, questiona o fato de a fornecedora da Bud, a Anheuser-Busch InBev (AB InBev), dominar a produção global da bebida. A empresa vende quase três piscinas olímpicas de cerveja por hora – mais do que as três rivais mais próximas juntas. Porém, as perspectivas da AB InBev, antes tão douradas quanto o líquido da Corona Lager, outra de suas marcas, assumiram uma coloração mais turva, próxima da cor das cervejas de trigo.

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A ABInBev não é apenas muito maior do que suas rivais, vendendo uma em cada quatro cervejas em todo o mundo. Também gera cerca de metade dos lucros globais do setor. Suas margens operacionais brutas foram de 40% em 2018, mais do que o dobro da média de outras cervejarias listadas em Bolsa de Valores – e estelares pelos padrões das empresas que vendem qualquer tipo de bem de consumo. 

Seu nome aglutinado aponta para uma empresa cuja trajetória foi definida por financistas, e não por cervejeiros. Seu núcleo é formado por um trio de investidores brasileiros mais conhecidos depois fundar o 3G Capital, fundo de private equity que abocanhou outras empresas de alimentos ao redor do mundo, como Burger King e Kraft Heinz. Eles usaram a Brahma, uma empresa de cerveja brasileira que adquiriram em 1989, como uma plataforma para comprar rivais em todo o mundo.

No entanto, a estratégia bem-sucedida de aquisições em série e redução de custos parece estar chegando ao limite. Tendo consolidado a fragmentada indústria cervejeira – quatro das dez maiores cervejarias de 1990 fazem parte de seu império –, não há grandes rivais a serem dominados sem provocar as autoridades da concorrência. Quanto ao corte de custos, até o fim do ano, a ABInBev terá enxugado a última parte das economias anuais de US$ 3,2 bilhões decorrentes da aquisição da SAB.

De qualquer maneira, a AB InBev precisa de uma nova estratégia de crescimento. Expandir sua pequena oferta de outros produtos – comprar a Coca-Cola, por exemplo, ou a Diageo, que principalmente vende destilados – parecia como a única coisa óbvia a se fazer. Mas uma aquisição ousada parece improvável. A oferta de US$ 98 bilhões pela SABMiller, há três anos, rendeu uma dívida líquida de mais de US$ 100 bilhões, quase cinco vezes o lucro do ano passado antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda). O reembolso tem sido lento, até porque a AB InBev tomou empréstimos em grande parte em dólares e euros, mas ganha a maior parte do seu dinheiro nas frágeis moedas de mercados emergentes, como Brasil e África do Sul.

A preocupação com a dívida fez suas ações caírem 38% em 2018, terceiro ano consecutivo de queda. O preço da ação recuperou metade das perdas do ano passado, embora ela ainda pareça barata em relação aos ganhos esperados em comparação com suas rivais mais próximos, Heineken e Carlsberg.  Em uma humilhante reviravolta, o conselho da ABInBev (que os investidores brasileiros controlam ao lado de um grupo de herdeiros belgas) cortou pela metade seu dividendo em outubro para quitaras próprias dívidas. Em 7 de maio, confirmou rumores de que estaria explorando negociar em Bolsa uma participação minoritária em sua operação na Ásia, estimada em cerca de um quarto do valor de mercado de US$ 172 bilhões do grupo.

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Porém, fabricar cerveja não é mais o que costumava ser. A demanda pela bebida está secando. Nos EUA, o maior mercado individual da ABInBev por receita, a cerveja está perdendo sua “fatia da garganta” (proporção das bebidas consumidas de uma empresa) no jargão da indústria, para o vinho e bebidas alcoólicas, assim como as pessoas estão bebendo menos álcool. Quase um quarto dos jovens britânicos são abstêmios.

O consumo está aumentando nos países pobres, onde 57% das receitas da AB InBev agora vêm, em parte graças à SAB. Mas mesmo aí o crescimento diminuiu.

Tais tendências explicam porque a AB InBev vendeu apenas 0,3% mais ‘pints’ em 2018 do que em 2017. Exclua aquisições, e a ABInBev não aumentou o volume de cerveja em mais de uma década. O crescimento das vendas, de 4,7% ao ano desde 2008, deve-se em grande parte a vender cervejas vendidas a preços mais elevados.

A gigante quer imitar as líderes em destilados e vinhos, produtos pelos quais os consumidores pagam preços muito mais elevados por marcas de primeira linha do que por produtos convencionais. Por exemplo, a AB InBev possui muitos rótulos que não são nada de especial em certos países, mas são comercializados como luxuosos no exterior: a Budweiser é uma cerveja padrão nos EUA, mas é vendida por valor extra na China. Em todo o mundo, dezenas de cervejarias artesanais que emanam charme local e a mística anticapitalista, como Camden Town Bre- wery ou a Goose Island, são, na realidade, propriedade da AB InBev. Mas o crescimento do consumo de cerveja artesanal também parece plano: agora, só marcas de nicho conseguem convencer as pessoas a pagar mais.

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Analistas dizem que as margens da AB InBev nos mercados emergentes podem ficar sob ataque. “A intensidade da competição subiu um pouco nos últimos anos”, diz Trevor Stirling, da empresa de pesquisa Sanford C. Bernstein. Países que costumavam ser monopólios da cervejaria, ou na pior das hipóteses confortáveis duopólios, estão sendo assediados por pessoas de fora. A Heineken conseguiu um grande impulso no Brasil e na Colômbia.

Os céticos questionam se uma cultura corporativa construída em torno do Excel pode ser reformulada em uma onde os profissionais de marketing extraem ganhos incrementais de participação de mercado, trimestre após trimestre. Se a empresa aprendeu alguma coisa é que reinar sobre o mundo cervejeiro dá mais trabalho do que conquistar a coroa. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO  © 2019 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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