
23 de março de 2021 | 05h00
BRASÍLIA - O Orçamento de 2021, previsto para ser votado esta semana com quatro meses de atraso, destina R$ 8,3 bilhões para investimentos do Ministério da Defesa, um quinto (22%) do total para todo o governo federal, segundo relatório do senador Márcio Bittar (MDB-AC) apresentado ontem. Os militares também são a única categoria que deve ser contemplada este ano com reajuste, o que deve consumir outros R$ 7,1 bilhões dos cofres públicos, enquanto todo o restante do funcionalismo está com o salário congelado até dezembro.
No momento de colapso do Sistema Único de Saúde (SUS) pelo agravamento da pandemia da covid-19, o parecer aumentou em apenas R$ 1,2 bilhão a destinação de recursos para a saúde em relação ao projeto que foi enviado pelo governo no ano passado.
Congresso vota Orçamento esta semana, com pressão extra por mais gastos para combater pandemia
Em vez de sofrer cortes, como outros ministérios, o orçamento de investimentos das Forças Armadas até mesmo subiu de R$ 8,17 bilhões para R$ 8,32 bilhões de um total de R$ 37,6 bilhões previstos no parecer. A lista dos projetos dos militares é extensa e inclui recursos para a construção de submarinos nucleares e convencionais, aquisição de aeronaves de caça, desenvolvimento de cargueiro tático e compra de veículos blindados.
O incremento tímido de recursos para a saúde, na maior crise sanitária da história, põe em xeque o discurso de parlamentares de reforço da área, mas antecipa um movimento de senadores e deputados aliados: a expectativa de que serão editados mais créditos extraordinários para financiar despesas extras para a saúde, que ficam fora do teto de gastos, a regra que trava o crescimento das despesas à inflação.
Mesmo com o Orçamento aprovado, o governo federal pode bloquear gastos não obrigatórios, incluindo os investimentos, como estratégia para cumprir a meta fiscal deste ano, que permite rombo de até R$ 247 bilhões.
Segundo cálculos do assessor no Senado e especialista em gastos de saúde, Bruno Moretti, o orçamento para ações e serviços públicos de saúde, o que é contabilizado para apuração do mínimo e não leva em conta os gastos com aposentadorias e pensões, ficou em R$ 125 bilhões, abaixo do valor inicial do Orçamento de 2020, que foi de R$ 125,2 bilhões, sem os recursos extraordinários da pandemia. “Em meio à pandemia, há queda nominal e real de recursos para o SUS. Se observarmos o Orçamento aplicado em 2020. Incluindo os créditos extraordinários, a queda em 2021, considerando a Lei Orçamentária, é de R$ 36 bilhões”, calcula Moretti. Nesse contexto, afirma ele, serão reduzidas as transferências aos Estados e municípios e as compras centralizadas para aquisição de medicamentos de UTI, manutenção e expansão de leitos, entre outras despesas.
A presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), Flavia Arruda, criou uma ação especial do Orçamento para reforçar as emendas e conseguiu cerca de R$ 900 milhões a mais para a área. O problema é que o governo enviou o projeto de Orçamento com a previsão de gastos com o valor do piso constitucional de R$ 123,8 bilhões e colocando na conta as emendas dos parlamentares, o que dificulta o espaço para aumento dos recursos para a saúde.
O Congresso decidiu turbinar as áreas de interesse eleitoral. O volume de recursos com a digital dos parlamentares neste ano vai chegar a R$ 22,2 bilhões. O valor das emendas representa um aumento de quase R$ 6 bilhões em relação ao proposto inicialmente pelo Executivo. Só de emendas indicadas diretamente pelo relator-geral do Orçamento, o valor é de R$ 3 bilhões.
A maior parte das indicações nas mãos do relator (R$ 1,129 bilhão) ficou vinculada a projetos do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, apontados como estratégicos para Bolsonaro recuperar índices de popularidade, além da área social. Na prática, a destinação desse dinheiro poderá ser negociada com parlamentares em troca de apoio ao Executivo. A pasta saiu de um orçamento de R$ 6,5 bilhões para R$ 10,7 bilhões em 2021.
Além de obras, o Senado quer mais recursos para o Pronampe, que financiou micro e pequenas empresas no ano passado em função do novo coronavírus. Recentemente, os senadores aprovaram um projeto para tornar a nova linha de financiamento do programa permanente. Dos R$ 4,8 bilhões solicitados no Orçamento para irrigar o Pronampe, porém, o relator aprovou apenas R$ 1 milhão - segundo ele, apenas o suficiente para criar a rubrica.
Para o consultor da Câmara, Ricardo Volpe, o relator Bittar foi “comedido” no parecer diante da pressão política, mas houve uma revisão de estimativas de receitas para cima, em R$ 14 bilhões, não acompanhada pela revisão nas projeções de gastos. “Diante dessa pressão gerada pelas reestimativas e pela falta de espaço no teto, ele cortou R$ 1,75 bilhão do Censo, que nesse momento de pandemia provavelmente não deve sair de novo”, disse.
Volpe chama a atenção para o fato de o relatório não ter reestimado o gasto da Previdência. Pelos cálculos, só na Previdência a estimativa de pagamento deveria ser elevada em R$ 8,3 bilhões por causa do impacto do aumento do salário mínimo. Esse quadro já antecipa um bloqueio à vista do Orçamento, que deverá ocorrer em abril.
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