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Promessa da Agrenco durou só oito meses

Antes da prisão dos donos, grupo buscava sócio com US$ 100 milhões

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Cerca de dez dias antes da prisão de três dos principais acionistas e executivos da Agrenco - entre eles o fundador, Antonio Iafelice - pela Polícia Federal, fundos de investimento e outros grupos do ramo foram procurados para injetar dinheiro na companhia e, em troca, entrarem como sócios. A Agrenco, uma das maiores exportadoras de soja do Brasil, já estava agonizando. Para sobreviver, o grupo precisaria de pelo menos US$ 100 milhões de capital de giro e outros US$ 150 milhões em empréstimos de longo prazo. O alerta foi feito poucos meses antes pelos executivos do Credit Suisse, banco que liderou a abertura de capital em outubro do ano passado e era dono de 6,8% das ações. Os fundos, acostumados a negócios de risco, recusaram a oferta. O grupo francês Louis Dreyfus Commodities, um dos procurados, acabou anunciando um acordo - ainda mal explicado - com a Agrenco dias depois do escândalo. Os executivos são acusados dos crimes de estelionato, lavagem de ativos, formação de quadrilha e falsidade ideológica, entre outros. O desespero da Agrenco em busca de capital é intrigante porque coloca o mercado acionário à prova. "Eles se endividaram na expectativa de se financiarem mais barato no futuro, o que acabou não acontecendo", diz um banqueiro. "Muitas empresas que abriram o capital pisaram fundo no acelerador acreditando nisso. Os bancos médios são um caso. As empresas imobiliárias, outro." A Agrenco foi vendida aos investidores como uma promessa do agronegócio. A empresa se cercou de profissionais considerados de primeira linha, como a auditoria KPMG e o escritório de advogados Mattos Filho. O ex-presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, José Guimarães Monforte, uma espécie de selo de transparência no mercado, foi alçado ao posto de conselheiro independente. A aposta se revelou furada em pouco tempo. O caixa da companhia secou apenas oito meses depois de uma bem-sucedida oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), em que foram captados R$ 666 milhões. Pior: a Agrenco já acumula dívida superior a R$ 1 bilhão, boa parte de curto prazo. O grosso do dinheiro do IPO foi para o pagamento de dívidas e comissões. O maior credor era o Credit Suisse, que liderou um empréstimo sindicalizado de US$ 150 milhões para a construção de três usinas de esmagamento de soja e processamento de óleo e biodiesel. O banco convenceu a empresa que, para fazer o IPO, era preciso ter o que mostrar aos investidores. No caso, as usinas. Até então, a Agrenco não tinha indústrias, como suas principais concorrentes mundiais, apenas comprava e vendia grãos. "A Agrenco deu um passo maior do que as pernas. Em vez de fazer três usinas, poderia ter feito só uma, proporcional ao tamanho dela", diz o diretor da consultoria Biodieselbr, Univaldo Vedana. A estratégia de impressionar os investidores custou caro. Apenas 32% do dinheiro do IPO virou capital de giro. Essa distribuição já seria arriscada em tempos normais, pois empresas como a Agrenco, que financiam os produtores de grãos, são extremamente dependentes de caixa. Com a alta da soja, a situação ficou mais dramática. "A volatilidade pegou o mercado de surpresa. Ninguém estava preparado. Mas os grupos estrangeiros conseguiram enfrentar melhor a situação", diz José Amaral, da Scot Consultoria. "A volatilidade implica no maior desgaste do capital de giro. Para garantir preço, as empresas vendem a soja no mercado futuro na bolsa. Mesmo que a empresa não perca lá na frente, os ajustes diários demandam capital de giro diariamente." A quebra da Selecta, concorrente da Agrenco, foi o último golpe. "Quando alguém quebra no setor, todo mundo corta crédito", diz Claudio Alencar, sócio da gestora de investimentos Polo Capital.

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