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Proposta agrícola da OMC não agrada ao Brasil

Por Agencia Estado
Atualização:

O primeiro rascunho de um acordo sobre as modalidades de negociação agrícola na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) não agradou, à primeira vista, nem ao governo nem aos empresários brasileiros. O texto foi qualificado pelo Ministério da Agricultura como uma tentativa frustrada de contentar a gregos e a troianos. Na Confederação Nacional da Agricultura (CNA) a avaliação foi de que o esboço é pouco consistente, pouco confiável e, portanto, péssimo ponto de partida. Na manhã de hoje, diplomatas do Departamento Econômico do Itamaraty e técnicos da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura se reunirão para avaliar cada um dos 57 tópicos do esboço. Com base nessa análise mais esmiuçada será redefinida a posição brasileira para as negociações que se estenderão até o próximo dia 31 de março, em Genebra. Em princípio, nesse prazo, os membros da OMC deverão chegar a um consenso sobre a versão final do acordo das modalidades da negociação agrícola na Rodada Doha. O rascunho desse acordo vinha sendo esperado pelos negociadores e empresários brasileiros, embora já expressassem certo pessimismo em relação a seu conteúdo nos últimos dias. Sua circulação, hoje, antecedeu em dois dias o início da reunião "miniministerial" da OMC, em Tóquio, que reunirá ministros de um pequeno grupo de membros da organização - apenas 25, o Brasil entre eles - com a missão de desemperrar as negociações de temas que podem abalar a continuidade da rodada. A agricultura é o principal deles. Elaborado pelo presidente do Conselho-geral da OMC, Stuart Harbinson, de Hong Kong (China), que também preside o grupo negociador de agricultura, o texto tenta manter o espírito da Declaração de Doha, que deu a largada da rodada e que foi ousado em relação a agricultura. Mas o rascunho revelou-se um esforço de conciliação de posições antagônicas - da proposta do Grupo de Cairns, composto pelo Brasil e 17 exportadores agrícolas que não subsidiam seus produtores rurais, à oferta da União Européia. Subsídios Na avaliação de Gilman Viana Rodrigues, coordenador do Fórum Permanente de Negociações Agrícolas Internacionais da CNA, o dado mais perigoso está na falta de clareza nos tópicos que tratam dos subsídios à exportação e do apoio interno aos produtores rurais. A exigência do Brasil e de seus sócios do grupo de Cairns sobre o assunto é clara: redução substancial das medidas de apoio interno e eliminação dos subsídios à exportação. Harbinson propõe a redução das clássicas medidas de subsídios à produção - a chamada Caixa Azul - em 50% em um prazo de cinco anos. Mesmo assim, expressa o porcentual e o período entre parênteses - o sinal de que esse tópico é polêmico e que, sob seu ponto de vista, foi preferível mantê-lo em aberto. "Esses subsídios deveriam ser condenados à fogueira", defendeu Viana Rodrigues. "O rascunho só propõe a redução, mas não o disciplinamento desse subsídio. Hoje há tantas brechas no uso desse apoio que ele acaba se transformando facilmente em subsídio às exportações." A ausência de sugestões de regras se repete no caso dos subsídios para a comercialização das safras agrícolas nos mercados internos - a chamada Caixa Amarela. As atuais brechas permitem que as políticas de preço mínimo estimulem a produção de excedentes, que acabam sendo exportados com subsídios, em vez de apenas garantir a rentabilidade mínima do produtor. Os tópicos relativos à ampliação do acesso de produtos agrícolas aos mercados mais protegidos mostraram-se, à primeira vista, igualmente distantes da ambição do Brasil. Conforme explicou um técnico do Ministério da Agricultura, Harbinson preservou a posição defendida pela União Européia. Trata-se da mesma lógica aplicada na Rodada Uruguai (1986-1994), que prevê uma redução média nas tarifas, com um porcentual mínimo de diminuição a ser seguido. Isso significa que, um país poderá tranquilamente concentrar a redução da tarifa em um produto para preservar a proteção de outro. Em uma clara iniciativa de agradar o Grupo de Cairns, Harbinson conciliou essa sugestão com a ampliação das cotas tarifárias - os volumes de produtos que podem ser importados com tarifas reduzidas em um período determinado. O Brasil e seus aliados, entretanto, deverão bater o pé para que o acordo final traga impressa a chamada Fórmula Suíça, que prevê a ampliação das cotas par-e-passo à redução das tarifas de importação, para que não ultrapassem 25%.

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