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‘Queda de juros ajuda, mas não faz mágica’, diz ex-diretor do BC

Para economista José Júlio Senna, corte mais recente da Selic e cenário de inflação baixa apontam que ciclo de juros baixos será longo

Por Douglas Gavras 
Atualização:

O atual cenário de inflação baixa e de necessidade de estimular a atividade econômica são indicativos de que o ciclo de juros baixos no Brasil deve ser longo, analisa o economista e chefe do Centro de Estudos Monetários, do FGV/Ibre, José Júlio Senna.

O ex-diretor do Banco Centrale economista da FGV, José Júlio Senna Foto: PAULO GIANDALIA/ESTADÃO

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Nesta quarta-feira, 30, o Comitê de Políticas Monetárias (Copom), do Banco Central, decidiu cortar novamente a taxa básica de juros, para 5,0% ao ano -- o patamar mais baixo da história.

Sennae, que também foi diretor do Banco Central, avalia, porém, que os juros baixos não são garantia de recuperação da economia e que o País precisa manter a agenda de reformas estruturais. A seguir, trechos da entrevista.

O ciclo atual de juros baixos no Brasil tende a ser longo? Eu diria que sim. A estratégia do BC de controlar a inflação está se mostrando eficiente, e o comportamento médio da inflação nos últimos cinco meses mostra uma sequência fantástica. As projeções apontam que as metas devem ser cumpridas, com folga, até 2021. 

Isso é comum? Não. É raro encontrar no Brasil períodos em que o BC não esteja remando contra a maré, ou seja, preocupado em trazer a inflação para baixo. Em outros períodos, o objetivo de controlar os preços conflitava com uma política de gastos públicos expansionista e desembolsos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). 

O cenário internacional pode suspender os cortes de juros? O ambiente internacional, de algum modo, traz até benefícios para a inflação brasileira. O mundo todo está experimentando um fenômeno de inflação baixa. Nos países avançados, o problema é o contrário, fazer com que a atividade e os preços subam. Os países ricos estão com carência de instrumentos adequados para turbinar as suas economias.

O juro real no Brasil pode ficar perto de zero? Já está praticamente assim. O Brasil vive uma experiência excelente de redução da inflação e dos juros. No passado, a discussão era se faria diferença ter uma inflação de 4% ou de 7%. Hoje, está claro que é a inflação baixa que está permitindo juros baixos. É uma demonstração da importância de ter uma inflação baixa. 

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Mas a inflação está baixa, também, pela atividade econômica ainda muito retraída, certo? Sim. Sem medidas de incentivo, o Brasil vai continuar com crescimento baixo. Mas na medida em que o País consolidar uma situação fiscal mais equilibrada, com o mercado de capitais tendo resultados melhores e as empresas reestruturando seus passivos, a economia vai se beneficiar muito. 

Mas em que medida a queda nos juros pode incentivar o crescimento do País? A gente está colhendo hoje o resultado das medidas tomadas a partir de 2016, como o teto de gastos (que limita os gastos públicos federais). Mas os juros baixos não são suficientes para recuperar a economia. Há uma relutância em entender que esse enfraquecimento econômico do Brasil não é circunstancial. A recessão de 2015 e 2016 agravou um problema de desempenho que já existe há quatro décadas.

Ajuda, mas não resolve?  Ajuda, anima um pouco a atividade econômica, mas não resolve os problemas, porque o estímulo monetário tem limitações. O consumo das famílias cai com o desemprego elevado e há um grau de endividamento ainda alto. A queda de juros não faz mágica. No caso do investimento, muita coisa ainda precisa acontecer para o empresário ficar mais confiante. 

O que precisaria melhorar? Seria preciso estimular o esforço produtivo, diminuindo a burocracia para o setor empresarial, simplificando o regime de impostos, melhorando a infraestrutura e a estabilidade jurídica. Resumindo: é preciso fazer reformas e mais reformas. 

Além dos esforços do BC, o governo tem ido nessa direção? Em partes. O governo tem tido dificuldade em tocar o programa de privatizações, pelas resistências de natureza política. Ainda assim, parte importante do Congresso, com sorte, tem tido uma postura reformista.  

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