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Queda no rating gera dúvidas sobre o Uruguai

Por Agencia Estado
Atualização:

O Uruguai é a bola da vez? O temor de uma crise uruguaia está aumentando nos mercados internacionais, na esteira dos diversos choques que a economia sofreu nos últimos anos: desvalorização no Brasil, queda no preço das commodities, a contaminação do gado pela febre aftosa e o colapso da Argentina, país ao qual o Uruguai está intimamente entrelaçado. Com 80% da economia dolarizada (quase todos os empréstimos e depósitos), uma recessão que está entrando no quarto ano e o rebaixamento de rating (classificação de risco) na quinta-feira pela agência americana Standard & Poor?s (S&P), o Uruguai é também o último país latino-americano a apegar-se a um sistema de banda cambial. Ontem, os títulos da dívida do país recuaram oito pontos, para 84 centavos de dólar, por causa da redução do rating pela S&P. A América Latina moveu-se na direção do câmbio flutuante, e do abandono dos chamados sistemas ?semifixos? ou administrados (como o uruguaio), tais como bandas ou séries de microdesvalorizações comandadas pelos bancos centrais. De meados dos anos 90 para cá, México, Brasil, Chile, Colômbia, Venezuela e Argentina deixaram suas moedas flutuar. Dados do Fundo Monetário Internacional mostram que em 1991, entre os cerca de 180 países membros da instituição, 98 tinham regimes cambiais intermediários, 36 flutuavam suas moedas e 45 tinham sistemas totalmente fixos (adoção de moeda de outro país ou de uma moeda comum; ou ?currency board?). Em 1999, os regimes intermediários haviam caído para 63, os flutuantes subido para 77 e os totalmente fixos tinham ido para 45. Esses números ilustram a chamada tendência ?bipolar?, ou seja, de que apenas os sistemas extremos ? totalmente fixo ou flutuante ? funcionam bem no mundo moderno. Os intermediários, segundo essa corrente de pensamento, trazem encrenca. O colapso do ?currency-board? na Argentina também afetou um pouco a crença de que o câmbio fixo, um dos ?extremos?, seja um bom sistema. Fala-se agora de ?condições? para que o câmbio fixo dê certo, como doses cavalares de responsabilidade fiscal e de ?flexibilidade econômica?. Parece que, optando-se pelo câmbio fixo, é mais seguro abandonar totalmente a moeda ? seja adotando a de outro país, como o Equador e El Salvador, que dolarizaram suas economias; seja adotando uma moeda comum, como os países europeus ? do que usar o ?currency board?. De qualquer forma, os números do FMI e as evidências recentes da América Latina mostram que o câmbio flutuante é o grande vitorioso dos últimos anos. Ele não é uma panacéia, e deve ser acompanhado de responsabilidade fiscal e de um regime antiinflacionário consistente ? de preferência, metas de inflação com BC independente. Mas o regime flutuante tem a vantagem de absorver melhor os chamados ?choques? econômicos, internos e externos. O caso brasileiro em 2001 é um bom exemplo. O País foi afetado pelo contágio argentino, pela recessão americana e pela crise energética. Com isso, o real desvalorizou-se até R$ 2,84 por dólar no pior momento, os juros básicos subiram 5 pontos porcentuais e o País cresceu menos de 2%, em vez dos previstos 4,5%. Porém, dada a brutalidade dos choques, a reação da economia foi menos sofrida do que no período entre meados de 1997 e o início de 1999, quando o Brasil pagou a conta das crises asiática e russa, que levaram a aumentos de juros muito maiores que os de 2001. Richard Fox, diretor-sênior em Londres da agência euro-americana de rating Fitch, acha que ?os sistemas de câmbio flutuantes dão maior flexibilidade aos países, mas não são automaticamente uma boa coisa?. No caso da Venezuela, por exemplo, Fox considera que ?a flutuação foi um passo na direção certa, mas ainda há muito para se acertar no país?, uma referência às tradicionais recomendações fiscais e de consistência antiinflacionária. Para Fox, o Uruguai está em um momento bastante problemático, mas não chega a considerá-lo a bola da vez. Na verdade, o Uruguai é muito bem classificado pelas agências, tendo ?grau de investimento? na Fitch, na Moody?s e só perdendo-o na S&P com o rebaixamento de quinta-feira. É bem possível que o país venha a perder o grau de investimento em outras agências, como a Fitch, mas mesmo assim ainda estaria muito acima do Brasil. Os trunfos do Uruguai são reservas internacionais cinco vezes maiores que a base monetária, e medidas tomadas recentemente de aceleração da desvalorização controlada pelo BC, para 33% ao longo de 2002, ante uma inflação prevista de menos de 10%. Em outras palavras, diferentemente da Argentina, o país está corrigindo seu câmbio de forma gradual, porém rápida, e até aqui sem grandes abalos. O contágio argentino evidentemente é forte, como no caso do Banco Galicia, cuja grande sucursal uruguaia sofreu intervenção. É há também a perda de turismo e do ritmo de negócios das empresas argentinas no país, que é determinante para a economia. O maior problema do Uruguai, porém, é a expansão da dívida pública dolarizada como porcentual do PIB, que deve chegar a 60% em 2002 em termos brutos, segundo a S&P.

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