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Queda nos juros surpreende. Mas vai durar?

Por Raul Velloso
Atualização:

Nos últimos tempos, a taxa básica de juros administrada pelo Banco Central (BC) tem subido basicamente para combater pressões inflacionárias. Isso ocorre tanto em seguida a crises ou choques de peso quanto, ainda, quando há forte congestionamento representado pela ocorrência simultânea de elevados gastos públicos e privados. Nas várias crises que nos têm atingido, a primeira mudança relevante que se observa é o deslocamento da taxa de câmbio para cima, em resposta a fugas de capitais ou à interrupção dos ingressos de capitais, daí se seguindo fortes pressões inflacionárias. Esses movimentos dos capitais decorrem do temor em relação à real capacidade de o setor público brasileiro honrar seus compromissos financeiros. O processo pode ter início fora do País - como ocorreu nas crises da Ásia, da Rússia ou da Argentina - ou pode iniciar aqui mesmo, como ocorreu na crise de energia elétrica e na transição do governo Fernando Henrique Cardoso para o atual. Nessas crises, o medo do não-cumprimento de compromissos em outras praças se transmitia rapidamente e com força idêntica para o Brasil, que até há pouco sofria de sério problema de solvência no setor público ou com dificuldades para fechar as contas externas. Intramuros, o temor decorria da perspectiva de menor crescimento econômico ou do calote da dívida pública. A adoção de medidas na área fiscal (aumento de receita e/ou corte de gastos públicos) detonava o processo de correção de curso, levando à redução gradual do valor da taxa de câmbio (apreciação cambial) e à abertura de espaço para nova trajetória de queda das taxas de juros, que passavam a cair sistematicamente, até que uma nova crise sobreviesse ou uma nova onda de aumento de gastos agregados tivesse lugar. Entre as subidas e descidas das taxas de juros reais (taxa nominal menos a inflação), em meio a crises frequentes, o menor valor atingido na queda se mantinha acima dos níveis médios internacionais. Dois fenômenos básicos diferenciam a crise atual das crises anteriores. O primeiro é a queda de importantes preços de bens comercializáveis com o exterior. O segundo, que se liga de forma estreita ao primeiro, é a queda da atividade econômica no mundo desenvolvido, em particular nos Estados Unidos. Esses dois eventos provocaram a queda da atividade econômica interna - e da arrecadação de impostos -, bem como uma incomum pressão baixista nos preços domésticos. Mesmo com a forte subida inicial da taxa de câmbio - porque o ingresso de capitais externos desabou e também por causa da queda dos preços e da demanda externa - e considerando a trajetória vigente de gastos públicos e a busca de uma certa meta de inflação, quanto maior a desaceleração internacional, maior o espaço que se abre para a queda das taxas de juros. Assim, apesar de grave como as outras, a crise atual pode levar as taxas de juros reais a níveis inéditos na fase pós-real, em contraste com o que ocorria nas crises anteriores. O que é bom pode, contudo, durar pouco. Basicamente, pelo risco de os gastos públicos continuarem subindo acima do razoável, a reboque de pressões de segmentos afetados inicialmente pela crise, ou por causa dos aproveitadores de ocasião, levando, mais adiante, a novo congestionamento com os gastos privados, além de aumentar a rigidez das contas públicas e trazer de volta o problema de solvência. Diante da queda expressiva da taxa de crescimento da arrecadação de impostos e da desaceleração do próprio crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), caem os superávits fiscais e pode aumentar a relação entre a dívida pública e o PIB. Outra ameaça provém do aumento do déficit externo, provocando nova depreciação da taxa de câmbio e, portanto, gerando pressões inflacionárias adicionais. Com tudo isso e mantida a voracidade do governo na área do gasto, a taxa de juros básica voltará a subir automaticamente - o que será uma pena - tão logo a economia internacional volte a crescer mais. *Consultor econômico O colunista Celso Ming está em férias.

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