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Questão de identidade

Por Steven Weisman
Atualização:

Há uma década, o Fundo Monetário Internacional (FMI) ajudou a estabilizar a economia mundial quando os mercado da América Latina, Rússia e Ásia entraram em colapso. Embora os críticos tenham deplorado seu intervencionismo, o fundo foi amplamente elogiado como um heróico guardião do sistema financeiro global. Hoje, a única crise enfrentada pelo FMI é a crise de identidade. A maioria dos países socorridos na década de 90 pagaram suas dívidas. Com um portfólio de empréstimos encolhido, a instituição que costuma passar sermão nas outras sobre finanças perdeu receita operacional e está incorrendo em déficit. Está fazendo cortes no número de funcionários e nos salários e até considerando a venda de suas reservas de ouro em barras. "O que talvez esteja em jogo é a própria existência do FMI como a principal instituição provedora de estabilidade financeira para ao mundo, um bem público global", disse Dominique Strauss-Kahn, ex-ministro das Finanças da França, segundo os diretores do fundo na semana passada. "Em resumo, as duas principais questões são relevância e legitimidade." Strauss-Kahn vai ser nomeado o novo diretor administrativo do FMI, sucedendo Rodrigo de Rato, da Espanha, que está renunciando. Ele chega no momento em que o governo Bush, que apoiou seu nome, se juntou a um coro global que está pedindo que o fundo reconsidere suas prioridades e governança. Além dessas dificuldades, existe a questão de se uma instituição estabelecida na década de 40, época de câmbios fixos e controles de capital, tem um papel a desempenhar numa era em que trilhões de dólares fluem através das fronteiras diariamente. Com US$ 300 bilhões em reservas e linhas de crédito, dificilmente teria os recursos para lidar com uma grande crise. Segundo Rato, com o desvanecimento do seu papel de socorrer países, as novas prioridades do fundo devem ser insistir que os países tomem medidas para prevenir crises, monitorar a economia global e fornecer a assistência técnica. Funcionários do fundo dizem que a probabilidade é que Strauss-Kahn dê continuidade a isso. Mas seu problema mais imediato talvez seja o orçamento do FMI, que está reduzindo o número de funcionários e possíveis benefícios. O fundo, que tem reservas em ouro de US$ 70 bilhões, está pensando em vender parte disso para atender às necessidades do orçamento. Porém, muitos países doadores estão dizendo que o ouro pertence a eles. Entre as questões a serem consideradas está a forma como os países ricos escolhem o líder do fundo. Desde que foi criado, após a 2ª Guerra Mundial como parte da arquitetura econômica pós-guerra de Breton Woods, o presidente é escolhido privativamente pelas principais potências da Europa. Antes de o presidente Nicolas Sarkozy da França nomear Strauss-Kahan, sua seleção já era prevista. Entretanto, há uma insatisfação e um constrangimento entre os membros do conselho do fundo por causa da natureza fechada do processo, especialmente entre países da Ásia e da América Latina que foram socorridos na década de 90. Muitos agora são potências exportadoras com reservas cambiais tão grandes que não precisam nem querem que o FMI lhes diga o que fazer. Existem sentimentos entre alguns membros do conselho de que o fundo se juntou aos EUA e a outros países ricos para exigir cortes orçamentários austeros e apertos fiscais para países socorridos na década passada. A Rússia esperava capitalizar em cima desses sentimentos contestando a escolha de Strauss-Kahan. O país nomeou seu próprio candidato, Joseph Tosovsky, um ex-primeiro-ministro da República Checa que disse ao conselho que, "como representante de uma economia em transição do mercado emergente", traria uma perspectiva diferente ao cargo. No ano passado, com apoio dos americanos, o fundo deu mais cotas de voto para China, Coréia do Sul, Turquia e México. O governo Bush teme que, sem isso, esses países poderia se desligar do fundo. Se o FMI se concentrar em monitorar economias e buscar maior transparência no sistema financeiro, já serviria para alguns de seus críticos. Para Adam Lerrick, economista da Carnegie Mellon University e do American Enterprise Institute, "o fundo deve se concentrar na coleta de dados e na disseminação de informações. Surpresas provocam crises financeiras. Quanto mais informações os mercados tiverem, menor a probabilidade de uma crise".

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