PUBLICIDADE

Publicidade

Questão interna

O Brasil ultrapassou a Índia e assumiu a liderança isolada da maior dívida pública bruta entre as grandes economias emergentes: 68,5% do PIB, ante 66,8%, ao final de 2012. 

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Os indianos sempre incorreram em elevados déficits (ainda em 8% do PIB) e historicamente acumulavam a dívida mais alta desse grupo de países: em 2006 deviam 78,4% do PIB e superavam em 11,7 pontos a dívida dos brasileiros. Enquanto eles cortaram fundo, nós nos endividamos e ultrapassamos em 1,6 ponto a dívida pública da Índia e em 33 pontos a da média das economias emergentes (35% do PIB). Entre 30 países, aliás, só perdemos de 3 – Egito, Hungria e Jordânia, que devem 80% do PIB. De 2008 a 2012, o Brasil atravessou a crise elevando sua dívida em perto de 5 pontos do produto, ante só 1,7 ponto da média dos emergentes.

PUBLICIDADE

Outros indicadores de dívida também apontam um grande contraste entre o Brasil e os emergentes. A necessidade de financiamento bruto projetada para 2013 será de 17% do PIB, quase o dobro da média dos emergentes (na Índia fica em 13%), e o prazo médio de maturação da dívida é de 5,1 anos, ante 7,7 anos da média (na Índia, 9 anos).

Na apuração da dívida pública líquida, que alguns países não informam e alguns calculam como negativa (como Chile e Arábia Saudita), o Brasil é quem aplica o maior volume de deduções (caixa, reservas e créditos concedidos): 33 pontos do PIB em 2012 (13 desde 2008). E assim consegue a façanha de sumir com cerca de 50% da dívida bruta, enquanto na média dos emergentes tais descontos foram de 10 pontos e a redução, de 30%. A excentricidade brasileira se explica, em parte, por sermos o único país que trata o banco central (incluindo reservas internacionais) como parte do setor público não financeiro e porque o Tesouro Nacional virou o maior banco da economia (16% do PIB em créditos), ambos computados para medir a dívida líquida. No caso da bruta, só dos governos, pesa muito a enorme carteira de títulos do Banco Central (de 20% do PIB, ante 10% nos EUA), que implica endividamento indireto, mais curto e caro, por meio de operações compromissadas e recolhimentos compulsórios.

Essas e muitas outras contas dos governos fazem parte do último levantamento atualizado semestralmente pelo FMI – o Monitor Fiscal. Em particular, a comparação entre tamanho, evolução e perfil da dívida pública parece pôr o Brasil cada vez mais distante dos emergentes e mais próximo das economias avançadas – ainda longe da dívida média de 110,2% do PIB, mas já superando 13 dos 30 países do grupo.

O maior diferencial do caso brasileiro é que os não residentes são credores de só 18% da dívida dos governos brasileiros, ante a média de 26% dos emergentes e 36% dos avançados. Poucos países ostentam tão pouca dívida em mãos dos estrangeiros – casos emblemáticos são Índia (7% do total) e Japão (9% da impressionante dívida pública de 238% do PIB). Talvez por isso classificadores de risco para investidores estrangeiros pouco se preocupem com dívidas tão grandes (a brasileira hoje é igual à espanhola há dois anos).

Por trás desses números, é importante atentar para a forma peculiar como o Brasil amarrou a política fiscal com a creditícia diante da crise. Se nas economias avançadas banco central e governo diretamente tiveram de socorrer empresas e bancos e dar suporte ao fomento para retomada, cena semelhante se passou aqui, com o endividamento público alimentando a expansão do crédito e reduzindo bancos estatais ao papel de meros agentes do Banco Tesouro Nacional (o maior credor da economia).

No passado, dívida pública e externa se misturavam e investidores estrangeiros e agências multilaterais monitoravam e tentavam salvar o País e, óbvio, seus créditos. Hoje, não há por que eles se preocuparem com quem pouco lhes deve e ainda se acha criador de novo modelo fiscal e de crescimento. No futuro, pode restar o arrependimento por não ter lutado hoje por uma disciplina mínima ao endividamento do governo federal, que segue sem nenhum dos limites previstos na Constituição e na Lei de Responsabilidade Fiscal (e os projetos de lei que fixariam tetos, mesmo com grande folga, nem sequer são discutidos).

Publicidade

* ECONOMISTA, DOUTOR PELA UNICAMP, É ESPECIALISTA EM FINANÇAS PÚBLICAS

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.