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Recessão chegou aos EUA, dizem analistas. Dúvida, agora, é a duração

Para muitos especialistas, processo atual será mais longo do que os últimos dois, que ocorreram em 1990-91 e 2001

Por Patrícia Campos Mello e WASHINGTON
Atualização:

Os Estados Unidos perderam 80 mil empregos em março, a maior que a em cinco anos. O número de execuções de hipoteca cresceu 57% nos últimos 12 meses, e as vendas do varejo caíram 0,4% em fevereiro. Depois dessa enxurrada de más notícias dos últimos dias, muitos economistas pararam de se perguntar se os Estados Unidos estão entrando em uma recessão. A pergunta agora é: qual será a gravidade e a duração dessa recessão? As duas últimas recessões que os EUA enfrentaram foram curtas e leves. Tanto a crise de 1990-91, também chamada de recessão CNN (as pessoas ficaram grudadas na TV assistindo a cenas da Guerra do Golfo e não foram para as ruas consumir), como a de 2001 duraram oito meses e não foram graves. Mas esta pode ser pior. O time dos ursos (pessimistas) está bastante negativo. Economistas que vinham alertando há um certo tempo para a possibilidade de crise acham que os EUA não saem da recessão antes do fim do ano. Nouriel Roubini, professor da Universidade de Nova York e decano dos pessimistas, acha que a recessão vai durar ao menos quatro trimestres. O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que os EUA entrarão em uma "recessão leve" em 2008 e vão se recuperar, ainda que não completamente, em 2009. "Acreditamos que o consumo continuará fraco nos próximos trimestres, por causa da piora no mercado de trabalho, do crescimento lento na renda disponível, da alta nos preços de energia e mais restrições nos financiamentos para os lares", disse Simon Johnson, principal economista do FMI, durante a reunião do órgão.O Fundo prevê que os EUA vão crescer só 0,5% em 2008 (a previsão anterior era de 1,5%) e 0,6% em 2009. A grande preocupação dos economistas é o ânimo do consumidor americano, responsável por 70% do PIB do país. O consumidor, que tem endividamento de 136% de sua renda, começa a titubear depois de anos de vida de ?shopaholic? que sustentaram a economia americana. Agora, ele está sendo bombardeado por todos os lados: o colapso da bolha imobiliária, o aperto do crédito em geral, altos preços do petróleo e alimentos e piora no mercado de trabalho. Os americanos usaram suas casas como caixa eletrônico por muito tempo. Por meio de refinanciamento dos imóveis, eles compravam carros, geladeiras, móveis, e também pagavam as contas do dia-a-dia. Com os preços dos imóveis despencando, a galinha dos ovos de ouro sumiu e o consumidor começou a cortar despesas. E a alta do petróleo e dos alimentos também pesa no orçamento. CÍRCULO VICIOSO À medida que o consumo desacelera, o varejo começa a demitir. As demissões acabam causando um círculo vicioso, porque levam as pessoas a consumir menos, o que resulta em mais cortes de pessoal. Para completar, as torneiras do crédito também secaram. "Há um ano, os bancos estavam jogando dinheiro em cima das pessoas", diz Dean Baker, diretor do Centro de Pesquisas de Políticas Econômicas. "Agora, cartões de crédito e bancos estão muito mais cautelosos, depois da onda de calotes no subprime e outros tipos de financiamento." A incerteza é outro fator que assusta os economistas e os deixa temerosos de uma recessão mais prolongada. As instituições financeiras não sabem ao certo o tamanho de suas perdas, e essa incerteza as torna menos predispostas para fazer empréstimos. Segundo Carmen Reinhart, professora de Economia da Universidade de Maryland, os bancos e empresas de financiamento estão inseguros em relação ao perfil de risco dos tomadores, por isso relutam em conceder empréstimos. "Os investidores estão inseguros em relação aos balanços das empresas financeiras e se perguntam quem será o próximo Bear Stearns", diz. "Os consumidores estão inseguros em relação a seus empregos e o valor de suas casas, o que afeta o consumo", diz Carmen, co-autora do estudo This Time Is Different: A Panoramic View of Eight Centuries of Financial Crises, com Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do FMI. Com o dólar em queda, as exportações poderiam ser a tábua de salvação da economia dos Estados Unidos. "Sem dúvida, o crescimento das exportações vai ajudar a amenizar os efeitos da desaceleração", diz Carmen. "Mas a desvalorização do dólar piora as expectativas de inflação. A atual combinação de preços das commodities em alta, taxas de juros reais negativas nos EUA e dólar em queda me lembram muito o período da década de 70, que ficou conhecido pelo termo estagflação." Roubini não acredita em uma estagflação, situação que é o pior dos mundos - inflação alta aliada a economia em marcha lenta. O economista acha que a pressão sobre os preços dos alimentos e do petróleo vai diminuir à medida que a economia americana for perdendo força. PACOTE DE EMERGÊNCIA De qualquer maneira, o governo americano não está parado esperando a recessão passar. O Fed reagiu prontamente com redução de juros e o resgate do Bear Stearns, além de outras medidas de socorro a bancos. O governo está recorrendo à política fiscal. Uma medida de alívio já foi aprovada pelo Congresso (famílias vão receber uma restituição de até US$ 1,8 mil a partir de maio). Estão em estudo outras medidas para ajudar pessoas prestes a perder suas casas. Economistas como Baker, do CEPR, acham que o governo não vai parar por aí. "Ainda é necessário aumentar o prazo do seguro desemprego, que hoje é de apenas 26 semanas, expandir o programa de cupons para compra de alimentos e o auxílio para aquecimento das casas, que encareceu muito por causa da alta do petróleo." Resta saber se esse pacote de emergência será suficiente para acolchoar a aterrissagem forçada da economia dos Estados Unidos.

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