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Reclames que marcaram época e resistem ao tempo

Por Agencia Estado
Atualização:

"Veja, ilustre passageiro, o belo tipo faceiro que o senhor tem ao seu lado. E, no entretanto, acredite, quase morreu de bronquite, salvou-o o Rhum Creosotado." Os bondes, com raríssimas exceções como o que liga o centro do Rio de Janeiro ao bairro de Santa Tereza, passando pelos arcos da Lapa, já não circulam mais nas principais cidades do País. Nem o Rhum Creosotado, do farmacêutico Ernesto de Souza (1864/1928), pode ser encontrado nas farmácias e casas do ramo. Porém, os versos ficaram, resistiram ao tempo. Numa enquete realizada pelo portal www.estadao.com.br, foi citado por leitores que navegam na internet. E o que leva um verso, que começou a circular afixado nos bondes e nos postes a partir de 1918, a sobreviver tanto tempo e ao próprio produto? Para o publicitário Roberto Duailibi, o D da agência de publicidade DPZ, é a memória coletiva, o sentimento de nostalgia de um passado feliz. No caso do Rhum Creosotado, diz Duailibi, há algo mais: "São versos de uma simplicidade impressionante. São precisos e, por isso, recitados nas escolas e citados nas rodas de conversa como sinônimo da boa publicidade". Nem importa, em casos como este, a controvérsia de décadas em torno da autoria dos versos, se de Bastos Tigre, Martins Fontes ou do próprio Ernesto de Souza. Outro publicitário que adora revirar o baú da publicidade de décadas atrás, Lula Vieira, da V&S Comunicação, acrescenta que a memória coletiva do brasileiro é musical. Por isso, a força até hoje de muitos jingles, como o dos cobertores Parahyba, do maestro Erlon Chaves, ou do Café Seleto, de Archimedes Messina, passando pelos da Varig e o das Casas Pernambucanas. "São propagandas que tiveram como o veículo o rádio e os jornais, portanto, abriram as portas da percepção. Cada um podia encher com imagens próprias, individuais, aquela música coletiva porque até fotos eram raridade." Lula Vieira tem orgulho de ter buscado um dia o compositor Edson Borges, o Passarinho, para ajudá-lo a compor um jingle de Natal para o Banco Nacional. "Nasceu assim, cantarola o publicitário, o "Quero ver você não chorar,/ Não olhar pra trás,/ nem se arrepender do que faz...", e prossegue: "O Banco Nacional acabou, mas a cada Natal tenho a satisfação de ouvir nos lábios de muitos esta criação". Há quatro anos, Vieira pesquisa a música na propaganda e diz que na memória coletiva prevalecem justamente as mais harmoniosas musicalmente, que antes de vender o produto oferecem uma situação a ser lembrada e que emociona o consumidor. J.F. DiorioAEO mestre e sua caixinha de fósforoArchimedes Messina, 70 anos, compôs alguns dos jingles mais famosos da história da propaganda, entre eles o do Café Seleto. Na origem da composição, ele recorre à caixinha de fósforo. Leia mais 25 anos no ar - A mesma sensação de orgulho de Lula Vieira com o jingle do extinto Banco Nacional experimenta o publicitário Washington Olivetto, da W/Brasil, com as campanhas que criou ao longo das últimas décadas e que fazem parte do imaginário do brasileiro. "O slogan ´O primeiro sutiã a gente nunca esquece´, que criei para a Valisère, é um dos mais usados no País. Aparece em milhares de títulos e virou patrimônio da cultura popular. Isso é maravilhoso quando acontece." Olivetto também tem orgulho, que não esconde de ninguém, de figurar no Guinness, o popular livro dos recordes, como criador de uma das campanhas de maior duração da propaganda: a do garoto Bombril. O ator Carlos Moreno, que deu vida ao personagem criado por Olivetto para as famosas lãs de aço, está há 25 anos no ar. Coleciona, como o slogan do produto, mais de 1.001 caras. Tudo a ver com as suas alardeadas 1.001 utilidades. O cachorrinho da Cofap, que saía em disparada num carrinho de rolimã, é outra propaganda de Olivetto que pouca gente esquece. "É um prazer muito grande que uma propaganda, que cumpre o seu papel de vender para o cliente, também possa fazer parte dessa magia que é a cultura popular", diz Olivetto. Redondo - Já para o publicitário Fábio Fernandes, da F/Nazca, o que dá longevidade a um slogan é sua capacidade de não envelhecer, de surpreender sempre. Fernandes, que criou há sete anos o slogan "Skol, a cerveja que desce redondo", adora quando alguém se surpreende que esta criação tenha sete anos. "A sobrevivência é justamente a capacidade de o slogan não envelhecer, de se atualizar constantemente." Uma situação que também enche de orgulho o presidente da Talent, Júlio Ribeiro, a agência que criou o "Não é nenhuma Brastemp". O slogan é usado até hoje, passados 13 anos do seu lançamento, e não perdeu a atualidade, renovando-se a cada campanha, embora o sofá da sala esteja em todos os comerciais, exatamente como o sofá da apresentadora Hebe Camargo. O vice-presidente da Talent, José Eustachio, diz que essa resistência do comercial tem a ver com o fato de a Brastemp "falar direto com o consumidor". Ele gosta de citar também outros duas campanhas criadas pela Talent ainda em cartaz: "Os nossos japoneses são melhores que os japoneses dos outros", da Semp Toshiba, com mais de 12 anos de veiculação, que volta agora no fim do ano, e o de uma camisa que não existe mais, mas cujo slogan ainda é citado por muitos: "Bonita camisa, Fernandinho!" O complemento da camisa é um jingle, criado pela J.W. Thompson, que aparece em qualquer roda quando o assunto é jeans: "Liberdade é uma calça velha, azul e desbotada..." Já uma campanha de consumo de bebida responsável, criada pela DPZ de Duailibi para a Seagram, continua viva na memória. Nela, uma criança fala da sua preocupação com o pai e as lágrimas vão cedendo lugar à alegria porque este sabe beber socialmente. Para Duailibi é esta atualidade que permite à propaganda resistir até ao produto. Que o digam aqueles que nunca pegaram um bonde e vivem a recitar "Veja ilustre passageiro, o belo tipo faceiro..."

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