PUBLICIDADE

Publicidade

Recuperação brasileira aguça apostas em grau de investimento

Por JULIANA SIQUEIRA
Atualização:

A percepção de que o Brasil passou praticamente ileso à crise global de crédito está levando alguns investidores a apostar que o país receberá o selo de grau de investimento ainda este ano. Na prática, isso antecipa uma maior busca por ativos brasileiros. A nota permitirá que investidores com regras mais restritas, como muitos dos fundos de pensão dos Estados Unidos, possam aplicar no país. Analistas não prevêem uma enxurrada de recursos para o país, mas destacam que a melhora do rating abre as portas para investimentos mais duradouros. "O Brasil vai virar grau de investimento até o final do ano, no máximo no começo do ano que vem, por pelo menos uma das agências", afirmou à Reuters o economista da Itaú Corretora, Guilherme da Nóbrega. "Esse episódio todo de crise dos últimos dois meses colocou a gente bem mais perto (do grau de investimento). E é assim que as mesas de operação estão trabalhando." Em maio, as agências de classificação de risco Fitch e Standard & Poor's colocaram o rating da dívida soberana de longo prazo em moeda estrangeira a um passo do grau de investimento, em "BB+". A Moody's fez movimento mais contido, colocando a nota do país em revisão para possível upgrade. Quando isso ocorreu, a maioria no mercado dizia que o grau de investimento viria entre meados de 2008 e o início de 2009. Agora, cresce a aposta na melhora do rating ainda este ano. No fim de julho, problemas no setor de crédito imobiliário de risco dos Estados Unidos deflagraram forte correção nos mercados financeiros --que tiveram, em meados de agosto, o pior dia desde os ataques de 11 de setembro de 2001. O Ibovespa chegou a cair quase 9 por cento em um único pregão e o dólar superou 2 reais. Mas a rápida recuperação dos ativos foi vista por parte dos analistas como credencial para que o Brasil chegue em breve à faixa mais elevada dos ratings. Em entrevista à Reuters no fim de julho, a analista de ratings soberanos da S&P Lisa Schineller avaliou que a turbulência não desviaria o país da rota do grau de investimento, a não ser em caso de solavancos externos prolongados que enfraquecessem os fundamentos da economia. Para o presidente da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), Manuel Felix Cintra Neto, não há dúvida de que a proximidade do grau de investimento já está fazendo o investidor se antecipar. "O que temos visto em termos de investidores estrangeiros é que inicialmente vieram os mais agressivos, como hedge funds, e agora cada vez mais tem investidor de longo prazo interessado", comentou. QUADRO "AUSPICIOSO" O aumento do fluxo já pode ser observado nos investimentos estrangeiros em carteira ou apenas voltado para aplicações financeiras com lastro em Brasil, que totalizaram 33,30 bilhões de dólares de janeiro a agosto deste ano frente a 9,05 bilhões de dólares no mesmo período de 2006. Estimativa do Itaú aponta que somente cerca de 5 por cento dos fundos de pensão dos EUA investem em países que não possuem grau de investimento, numa indústria que, segundo o Investment Company Institute, supera a casa dos 10 trilhões de dólares. "Não é isso que vai fazer a diferença, porque muitos deles não vão investir mesmo que vire grau de investimento. Mas abre uma porta enorme", ponderou Nóbrega, da Itaú Corretora, que evitou prever como o mercado reagirá depois do upgrade. Outros analistas acreditam que o fluxo de recursos não aumentará tanto, pois o interesse por Brasil já ocorre. "O 'investment grade' por si deflagra algum fluxo adicional... mas acho que hoje em dia isso tem uma importância menor", disse Alexandre Mathias, diretor de operações da Unibanco Asset Management, explicando que o impacto era maior no passado, com a liquidez global mais restrita. "Mas como consequência do que o país construiu para chegar ao grau de investimento --uma política monetária saudável, uma política fiscal razoavelmente saudável e uma política cambial bastante benigna-- você tem hoje um quadro que é auspicioso do ponto de visto do investimento." O principal destino do fluxo deve ser a renda fixa, embora as perspectivas para a renda variável também sejam boas. As aplicações estrangeiras feitas diretamente em títulos de médio e longo prazos ---títulos públicos negociados apenas no Brasil-- somaram 8,60 bilhões de dólares de janeiro a agosto ante 3,85 bilhões de dólares em igual período do ano passado. As aplicações em ações negociadas no país totalizaram 13,4 bilhões de dólares frente os 3,06 bilhões de dólares de janeiro a agosto do ano passado. "A boa reação do mercado brasileiro mostra que os fundamentos estão mais fortes", disse Ricardo Amorim, chefe de pesquisa de América Latina do WestLB, em Nova York. Para ele, entretanto, a crise atrasou o grau de investimento por atrapalhar a redução da dívida externa e a adição de reservas. (Reportagem adicional de Daniela Machado e Angela Bittencourt)

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.