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Reforma tributária: sensatez e precipitações

Não se veem as qualidades da PEC do deputado Baleia Rossi na proposta que está sendo gestada no governo

Por Claudio Adilson Gonçalez
Atualização:

A proposta de reforma tributária de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), baseada em competente trabalho técnico do economista Bernard Appy e de seus colegas do Centro de Cidadania Fiscal (CCIF), contém ideias sensatas para tornar a tributação dos bens e serviços mais simples, eficiente e transparente. O CCIF propõe a progressiva substituição de cinco tributos indiretos atuais (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) por um único Imposto sobre o Valor Adicionado (IVA), chamado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com alíquota única, cuja receita seria partilhada entre a União, os Estados e os municípios. Por ser um imposto sobre o consumo, não incidirá sobre exportações e investimentos.

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Há certo consenso na literatura econômica quanto à superioridade dos impostos do tipo IVA, com alíquota única, sobre outras formas de tributação do consumo. O problema é como fazer isso no Brasil, onde a correção do caótico modelo de tributação vigente esbarra em fortes dificuldades de natureza técnica e política.

A utilização da tributação, principalmente do ICMS, para finalidades não arrecadatórias (como sociais, regionais e desenvolvimentistas) criou uma enorme confusão tributária, visível na guerra fiscal, no acúmulo de créditos fiscais nas empresas, no elevado número de contenciosos, na multiplicidade de alíquotas que geram privilégios para certas atividades, em vinculações que dificultam a realização eficiente de políticas públicas e em complexas questões relativas à partilha dos recursos. Neste quadro, boas propostas de mudanças no regime de tributação, dado que embutem efeitos redistributivos entre setores e unidades da Federação, sempre se defrontaram com resistências que inviabilizaram sua aprovação. E é exatamente na forma de implantação do novo tributo que a proposta é mais engenhosa e inovadora.

O CCIF propõe a introdução gradual do IBS, com transição de dez anos. Nos dois primeiros anos (período de teste), o novo tributo teria alíquota de apenas 1%, com redução compensatória da Cofins. Do terceiro ao décimo ano, haveria elevação progressiva da alíquota do IBS e redução compensatória das alíquotas dos cinco impostos a serem substituídos e que seriam extintos no fim desse período. Isso daria tempo para as empresas e os consumidores se adaptarem à redistribuição da carga tributária e às alterações de preços relativos.

Dado que o IBS, para ser um verdadeiro imposto sobre o consumo, terá como princípio a tributação no destino, também haverá significativo impacto redistributivo entre as unidades da Federação. Mais uma vez, a solução proposta é uma transição suave.  Enquanto para os contribuintes tal transição duraria 10 anos, para fins distributivos entre Estados e municípios, levaria 50 anos.

Não se nota essa sensatez no pouco que se conhece da reforma tributária que está sendo gestada no governo. Fala-se, por exemplo, na volta da CPMF, agora turbinada, incidente sobre todas as formas de pagamentos. Tal tributo é regressivo, prejudica a alocação eficiente de recursos e dificilmente poderá ser desonerado das exportações e dos investimentos, além de poder ver em breve sua base de incidência dissipar-se pelo crescimento da economia digital. Anuncia-se o fim dos encargos previdenciários sobre os salários, o que contraria o princípio da correspondência entre contribuições e benefícios na Previdência Social, necessário para evitar arbitragens danosas para o financiamento do sistema, mediante elevações fictícias dos salários de contribuição. Citam-se números irrealistas para a partilha da arrecadação entre as unidades federativas e assim por diante.

Em resumo: a PEC do deputado Baleia Rossi tem base técnica sólida e é um exemplo de sensatez. Já as informações dispersas sobre a reforma tributária do Executivo sugerem, pelo menos por ora, certa precipitação.ECONOMISTA, DIRETOR-PRESIDENTE DA MCM CONSULTORES, FOI CONSULTOR DO BANCO MUNDIAL, SUBSECRETÁRIO DO TESOURO NACIONAL E CHEFE DA ASSESSORIA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA

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