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Retomada desigual preocupa analistas

Autos e alimentos melhoram em janeiro, mas vários setores pioram

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Por Fernando Dantas
Atualização:

No momento em que a Embraer demite 20% da sua força de trabalho e a angústia em relação à economia em 2009 se intensifica, outra ameaça paira sobre a tênue retomada da indústria brasileira iniciada em janeiro. A recuperação (projetada pelos indicadores antecedentes), após a queda brusca nos três últimos meses de 2008, parece ser bastante desigual entre os setores, com vários deles podendo apresentar resultados ainda muito ruins. "É difícil dizer que o vale (pior momento) já passou", diz Jander Medeiros, analista de consumo da JGP Investimentos, empresa de gestão de recursos. Confira a evolução dos principais indicadores da atividade econômica O Índice de Situação Atual da Fundação Getúlio Vargas (FGV), componente do Índice de Confiança da Indústria que melhor mede a avaliação das empresas sobre a demanda a cada momento, teve quedas expressivas de dezembro para janeiro em importantes setores industriais: 4,4% em material elétrico e de comunicações; 8,3% no mobiliário; e 14,3% em vestuário e calçados. Esses resultados foram contrabalançados pela alta em setores como produtos alimentares e material de transporte (que inclui a indústria automobilística), que tiveram altas no Índice de Situação Atual de respectivamente 10,3% e 4,6% em janeiro. O problema, porém, para vários analistas, é que o setor automotivo pode estar se recuperando por causa de uma queda muito forte no fim do ano passado. O bom desempenho dos alimentos, por sua vez, é compatível com a atual fase da contração econômica, que ainda está mais concentrada nos produtos dependentes de crédito. "Quando desagreguei o resultado por setores, fiquei mais preocupado porque o índice mostra que há segmentos nobres de consumo, como eletrônicos, mobiliário e vestuário, que ainda têm quedas muito significativas", diz Vagner Ardeo, vice-diretor do Instituto Brasileiro de Economia, da FGV no Rio. Bráulio Borges, da LCA Consultoria, está mais otimista. Ele nota que a indústria automobilística é responsável, direta ou indiretamente, por 25% da produção industrial, afetando segmentos como siderurgia, petroquímica, etc. "É um poder de influência muito grande, e essa recuperação é um bom sinal para economia como um todo", diz. Um ponto comum nas análises é que o setor automobilístico foi o que pisou com mais força no freio no último trimestre do ano passado, exagerando a dose e provocando a reaceleração em janeiro. "A fábrica da Ford na Bahia, por exemplo, praticamente não operou em dezembro", observa Borges. Outros setores de bens duráveis, porém, como eletrodomésticos e móveis, não tiveram freada tão drástica. "Eles ainda têm de se preocupar em reduzir os estoques antes de aumentar a produção", acrescenta. Medeiros, da JGP, nota que fator determinante no desempenho dos setores é a dependência ou não do crédito (exceto a indústria automobilística, com sua dinâmica particular). Nos alimentos, que não têm vínculo com crédito, o bom momento se reflete no desempenho de empresas como Wal-Mart, que manteve planos de investimento de R$ 1,5 bilhão, e do Pão de Açúcar, que retomou projetos. O aumento real do salário mínimo também deve ajudar. Outro segmento que vai bem, acrescenta o analista, é o de cosméticos. Assim como os alimentos, são produtos que podem ter a demanda até ampliada num primeiro momento de retração, à medida que o consumidor corta bens duráveis mais caros. "A pessoa não comprou presente de Natal, mas dá uma melhoradinha na ceia", resume Ardeo, do Ibre. Uma preocupação, porém, é que esses setores sejam mais afetados no momento em que o pior da crise se transferir do crédito para o emprego, como parecem indicar os recentes resultados sobre mercado de trabalho do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). John Welch, economista global do Itaú, porém, acha que a queda da inflação pode poupar o setor de alimentos de um ajuste mais drástico.

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