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Rigidez no crédito segura a inadimplência

A indústria automobilística ainda vive a ressaca do crédito fácil do início da década passada. Os números do Banco Central (BC) mostram que a inadimplência do consumidor brasileiro, que atingiu 7,23% em 2012, vem diminuindo ao longo dos últimos meses, mas boa parte dessa queda pode ser explicada pela maior restrição dos bancos na concessão de dinheiro para a compra do veículo. Por outro lado, o brasileiro também está com a capacidade financeira comprometida, o que o afasta de novas compras.

Por Luiz Guilherme Gerbelli e Renée Pereira
Atualização:

Os dados do BC, compilados pela Boa Vista SCPC, mostram que, em julho, a inadimplência (acima de 90 dias) foi de 4,77%, abaixo dos 5,95% de igual período do ano passado. "Atualmente, temos um cenário de inadimplência que recuou bastante, mas essa queda foi influenciada pela maior seletividade dos bancos e pela diminuição do consumo", afirma Flávio Calife, economista da Boa Vista.

Para tentar animar as vendas, montadoras fazem feirões de veículos Foto: Werther Santana/Estadão

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Na avaliação do economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Nicolas Tingas, o problema hoje é diferente daquele enfrentado há um ano e meio.

Em 2012, com o surto de inadimplência, os bancos fizeram uma série de aperfeiçoamentos nos critérios de risco e na forma de avaliar a capacidade de pagamento do cliente. Foi detectado que os empréstimos de 60 meses sem entrada eram os que mais davam problema. "Isso foi mudado em 2013, quando os bancos diminuíram os prazos para três a quatro anos."

De acordo com dados de julho do BC, o prazo médio de concessão é de 41,6 meses. Em março de 2011, era de 46,3 meses. De acordo com Tingas, hoje os próprios consumidores evitam entrar em novas dívidas, pois há uma baixa capacidade financeira no seu fluxo de caixa. Isso faz com que a propensão das famílias brasileiras ao consumo caia.

"O nível de endividamento está muito alto, o que comprometeu a renda dos consumidores por um prazo mais longo. Junta-se aí a inflação e os juros mais altos. Hoje o foco dos consumidores é rolar suas dívidas, trocar créditos curtos por créditos longos", afirma Tingas.

Incentivos. No mês passado, o Banco Central lançou novos pacotes de estímulo para a concessão de crédito para tentar revigorar a economia diante do baixo crescimento brasileiro. No segundo trimestre deste ano, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil diminuiu 0,6% na comparação com os primeiros três meses do ano. O desempenho da indústria foi pior: recuou 1,5% no período.

O encolhimento da economia colocou o Brasil na chamada recessão técnica - no primeiro trimestre, a economia encolheu 0,2%.

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No conjunto das medidas anunciadas para reaquecer a economia, estavam novos incentivos ao financiamento de veículos com mudanças nos depósitos compulsórios (parte dos recursos dos clientes que os bancos são obrigados a recolher aos cofres do Banco Central) - alguns bancos públicos e privados já anunciaram redução nas taxas para os financiamentos.

"Existe uma disposição menor do brasileiro para consumir, e confiança baixa. Apesar de tudo isso, alguns dos principais bancos anunciaram queda nas taxas para os veículos", afirma Calife, da Boa Vista.

Neste fim de semana, por exemplo, a Renault promove um feirão em São Paulo com taxa zero de juros, IPVA grátis e primeiro pagamento em 2015. Até o fim do ano, outras montadoras devem aderir a essa estratégia como forma de desovar o elevado estoque.

"Os bancos estão carecendo de fazer negócios. Estão buscando outros meios e nichos onde conhecem os clientes, tidos como bons pagadores", completa Tingas, da Acrefi.

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O presidente da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), Flávio Meneghetti, não acredita que as medidas adotadas recentemente pelo Banco Central tenham força para mudar o cenário no curto prazo. "O ano de 2015 deve repetir 2014. Pode ser que haja uma recuperação em 2016", afirma ele.

Legislação. Meneghetti critica a atual legislação que dificulta a retomada do automóvel pelo banco em caso de inadimplência. Hoje, diz o executivo, de cada 100 contratos inadimplentes, as instituições financeiras só conseguem recuperar 15 carros. "Isso depois de 200 dias tramitando no judiciário."

O presidente da Fenabrave afirma que o setor vem trabalhando com o governo federal para tentar alterar as regras ainda neste ano, em novembro. "Essa mudança tem potencial para aumentar em 20% as aprovações de crédito no setor."

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