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Riscos e oportunidades do acordo EUA-UE

Estados Unidos (EUA) e União Europeia (UE) iniciaram negociações para um ambicioso e amplo acordo transatlântico de comércio e investimentos. O acordo traz boas e más notícias para o Brasil. Primeiro as boas notícias. Conforme estudo do Centre for Economic Policy Research de Londres, o acordo poderá gerar ganhos econômicos tanto para a União Europeia, estimados em € 119 bilhões por ano, quanto para os Estados Unidos (€ 95 bilhões por ano), até 2027. Os benefícios para a União Europeia e os Estados Unidos, afirma o instituto, não ocorrerão às expensas do restante do mundo. Ao contrário, a liberalização do comércio entre a União Europeia e os Estados Unidos poderá ter um impacto positivo sobre o comércio e a renda disponível globais, promovendo um aumento da renda mundial de quase € 100 bilhões. Os ganhos de renda resultariam do aumento do comércio, com aumentos de 6% nas exportações da União Europeia e de 8% nas dos Estados Unidos. O cerne da liberalização do comércio entre os parceiros transatlânticos consiste na redução de barreiras não tarifárias. Cerca de 80% do total dos ganhos potenciais decorrerá da convergência da regulação e da resultante liberalização do comércio de serviços e de compras governamentais nos dois lados do Atlântico. Estima-se que o aumento na atividade econômica e nos ganhos de produtividade criados pelo acordo fará aumentar salários e criará ocupação para trabalhadores qualificados e não qualificados. Por fim, estima-se que o acordo terá efeitos negligenciáveis sobre as emissões de CO2 e sobre o uso sustentável de recursos naturais. As boas notícias caracterizam as oportunidades criadas pelo acordo para as partes contratantes, das quais poderá beneficiar-se a comunidade internacional. Passemos, agora, aos desafios. Os impactos sobre o restante do mundo - dado o papel central da eliminação de restrições não tarifárias ao comércio de bens e serviços e aos investimentos - dependem de forma crítica do potencial de convergência de terceiros países e do bloco EUA-UE a novos padrões regulatórios. Os padrões resultantes do acordo servirão de base para padrões regulatórios globais e poderão servir de base para a redução multilateral de barreiras não tarifárias. Se assim for, o processo de convergência poderá levar à melhoria do acesso por terceiros países aos mercados do bloco EUA-UE. Há três canais pelos quais a convergência dos marcos regulatórios poderá beneficiar terceiros países. Primeiro, pela redução de custos de exportar produtos e serviços para os Estados Unidos e União Europeia sob diferentes marcos regulatórios. Segundo, de forma indireta, se forem firmados acordos bilaterais entre o novo bloco - o maior bloco comercial do mundo - e terceiros países. Terceiro, a convergência dos marcos regulatórios de terceiros países e do bloco EUA-UE poderá estimular o comércio entre esses terceiros países. Se isso vier a ocorrer, será possível compensar pelo menos uma parcela do desvio de comércio resultante do acordo. Caso haja vontade política para iniciar uma discussão em torno da convergência de marcos regulatórios, talvez fosse benéfico começar esse processo entre os países da América do Sul para, em etapa posterior, buscar reduzir as disparidades regulatórias entre esses países e o bloco EUA-UE. É claro que não se trata de processo de negociação trivial. Há que levar em conta que alguns países da América do Sul já têm acordos de livre comércio com os Estados Unidos e a formação, em andamento, do bloco comercial unindo Chile, Peru, Colômbia e México. Dois desses países já têm acordos de livre comércio com os Estados Unidos. Finalmente, está também em formação uma zona de livre comércio entre os Estados Unidos e diversos países do Pacífico, consolidando acordos bilaterais já existentes e criando um bloco comercial e de investimentos na região. Tudo isso recomenda reavaliar os interesses nacionais e a inserção do Brasil na nova economia mundial. Estamos geograficamente distantes do Pacífico e do Atlântico Norte, as duas principais correntes de comércio e investimentos. Talvez seja a hora de repensar se não estamos também distantes das principais tendências que moldarão o futuro das relações do Brasil com seus parceiros nos próximos 25 anos - e como utilizar em nosso favor essas tendências.

Por Roberto Fendt
Atualização:

* Roberto Fendt é diretor executivo do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).

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