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Roberto Azevêdo foi alvo de espionagem

Nova Zelândia monitorou os e-mails do diplomata brasileiro na época em que Azevêdo era candidato a diretor-geral da OMC

Por Jamil Chade
Atualização:

GENEBRA - O diplomata brasileiro Roberto Azevêdo foi alvo de espionagem enquanto era candidato para o cargo de diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), posto que hoje ele ocupa.

Usando tecnologia fornecida pelos EUA e num acordo com governos anglo-saxões, a Nova Zelândia espionou os e-mails e o tráfego de internet do brasileiro em 2013, às vésperas das eleições em Genebra. Ao Estado, Azevêdo declarou que não estava ciente das revelações.

O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, Roberto Azevêdo Foto: André Dusek/Estadão

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As informações foram publicadas neste domingo, 22, pelo jornal New Zeland Herald e pelo site americano The Intercept, com base em documentos vazados. Há poucas semanas, essas mesmas publicações passaram a usar documentos fornecidos por Edward Snowden, o ex-funcionário da CIA, para revelar o papel da Nova Zelândia em operações de espionagem e na colaboração com a Casa Branca.

Em 2013, a OMC passava por um de seus momentos mais críticos e com uma disputa que envolvia nove candidatos, algo inédito. O controle da entidade era considerado como algo estratégico pelos países emergentes, principalmente depois de ficar sem o FMI ou o Banco Mundial. Tim Groser, ministro do Comércio da Nova Zelândia, era um dos principais oponentes aos nomes lançados pelos emergentes e era apoiado pela Casa Branca.

O que as revelações indicariam é que Groser recebeu também o apoio do serviço secreto. Mas acabou sendo derrotado pelo brasileiro na votação, no dia 16 de maio daquele ano.

Chamada de "Projeto OMC", a operação de espionagem foi conduzida pelo Escritório de Segurança de Comunicações da Nova Zelândia (GCSB). O objetivo não era apenas espionar Azevêdo, mas também os demais candidatos do México, Gana, Costa Rica ou Indonésia. O documento obtido pela reportagem é datado de dez dias antes da votação, quando já se sabia que Groser não venceria.

O brasileiro era o único entre nove candidatos que não tinha sido pelo menos ministro de seu país. Mas venceu a eleição graças a sua promessa de que agiria em nome de todos os governos e diante de seu profundo conhecimento das entranhas da OMC.

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No documento que revela a ordem de iniciar a espionagem, as autoridades dão autorização para que e-mails com o nome de "Azevedo" sejam consultados. As autoridades do país estariam agindo em colaboração com a NSA, a agência americana denunciada por Edward Snowden.

Neste domingo, o primeiro-ministro, John Key, se recusou a comentar a publicação. Mas seus assessores alertaram que não existiria uma espionagem em massa e que a agência estaria atuando de forma legal. "O governo não responderá a alegações feitas de documentos roubados por Edward Snowden", alertou.

Groser também adotou uma linha de negar qualquer tipo de envolvimento, alertando que não comentaria já que "esses vazamentos frequentemente estão errados".

Ao Estado, Azevêdo apenas indicou que não sabia das revelações. O porta-voz da OMC, Keith Rockwell, afirmou que "desconhecia" o conteúdo dessas reportagens e dos documentos. "Não temos nada a comentar por enquanto", declarou.

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Operação. Segundo o documento vazado, a operação de monitoramento ocorreu com a ajuda do programa XKeyscore, desenhado pela NSA, nos Estados Unidos, e usada pela Nova Zelândia como parte da rede de inteligência chamada Five Eyes. Além de neozelandeses e americanos, a rede inclui Canadá, Austrália e Reino Unido.

A operação foi desenhada para que as comunicações eletrônicas com a menção dos nomes dos candidatos fossem recolhidas. Segundo o jornal, a Xkeyscore é administrada diretamente pela NSA e usada para analisar bilhões de e-mails e chats online de mais de 150 locais diferentes do mundo.

Em resposta ao jornal que revelou o escândalo, a GCSB insistiu que seu mandato é o de "proteger a Nova Zelândia" e que isso inclui "um trabalho externo de inteligência". Mas negou dar detalhes do programa. "Não comentamos com base em especulação. Tudo o que fazemos é explicitamente autorizado", disse.

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Mas, no país, a revelação ganhou uma conotação de crise. O líder do Partido Trabalhista, Andrew Little, declarou ter ficado "horrorizado" diante das revelações. "Isso não está incluído no mandato da agência e não tem qualquer relação com segurança", atacou. Já o chefe do Partido Verde, Russel Normal, declarou que teme que a informação seja "extremamente negativa para a reputação da Nova Zelândia".

Um dos que comentou a revelação foi o ex-candidato sul-coreano, Taeko Bank. "Eu não tive qualquer tipo de informação via uma organização de inteligência. É um mundo diferente o dos países avançados", completou.

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