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'Safra dos ventos' bate recorde e usinas eólicas reduzem risco de racionamento

Enquanto falta água nos reservatórios das hidrelétricas, a produção de energia eólica avança e deve responder por uma média de 20% do abastecimento elétrico no Brasil entre junho e novembro

Foto do author André Borges
Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - Os ventos têm indicado o caminho para que o Brasil atravesse uma das estiagens mais severas da história, sem que falte energia elétrica nas casas da população. Entre junho e novembro, uma média de 20% do abastecimento elétrico nacional será suprido com a geração eólica. Esse volume recorde de geração é resultado da “safra dos ventos”, como é conhecido este período do ano, quando as rajadas se tornam mais constantes e fortes, em contraposição à redução das chuvas que afeta boa parte do País. 

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Se falta água nos reservatórios das hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste, sobra vento nas costas do Rio Grande do Norte, da Bahia e do Rio Grande do Sul. É isso o que tem ajudado a equilibrar a geração de energia. 

No início desta semana, 16% do consumo diário de energia em todo o País foi suprido pelos parques eólicos. Os aerogeradores já chegam a alimentar o consumo de um dia inteiro da Região Nordeste, como ocorreu em 22 de julho, conforme os dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A tendência é de crescimento. As estimativas apontam que, em horários de pico, as eólicas vão atender cerca de 23% do mercado total de energia do Brasil. Como o sistema de transmissão interliga todo o País, essa geração ajuda a reduzir a pressão sobre os reservatórios de hidrelétricas, que podem guardar mais água para tentar reduzir os impactos da pior crise hídrica dos últimos 91 anos. 

“Atualmente as eólicas já abastecem, em média anual, cerca de 13% da demanda de energia no Brasil e, neste segundo semestre, essa média saltará para 20% de abastecimento. E não é só no Nordeste que os recordes são registrados. Embora tenhamos cerca de 80% da capacidade instalada nessa região, o Sul do Brasil também tem uma capacidade instalada importante”, diz Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica)

Essa capacidade de colheita dos ventos é resultado dos investimentos pesados que o setor recebeu nos últimos anos. Há dez anos, a fonte eólica não passava de uma experiência dentro da matriz elétrica, com pouco mais de 900 megawatts de capacidade instalada em algumas dezenas de parques eólicos. Uma década depois, esse volume se multiplicou por 20 e já chega a 19 mil megawatts. São mais de 720 parques que, diariamente, colocam para girar 8.550 cataventos nos principais corredores de vento do território nacional. 

No ano passado, o Brasil foi o terceiro país do mundo que mais ampliou sua capacidade de geração, com 2.297 megawatts adicionados em 2020, ficando só atrás da China e dos Estados Unidos. O setor recebeu cerca US$ 4 bilhões (aproximadamente R$ 21 bilhões) em investimentos em 2020. Considerado o período de 2010 a 2020, foram US$ 37,3 bilhões injetados nos parques eólicos.

“Neste período do ano, os ventos ficam mais fortes que a média, tendo um comportamento oposto às chuvas. Devido à seca, os ventos ficam mais fortes. Para produzir energia eólica, são necessários ventos estáveis, com a intensidade certa e sem mudanças bruscas de velocidade ou de direção”, diz Elbia Gannoum. “O Brasil tem a sorte de ter uma quantidade enorme desse tipo de vento, o que explica o sucesso da eólica no País nos últimos anos.”

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Parque eólico no litoral do Rio Grande do Norte. Foto: JF Diorio/Estadão - 2/9/2017

Reportagem do Estadão mostrou que, enquanto o nível dos principais reservatórios do País não para de cair, o consumo de energia elétrica tem aumentado e já supera o patamar pré-pandemia. Em junho, o consumo total do Brasil cresceu 12,5% em relação a igual período de 2020, puxado sobretudo pelo setor industrial, com expansão de 19,4%, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). No ano, o uso da eletricidade em todo o País subiu 7,7% e deve continuar em alta nos próximos meses. O governo, até o momento, tem afastado o risco de desabastecimento. 

Antes de contar com as usinas eólicas, o País dispunha, basicamente, das fontes térmicas para aliviar a situação das hidrelétricas. A queima de diesel, gás e biomassa, além da fonte nuclear, continua a ter papel central na produção de energia, respondendo por até um terço do consumo neste momento. Como estão a plena carga, porém, um cenário sem a geração das eólicas, hoje, seria catastrófico. As hidrelétricas respondem por 62% da capacidade nacional de produção de energia, mas têm entregado apenas 52%, em média, por causa do baixo nível de seus reservatórios.

“Em 2001, quando enfrentamos um racionamento de energia, a situação era muito diferente e mais de 85% da geração era hídrica. De lá para cá, a matriz se diversificou. Podemos ajudar o País nos momentos de escassez de chuvas”, comenta Elbia.

Expansão da geração eólica

O crescimento da geração eólica já está contratado. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já homologou a construção de mais 163 parques eólicos no País. Serão injetados mais 5.445 megawatts de potência ao parque nacional. Como os leilões são realizados anualmente, esse volume tende a crescer. 

O Brasil, que até 2013 ocupava a 13ª posição no ranking mundial de geração eólica, fechou 2020 como o sétimo país que mais consome energia produzida pela força dos ventos, só atrás de China, Estados Unidos, Alemanha, Índia, Espanha e França.

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