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Sem pagar conta, governo de Roraima tem luz cortada em serviços não essenciais

A concessionária Roraima Energia cobra dívida de R$ 88 milhões da gestão do governador Antonio Denarium, mas o Estado deve no total R$ 739 milhões; governo disse que vai entrar na Justiça e afirma que empresa também deve ao Estado

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Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - Diversas secretarias de administração do governo de Roraima estão no escuro nesta quarta-feira, 14. A concessionária Roraima Energia decidiu dar um basta ao calote que o governo estadual tem dado na conta de luz e enviou agentes para cortar a energia de secretarias que prestam serviços considerados não essenciais, como de saúde e segurança pública. 

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O corte de energia já tirou a rádio estadual do ar, com interrupção do abastecimento da Rádio Difusora de Roraima (Rádio Roraima). Estão no escuro ainda a Companhia de Desenvolvimento de Roraima (Codesaima) e a Secretaria de Estado do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes). Ao todo, 16 órgãos do governo estadual ficaram se luz, incluindo a Casa Civil e Ouvidoria.

A empresa afirma que fez de tudo para chegar a um acordo de quitação de dívida com o governador Antonio Denarium (ex-PSL, sem partido), mas o caso não avançou. Do início da atual gestão estadual, janeiro de 2019, até agora, já se acumula uma dívida vencida e não paga de aproximadamente R$ 88 milhões.

Funcionários da Roraima Energia fazem corte de luz de secretarias do governo do Estado. Foto: Assessoria de imprensa da Roraima Energia

Por meio de nota, a Roraima Energia declarou que “essa inadimplência se tornou insustentável, afetando drasticamente o caixa da empresa” e que essa situação resultou na redução do fornecimento de óleo diesel. “Diariamente, cerca de 1 milhão de litros de combustível são comprados pela empresa para garantir a geração de energia para todo o Estado, único ainda não interligado ao Sistema Interligado Nacional e, por isso, depende essencialmente da geração feita por usinas térmicas locais”, explicou a concessionária.

A respeito da tentativa de acordo, a empresa afirma que, desde que assumiu o fornecimento, “buscou de todas as formas uma negociação amigável junto ao governo do Estado, fato que, lamentavelmente, não ocorreu”.

“Diante de um cenário em que a inadimplência poderia comprometer o fornecimento aos demais clientes, foi inevitável a tomada de medidas mais efetivas amparadas pela legislação federal (Resolução Normativa 414/10/ANEEL), como a suspensão do fornecimento de energia elétrica aos serviços não essenciais do governo do Estado de Roraima, pois entendemos que, pelo princípio da isonomia, direitos e obrigações devem ser iguais desde o consumidor mais humilde até o Poder Público”, informou a distribuidora. 

Segundo a concessionária, somente ao governo de Roraima são repassados mensalmente cerca de R$ 25 milhões em arrecadação de ICMS pelos processos de geração e distribuição de energia. “Desta forma, cumprimos com pontualidade todos os compromissos, sejam obrigações tributárias ou de outra natureza, perante o ente estadual”, afirmou.

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Por meio de nota, o governo de Roraima informou que está ingressando com uma ação na Justiça, pedindo a religação de energia nos prédios públicos, por conta do atendimento da necessidade da população. “Já existe nesse sentido uma liminar que garante que serviços essenciais não podem deixar de serem fornecidos”, declarou.

O governo relembrou que tentou negociação com a empresa a respeito das dívidas deixadas por gestões anteriores, “mas até o momento a negociação não foi concluída”.

Segundo o governador, a Roraima Energia fez a aquisição em leilão, em 2019, da companhia estatal CERR, por R$ 297 milhões, e até hoje não pagou a dívida ao governo do Estado.

A empresa nega essa inadimplência. “Quanto ao pagamento dos ativos oriundos da antiga concessão da CERR, a Roraima Energia já tratou, nos termos do Edital de Leilão n.° 2/2018- PPI/PND, e vem honrando com seu compromisso com o governo estadual”, respondeu.

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Calote

O Estadão tem acompanhado o drama do abastecimento no Estado. Reportagem publicada em setembro revelou que o governo acumula uma dívida histórica de energia que já chega a R$ 739 milhões. O calote já tem comprometido a capacidade da empresa de comprar combustível para abastecer suas usinas e que pode causar, inclusive, racionamento de luz, prejudicando a população de 605 mil habitantes de Roraima.

O Estadão teve acesso a uma carta que a Roraima Energia enviou ao governador do Estado, Antônio Denarium. No documento, que também chegou ao Ministério de Minas e Energia, a empresa cobra o governo estadual pela inadimplência, diz que a dívida a obrigou a reduzir sua capacidade de compra de combustível para abastecer as usinas térmicas do Estado e que já foi até alvo de uma ação extrajudicial por causa dos riscos de racionamento que essa situação pode resultar.

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O governador eleito pelo PSL em 2019 tem alinhamento estreito com Jair Bolsonaro e deixou o partido quando o presidente anunciou que teria uma nova legenda. 

No fim do dia, depois de uma reunião com a concessionária, o governador Antônio Denarium afirmou ao Estadão que, finalmente, chegou a um acordo com a empresa. “Conseguimos, finalmente, acertar o pagamento das dívidas, para não ficar mais nenhum centavo em aberto. Nesta quinta-feira, já vamos depositar uma primeira parcela de R$ 23 milhões”, disse. A promessa é que todas as religações estejam normalizadas até essa quinta-feira, 15.

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Segundo Denarium, o acordo envolveu a retirada de juros e multas do passivo total de R$ 739 milhões, que acumulava dívidas de mais de duas décadas. Com a negociação, o valor a ser pago, disse, será de aproximadamente R$ 103 milhões, no prazo de cinco meses. Na próxima semana, a concessionária de energia deverá negociar as dívidas com a Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (Caer), de mais R$ 110 milhões. “O governo do Estado de Roraima, com esse acordo, nunca mais vai atrasar um dia sequer de pagamento de conta de luz”, comentou.

Desde março do ano passado, Roraima depende completamente da energia gerada por usinas térmicas movidas a óleo diesel, devido ao fim do contrato que o governo brasileiro mantinha com a estatal venezuelana Corpoelec. Isso fez com que, de um dia para o outro, o volume de combustível queimado para levar luz à população saltasse de 103 mil litros por dia para 1,067 milhão de litros diários, mais de dez vezes a quantidade anterior.

No fim de setembro, esse aumento exponencial de gastos levou a uma conta que a concessionária de energia de Roraima não consegue pagar, o que já fez com que fornecedores cortassem em 50% o volume de óleo entregue, causando uma redução extrema no estoque do insumo. No mês passado, a crise atingiu seu momento mais agudo.

Com o corte no abastecimento, o Estado viu seu estoque de óleo diesel minguar. Apesar de uma portaria de 2017 do Ministério de Minas e Energia prever que o estoque de combustível deve ter autonomia de oito dias, ou seja, garantir esse tempo mínimo de geração mesmo ser ter novo abastecimento, a situação atual é de apenas três dias de autonomia.

Na ocasião, a Roraima Energia afirmou que “o cenário atual exige que o volume de combustível atualmente praticado no contrato não sofra nenhum tipo de interrupção ou atraso, por ser insumo imprescindível à única fonte de geração de energia elétrica, sob pena de resultar em apagões e racionamento de energia elétrica à população”.

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