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Senado quer suspender aval do Cade a união de duas empresas até outubro

Pelo texto, companhias não terão que notificar o Cade quando firmarem contrato associativo, joint venture (união de duas ou mais companhias) ou consórcio

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Foto do author Lorenna Rodrigues
Por Daniel Weterman e Lorenna Rodrigues (Broadcast)
Atualização:

BRASÍLIA - O Senado vai votar nesta sexta-feira, 2, uma proposta que suspende, até outubro, a exigência de aval do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para alguns negócios entre empresas. A medida faz parte de um projeto amplo que flexibiliza regras contratuais durante a crise do novo coronavírus no Brasil. O órgão vê riscos de, com a proposta, empresas se associarem para dominar mercados.

Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Foto: REUTERS/Adriano Machado

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Pelo texto, as companhias não terão que notificar o Cade quando firmarem contrato associativo, joint venture (união de duas ou mais companhias) ou consórcio. Esse tipo de negociação, atualmente, precisa ser autorizada pelo órgão se durar por um período superior a dois anos. Fusões e aquisições continuariam seguindo as regras atuais, pelas quais o conselho tem que dar o aval antes de o negócio ser fechado. 

A relatora da proposta, Simone Tebet (MDB-MS), adiantou ao Estadão/Broadcast Político que vai ajustar o ponto sobre o Cade para permitir a aprovação do texto. O conteúdo do parecer, porém, ainda não foi apresentado.

O Cade é o órgão concorrencial que analisa, previamente, operações realizadas entre empresas. O objetivo é verificar se os negócios apresentam risco para a concorrência e prejudicam os consumidores. Também cabe ao Cade julgar cartéis e outras infrações à ordem econômica.

O projeto na pauta do Senado determina ainda que, até outubro, não serão mais consideradas infrações a venda de mercadoria abaixo do preço de custo (o chamado preço predatório) e o encerramento de atividades da empresa sem justa causa. 

O projeto foi idealizado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e protocolado pelo vice-presidente do Senado, Antonio Anastasia (PSD-MG), como forma de abrandar regras do direito privado durante a crise causada pela pandemia.

O presidente do Cade, Alexandre Barreto, disse ao Estadão/Broadcast que, apesar de a ideia de aliviar obrigações burocráticas para as empresas durante a crise ser positiva, há riscos de a falta de análise pelo órgão permitir que empresas se associem para dominar mercados. “O que nos preocupa é que o projeto original não estabelece uma duração para o acordo entre as empresas. Poderia ser para a vida inteira e nunca precisaria ser notificada ao Cade”, afirmou.

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Ele dá como exemplo setores com poucos concorrentes, como o de proteína animal, em que duas empresas poderiam formar um joint venture e atuar como um monopólio por muitos anos, caso o texto original seja aprovado. “O risco de empresas se aproveitarem da brecha legal de forma oportunista para estabelecer um oligopólio ou dominar o mercado é muito grande”.

Barreto disse que representantes do Cade têm conversado com senadores para que o projeto seja alterado para prever que as empresas só possam fazer acordos sem notificar ao Cade durante o período da crise, que não serão válidos após a calamidade. Outro pedido foi que seja incluído no texto a garantia de que o Cade poderá, posteriormente, investigar esses acordos. 

Já em relação à retirada de ações do rol das infrações econômicas, Barreto disse ter menos impacto. "Temos observado poucos casos de preços predatórios ou outros tipos de infrações.O mais grave é o cartel, que está fora desse projeto”, completou.

Especialistas concordam que a medida abre margem para realização de negócios não relacionados à covid-19 nesse período. Isso porque a suspensão da notificação não está restrita a acordos envolvendo ações para combater a doença, como uma parceria para produzir máscaras, por exemplo.

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“O risco que se pode verificar são ações que podem ser muito restritivas e no futuro afetar prejudicialmente a economia brasileira serem executadas nesse período e não ficarem sujeitas ao Cade. É o principal risco da proposta”, afirmou o advogado Paulo Casagrande, sócio de antitruste de Trench Rossi Watanabe.

Outra observação feita é que o Cade já decidiu considerar a situação da crise na análise de acordos e a legislação atual permite essa excepcionalidade. Uma dúvida levantada por companhias é se as negociações feitas no período deverão ser informadas ao Cade após 31 de outubro.

"A intenção do projeto é importante e louvável, mas suspender a obrigação de notificação sem criar uma relação com o objetivo da parceria acaba criando uma isenção muito ampla que beneficiaria inclusive operações que não têm relação com a crise", comentou o advogado Marcio Soares, do escritório Mattos Filho.

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