'Só vamos perceber um alívio mais claro na inflação no primeiro semestre de 2022', diz economista

Fábio Romão acredita que o IPCA vai desacelerar até fechar o ano em 8,7%, mas diz que o cenário é preocupante porque problemas concomitantes pressionam ainda mais os preços

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Por Márcia De Chiara
4 min de leitura

Para o economista Fábio Romão, da LCA Consultores, o cenário da inflação hoje é preocupante. Emsetembro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) atingiu1,16%, a maior variação para o mês em 27 anos. A preocupação, segundo o economista, decorre do fato de haver no momento vários problemas concomitantes que põem mais pressão nos preços. Entre eles estão as cotações dos bens industriais impulsionadas pela escassez de matérias primas, a elevação dos preços administrados puxados pela energia elétrica e pelos combustíveis e também o potencial aumento dos serviços, que deve ser chancelado pela retomada das atividades.

Nas contas do economista, a inflação em 12 meses atingiu o pico em setembro, com alta de 10,25%. Deve desacelerar daí para frente, mas fecha o ano em 8,7%, que é um nível extremamente alto e deve trazer uma inércia inflacionária importante para 2022. Para o ano que vem, Romão espera uma inflação de 4,5%, muito mais perto do teto da meta (5%) do que do centro (3,5%). A seguir, os principais trechos da entrevista.

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A alta de 1,16% da inflação em setembro surpreendeu?

O resultado veio abaixo do que projetamos e da mediana do mercado, mas é uma alta importante e preocupante. Esse resultado não muda minha estimativa para este ano de uma inflação 8,7% que vai gerar uma inércia importante para 2022. Por isso, projeto 4,5% para o ano que vem. 

Por que o resultado é preocupante?

Se pegarmos a mediana da inflação dos meses de setembro da década passada, ela foi de 0,5% e hoje temos 1,16%. Temos vários problemas concomitantes que geram pressões de preços. Um deles é a alta dos bens industriais, que fecharam o ano passado em 3,2%, e em 12 meses até setembro estão em 10,5%. Projeto que encerrem o ano em 9,5%, o segundo maior aumento da série. Outro ponto é a alimentação no domicílio, que está em 14,7% em 12 meses e deve fechar o ano em 8,4%. Também é uma pressão importante. Também a vacina no braço significa maior circulação de pessoas, o que chancela o reajuste dos serviços. Os serviços subiram 1,6% em 2020, começaram a acelerar a partir de meados do ano e devem fechar 2021 com alta de 4,5%. Além disso, tem os preços monitorados, sobretudo da energia elétrica. A energia elétrica está em tudo. Ela pressionou diretamente o IPCA de setembro por causa da escassez hídrica.

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A inflação hoje atingiu o pico?

Para outubro espero um aumento de 0,70% do IPCA. Não é pouco, mas vai representar uma desaceleração em 12 meses, do índice, que sai de 10,25% em setembro para 10,07% em outubro, indo para 9,56% em novembro. O ano fecha em 8,7%. É um resultado bem alto, mas é difícil imaginar que a inflação em 12 meses permaneça em dois dígitos por causa da forte base de comparação que foi o final do ano passado. A alimentação está perdendo ritmo de alta, o que é parcialmente uma boa notícia.

Fábio Romão, economista da LCA Consultores. Foto: Marisa Cauduro/LCA Consultores - 1/10/2021

Quais os riscos que há pela frente?

O preços dos combustíveis é um deles. Com a piora do cenário global energético em razão da diminuição da oferta de gás natural, o consumo global de óleo e gasolina pode crescer e pressionar os preços dos combustíveis. Outro risco é a crise hídrica. A bandeira de escassez hídrica deve continuar até abril, mas existe o risco de se ter um sobrepreço ainda maior antes de abril de 2022. O discurso é que não vai mudar. Mas há esse risco. Outro ponto são os bens industriais, que tiveram uma avalanche de custos. Parte disso foi repassado e parte disso, não. O desarranjo das cadeias produtivas não passou. Os serviços também preocupam. Há uma demanda reprimida por serviços. Com o isolamento social, as famílias acabaram fazendo uma poupança forçada, deixaram de viajar, por exemplo, e podem voltar agora. Existe uma predisposição de gastar mais com serviços e a estrutura de oferta é menor, o que pode significar mais aumentos de preços também. O IPCA de 8,7% projetado para este ano é óbvio que joga muita inércia inflacionária para o ano que vem. Por isso, espero uma inflação de 4,5% para 2022, que está mais para perto do teto da meta (5%), do que do centro (3,5%).

A meta de 2022 virou miragem?

O Banco Central não admite, mas cada vez está mais difícil cumprir a meta. O BC vai focar com muito mais clareza sobre a inflação de 2023 quando começar 2022. Ele vai deixar mais evidente que a principal de preocupação será o centro da meta de 2023.

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Com o resultado de hoje, o seu cenário para a taxa básica de juros, a Selic, muda?

Não. A Selic hoje está em 6,25%. Neste mês deve ir para 7,25% e em dezembro sobe para 8,25%. Espero uma alta de meio ponto para fevereiro de 2022, quando deve atingir 8,75% ao ano.

Quando o brasileiro vai sentir algum alívio na inflação

Mesmo com a inflação esperada para outubro menor do que a de setembro, a sensação térmica é muito ruim. O IPCA está em 10,25% em 12 meses e deve fechar o ano em 8,7%. Só vamos perceber um alívio mais claro nos preços ao longo do primeiro semestre de 2022.

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