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Socialismo petista e outros atrasos

Por Mailson da Nóbrega
Atualização:

Na abertura do excelente artigo "Justiça e novas tecnologias" (Estado, 24/8/2007), o governador José Serra citou Mário de Andrade, para quem "ninguém pode se libertar duma só vez das teorias-avós que bebeu". Serra criticou, com sólidos argumentos, a decisão do STF que anulou um interrogatório por videoconferência. "Não é apenas na literatura que a tradição e o preconceito embaraçam a descoberta do que é novo, moderno e pode ser muito útil", assinalou, coberto de razão. Sua conclusão se aplica não apenas aos juízes, mas a todos que não percebem nem entendem as novas realidades. É o caso do 3º Congresso do PT, que termina hoje e começou com a "defesa dos projetos globais sobre o socialismo". Ora, a realidade é o capitalismo. Como mostrei em meu livro O futuro chegou - instituições e desenvolvimento no Brasil, o capitalismo é mais antigo do que Matusalém. Cristo expulsou os vendilhões do templo que faziam o comércio na casa de Deus, mas o que eles praticavam era uma forma primitiva de capitalismo. Hoje vigora o "sistema capitalista" - expressão equivalente a "economia de mercado" - no qual a atividade econômica se move pelos sinais dos preços em regime de concorrência, gerando incentivos para a eficiência e a inovação. O capitalismo contemporâneo iniciou com mudanças institucionais do século 17 na Europa, que limitaram o arbítrio dos reis, garantindo o direito de propriedade e o respeito aos contratos. Em meados do século 19, a utopia socialista prometia substituir o capitalismo. Um poder central coordenaria os interesses de todos. Seriam abolidos a propriedade privada, a moeda e o mercado, tidos como obstáculos à organização racional da sociedade. O comunismo seria etapa intermediária dessa revolução social, como dito por Marx e Engels no manifesto de 1848. O socialismo real soviético fracassou por não ser capaz de criar os incentivos que impulsionam o investimento privado e geram bem-estar, terreno no qual o capitalismo é imbatível. A literatura econômica provou a superioridade do capitalismo sobre o planejamento central socialista, indicando que as imperfeições do mercado devem ser enfrentadas pela regulação econômica conduzida por agências autônomas. No pós-guerra, os socialistas da Europa Ocidental entenderam que a maioria rejeitava suas idéias. A intervenção estatal keynesiana foi a maneira de admitirem a atividade privada sem aderir inteiramente ao capitalismo. Nos anos 80, visões dos socialistas e conservadores convergiram nas questões econômicas. O capitalismo triunfou, mas os ideais socialistas da redução das desigualdades permaneceram. Por conveniência, socialismo e trabalhismo continuam na denominação de partidos de esquerda europeus. O velho socialismo sobrevive nos regimes autoritários de Cuba e Coréia do Norte e inspira o insondável "socialismo do século 21" do caudilho Chávez. Ainda encanta parte do PT e líderes de Bolívia, Equador e Nicarágua. No Brasil, a Constituição e o governo Lula adotam os princípios do capitalismo, mas muitos que se dizem de esquerda não conseguem superar o paradigma marxista, que os impede de entender as idéias básicas de uma economia de mercado fundada em instituições fortes e políticas sociais em favor dos pobres. Estão nesse clube muitos dos "desenvolvimentistas" que acham que o Estado é raquítico e querem sua liderança para prover infra-estrutura, controlar capitais e câmbio, direcionar o investimento estrangeiro, fornecer crédito de longo prazo, garantir juros camaradas e por aí afora. Embora o governo do PT pratique o sistema capitalista, a idéia não penetrou o partido. O 3º congresso mostrou que lhe falta o amadurecimento dos socialistas europeus. Uma prova é o vídeo disponível no endereço http://www.youtube.com/watch?v=VNPjm0qfByc, que explica o "socialismo petista" e fala em extinguir o capitalismo e em transformar trabalhadores em "classe dominante no poder do Estado". O vídeo defende a mudança política radical, argumentando que nenhuma classe venceu "sem colocar o poder político do Estado a seu serviço". Nada mais bolorento e alienado.

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