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Desemprego recua para 13,2% em agosto, mas País ainda tem 13,7 milhões à espera de vagas

Abertura de postos de trabalho foi puxada pela informalidade, aponta o IBGE; renda média caiu, sob impacto da inflação em alta

Por Vinicius Neder
Atualização:

RIO - Apesar do cenário de crise, agravado nos últimos meses - com aceleração da inflação, alta de juros e perspectivas de crescimento econômico em ritmo mais brando -, o mercado de trabalho seguiu em toada de recuperação até agosto. No trimestre móvel até aquele mês, uma expressiva geração de vagas, entre formais e informais, ajudou a reduzir a taxa de desemprego para 13,2%, ante 14,6% no trimestre móvel imediatamente anterior, informou nesta quarta-feira, 27, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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Além de ser insuficiente pra recuperar todos os postos de trabalho perdidos com a pandemia de covid-19, a geração de ocupações, que chegou a 3,480 milhões de vagas em um trimestre, foi marcada pela má qualidade, puxada por vagas consideradas informais e com remuneração menor. Por causa da informalidade e da inflação acelerada, o rendimento médio real do trabalho tombou 10,2% na comparação com um ano antes, maior queda já registrada na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), com dados desde 2012.

Segundo Adriana Beringuy, coordenadora de Trabalho e Rendimento do IBGE, o aumento “bastante significativo” da ocupação marcou a acentuação de um movimento que já vinha sendo observado nos trimestres móveis anteriores - a retomada gradual da normalidade nas atividades econômicas, em meio ao avanço da vacinação contra covid-19.

“O mercado de trabalho reage com certo atraso à tendência marginal da economia, então ainda vemos espaço grande para recuperação”, disse o economista Gabriel Santos, do banco holandês Rabobank. “O avanço na vacinação contra a covid-19 permite a reabertura econômica e aumenta a mobilidade”, completou o economista Rodolfo Margato, da XP Investimentos.

De acordo com Adriana, do IBGE, a geração de vagas sustentou a queda no desemprego. O País tinha 13,656 milhões de desempregados no trimestre encerrado em agosto. O número é elevado, mas representa 1,139 milhão de pessoas a menos na comparação com o trimestre móvel imediatamente anterior.

“A ocupação, tanto na comparação com o trimestre (móvel anterior) quanto no ano, foi o que permitiu a queda da taxa de desocupação. Houve uma expansão na ocupação que conseguiu fazer com que a taxa de desocupação cedesse”, afirmou a pesquisadora do IBGE.

O problema é que “indicadores associados” à ocupação, como a informalidade, ainda apresentam um quadro “desfavorável”, disse Adriana. “Há um predomínio ou uma importância muito acentuada do trabalho informal nesse processo de recuperação”, afirmou a pesquisadora.

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Conforme os dados da Pnad Contínua, das 3,480 milhões de vagas criadas em um trimestre, 2,387 milhões (cerca de 70% do total) foram em ocupações informais. Na comparação com um ano antes, as ocupações informais responderam por 71% do crescimento - 6,056 milhões do total de 8,522 milhões de postos gerados.

Margato, da XP Investimentos, chamou a atenção para o fato de que a reabertura das atividades econômicas, com a vacinação contra covid-19, “se traduz em recuperação mais forte de serviços”, setor mais atingido pelas restrições ao contato social em meio à pandemia. Ocorre que a abertura de vagas no setor de serviços “impacta o mercado de trabalho de forma mais intensa nas categorias informais”, disse.

Carteira de Trabalho Foto: Carl de Souza/AFP

O País alcançou taxa de informalidade de 41,1%, com 37,099 milhões de trabalhadores atuando informalmente - o contingente ainda está abaixo dos níveis pré-pandemia; o auge foi registrado em fins de 2019, com cerca de 38,8 milhões de informais. No grupo de ocupações tipicamente associadas à informalidade, 10,791 milhões de trabalhadores atuavam no setor privado sem carteira assinada, enquanto o trabalho por conta própria ganhou 1,036 milhão de pessoas em um trimestre. São 25,409 milhões de pessoas trabalhando por conta própria no trimestre até agosto, recorde da série histórica da Pnad Contínua.

Também houve avanço na ocupação formal no setor privado. Foram 1,241 milhão de vagas a mais no setor privado com carteira em um trimestre. Na comparação com um ano antes, são 1,972 milhão de trabalhadores com carteira assinada a mais, totalizando 31,039 milhões.

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“Há uma recuperação do emprego, mas uma recuperação sem renda”, disse o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. “O rendimento vai começar a ter quedas mais significativas devido à inflação. A renda nominal não está se recuperando e a real está em queda forte. Provavelmente, vai continuar assim ao longo deste e do próximo ano”, completou.

Segundo Adriana Beringuy, do IBGE, tanto a inflação quanto a informalidade explicam o tombo no rendimento médio real. Por um lado, as vagas informais, geralmente, pagam menos do que o emprego formal, com carteira de trabalho, provocando queda ou moderação na alta nominal das remunerações. Ao mesmo tempo, por causa da inflação, mesmo que a remuneração nominal do trabalhador fique estacionada, o valor real, descontada a variação de preços, passa ao terreno negativo, especialmente na comparação com um ano antes.

Para Vale, da MB Associados, nos próximos meses, o quadro negativo poderá não ficar restrito a esses indicadores associados à ocupação. Isso porque, de agosto em diante, houve “certa desaceleração” no ritmo da economia, “devido ao impacto de inflação e juros”. Com a perspectiva de piora no desequilíbrio das contas do governo, com estouro do teto de gastos (regra que limita o crescimento das despesas públicas à inflação) em 2022, a MB Associado vê a economia brasileira indo ladeira abaixo.

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“[O desemprego] melhorou com mais intensidade nos últimos meses, mas pode ser que desacelere até o final do ano por causa da situação de crise que começamos a viver com mais intensidade a partir de setembro. Temos essa perspectiva de inflação e juros mais elevados do que se imaginava, o que pode impactar o mercado de trabalho no quarto trimestre”, afirmou Vale. / COLABORARAM MARIANNA GUALTER E GUILHERME BIANCHINI

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