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Técnicos alertam Congresso e dizem que teto está sendo 'minado' por manobra do governo

Avaliação vem após governo mudar o teto para abrir um espaço de R$ 83,6 bi a gastos adicionais; especialistas, porém, defendem uma revisão das despesas da União e a manutenção da regra fiscal

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Por Daniel Weterman
Atualização:

BRASÍLIA - Técnicos de diferentes órgãos de controle fizeram um alerta ao Congresso Nacional nesta quinta-feira, 21, sobre a manobra do governo do presidente Jair Bolsonaro para driblar o teto de gastos e pagar um benefício de R$ 400 do Auxílio Brasil, programa desenhado para substituir o Bolsa Família, em 2022, ano eleitoral.

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O secretário de Macroavaliação Governamental do Tribunal de Contas da União (TCU), Alessandro Caldeira, disse que o teto de gastos está sendo "minado" mesmo que haja mudanças legais a partir de 2022 para cumprir a limitação fiscal. "Aquela finalidade do teto de gastos está sendo minada por esses movimentos, ainda que legítimos", disse o representante do TCU ao ser perguntado sobre a mudança sugerido pelo governo.

A avaliação ocorreu durante reunião do Comitê de Avaliação, Fiscalização e Controle de Execução Orçamentária (CFIS) da Comissão Mista de Orçamento (CMO) entre técnicos do Executivo, órgãos de controle e parlamentares. O senador Carlos Favaro (PSD-MT) perguntou aos especialistas sobre a estratégia do governo para mexer no teto e tirar do papel o programa social.

Técnicos sugeriram para o Congresso uma revisão nos gastos da União e o redirecionamento das despesas para dentro da regra fiscal. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Conforme o Estadão/Broadcast revelou, o governo acertou uma mudança no teto de gastos para abrir um espaço de R$ 83,6 bilhões a despesas adicionais em 2022, mudando a fórmula de correção do teto de gastos. O acerto ocorre após a tentativa de tirar parte do Auxílio Brasil do teto.

"Do ponto de vista legal, tudo bem. Do ponto de vista fiscal é que é muito ruim, tanto é que o mercado reage a isso", disse Caldeira, ao alertar para o impacto da mudança no resultado primário e o risco para o endividamento público. "No papel é uma coisa, outra coisa é no caixa."

Na mesma reunião, o secretário federal de controle interno da Controladoria-Geral da União (CGU), Antônio Carlos Leonel, sugeriu uma revisão nos gastos da União que poderia ser feita pelo Congresso para redirecionar despesas dentro da regra fiscal.

Um ponto que chamou a atenção foi o volume de recursos das emendas de relator-geral de 2020, que estão no centro do orçamento secreto, parados sem execução, um total de R$ 10,7 bilhões. Outro caso citado por ele foram os pagamentos irregularidades do auxílio-defeso, destinado a pescadores, que podem provocar um rombo no INSS.

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"Nós, dos órgãos de controle, somos fã da ideia do teto, porque força a pensar numa ideia de gasto melhor, porém, nós estamos passando por uma crise social muito forte. Até que ponto essa população pode aguentar os ajustes sem uma ajuda do Estado? Essa é uma grande pergunta e tem que ser respondida pelos senhores, pelo Congresso. Não tem certo ou errado. É uma definição de prioridade", disse Leonel.

O representante da CGU sugeriu aos parlamentares que, se houver mudança no teto, haja um esforço para rever as renúncias fiscais da União como forma de dar um "recado mais duro" sob o ponto de vista de responsabilidade fiscal. O governo enviou um plano de redução dos benefícios tributários, mas ainda não houve decisão do Legislativo.

'Ficção orçamentária'

O presidente do comitê da CMO, deputado Danilo Forte (PSDB-CE), criticou a manobra do governo. Para o parlamentar, o Congresso não dará aval ao que chamou de "ficção orçamentária" para fazer política eleitoreira. "O governo quer muito. Não podemos fazer uma política eleitoreira em cima de um espaço fiscal", disse Danilo Forte ao Estadão/Broadcast. "Busca-se espaços fictícios quando poderíamos buscar espaços fiscais dentro da racionalidade".

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O comitê da CMO é responsável por fiscalizar a execução do Orçamento do governo, mas, na prática, nunca funcionou. Agora, o deputado promete elaborar um relatório até o fim do ano para expor as principais distorções das contas públicas do governo Bolsonaro e sugerir mudanças. Uma delas, afirmou, será apresentar alternativas no Orçamento para um programa fiscal estruturado.

Redirecionar recursos das emendas de relator-geral, o centro do orçamento secreto, que ainda não foram gastos, é uma das alternativas. "Como é que podemos ver pessoas catando lixo para comer e os deputados se contemplando com orçamento fantasma?"

Para o deputado, o governo não tem apoio para aprovar uma mudança na Constituição, que exige o voto favorável de 308 deputados e 49 senadores, e mudar a regra do teto de gastos no momento, mesmo com o apelo do programa social.

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Há resistência de alas do Legislativo em dar um "passe" eleitoral para Bolsonaro. "Não é que o Congresso não queira, é que não tem condição hoje de fazer esse debate. Toda vez que você cria uma coisa artificial, uma ficção orçamentária, a responsa é a inflação e a recessão."