PUBLICIDADE

Publicidade

Bastidores: Temor de punição leva equipe econômica a desistir de remanejar verba do Bolsa Família

TCU abriu investigação para apurar a transferência de R$ 83,9 milhões do programa social para a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência (Secom)

Por Idiana Tomazelli
Atualização:

BRASÍLIA - O temor de uma responsabilização pelo Tribunal de Contas da União (TCU) levou a equipe econômica a recuar da decisão de transferir recursos do Bolsa Família para a verba publicitária do governo federal e revogar a portaria que havia permitido o repasse.

PUBLICIDADE

A portaria que fez o remanejamento e o ato que a revogou foram assinados pelo secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues.

Como antecipou o Estadão/Broadcast, a corte de contas abriu investigação para apurar a transferência de R$ 83,9 milhões do programa social para a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência (Secom), depois que o auxílio emergencial absorveu temporariamente 95% das famílias do Bolsa e deixou dinheiro livre no Orçamento.

Fachada do Tribunal de Contas da União em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão

A suspeita, levantada por especialistas e pelo Ministério Público junto ao TCU, é de que o remanejamento tenha significado um “drible” nas regras fiscais que permitem a elevação de gastos para combater a pandemia da covid-19. Elevou-se a despesa emergencial e destinou-se o espaço que “sobrou” no Orçamento original para aumentar gastos sem relação com a crise.

O presidente Jair Bolsonaro já criticou diversas vezes o governo da ex-presidente Dilma Rousseff pelas “pedaladas fiscais”, prática de atrasar pagamentos sociais que foi um dos motivos para o impeachment da petista. Em julho passado, quando foi alvo de críticas por bloquear recursos no Orçamento para cumprir o que manda a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), Bolsonaro deixou claro que preferia o contingenciamento ao impeachment.

“Se tem lei, tenho que seguir a lei, não sou ditador nem o 'Dilmo' de calça comprida”, afirmou à época. O ministro da Economia, Paulo Guedes, também já criticou a “contabilidade criativa” do governo petista.

É por isso que, ao primeiro sinal de que o TCU questionaria a regularidade da portaria, a equipe econômica resolveu dar um passo atrás.

Publicidade

Com a decisão, a investigação na corte de contas pode ser arquivada por perda de objeto, uma vez que a portaria que deflagrou a auditoria deixou de existir. Mas essa é uma medida que ainda não foi tomada, uma vez que outros elementos estão sendo levantados pelos auditores.

O mais chamativo deles é o fato de o próprio governo ter aberto em 25 de março um crédito extraordinário destinando R$ 3,037 bilhões para reforçar o Orçamento do Bolsa Família. À época, a decisão foi justificada como necessária para zerar a fila de espera pelo programa.

O governo não só não zerou a fila (433 mil famílias são elegíveis ao programa e não tiveram ainda a concessão do benefício), mas também passou a retirar recursos do Bolsa para destinar a outras despesas do dia a dia, sem relação com o combate à crise.

Os auditores também se preocupam com as projeções que estão sendo feitas para justificar a “dispensa” desses recursos neste momento, uma vez que as projeções de organismos internacionais apontam para aumento do desemprego e da pobreza. Em tese, o programa Bolsa Família tende a ser mais demandado, não menos, dizem os técnicos.

PUBLICIDADE

Na área econômica, porém, há uma inquietação em relação aos efeitos da decisão de revogar a portaria. Técnicos manifestam temor de que o escrutínio do TCU gere uma incerteza em relação aos créditos extraordinários abertos no futuro.

Segundo uma fonte da área econômica, é possível que, ao destinar recursos extras para uma ação emergencial, haja economia de recursos em outra ponta dentro do Orçamento. A dúvida é se o governo poderá agora remanejar isso para outras ações ordinárias, ou apenas para despesas relacionadas ao acontecimento extraordinário.

Na avaliação dessa fonte, o alerta do TCU ajuda na questão da transparência, mas pode virar mais um fantasma para os gestores que colocam seus CPFs nas autorizações de gastos do governo federal.

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.