BRASÍLIA - A intenção do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de estabelecer um valor fixo para o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) dos combustíveis, por litro consumido, por meio de um projeto de lei complementar, enfrenta resistências entre os líderes partidários.
O governo tentou costurar um acordo para acrescentar um parágrafo sobre fixação do ICMS em um projeto para estabelecer o peso de cada tributo na nota fiscal da gasolina, óleo diesel e etanol, para que os consumidores saibam o que estão pagando. A ideia, no entanto, foi rejeitada por líderes que a consideraram inconstitucional.
A base seria o projeto do deputado EmanuelPinheiro Neto que já está na pauta de votação da Câmara, juntada a outra proposta do líder do MDB, Isnaldo Bulhões (AL).
“Não é questão de eu acatar um parágrafo sobre isso. É constitucional. Não cabe à Câmara, em lei complementar, mudar a forma de cobrança dos impostos pelos Estados”, disse o líder do MDB Isnaldo Bulhões (AL), autor do projeto. “Não é só de posicionamento político, é técnico, isso só poderia ser feito por PEC (Proposta de Emenda à Constituição)”, afirmou.
Para Bulhões, fixar o ICMS dos combustíveis poderá dar insegurança jurídica ao setor, já que a cobrança do imposto está prevista na Constituição. “Isso deveria ser alterado por uma Proposta de Emenda à Constituição e não por projeto de lei. O que eu deixei claro é que não adianta buscar vilão nessa discussão, é muito mais uma questão de política econômica do que de legislação”.
A ideia de mexer nas regras do ICMS enfrenta também a pressão de governadores que temem uma possível queda de arrecadação com as mudanças propostas. O ICMS é o principal imposto arrecadado pelos Estados. É cobrado sobre um valor médio reajustado a cada 15 dias. E cada unidade da Federação define sua alíquota.
Após fazer críticas, Lira adota tom conciliador
Após reuniões com líderes dos partidos, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), recuou das críticas feitas aos governadores e informou que vai convidar os Estados e a Petrobras a dialogar e buscar um acordo para conter a disparada dos preços dos combustíveis.
“A partir do momento em que chegarmos a um texto, lógico que vamos ouvir os governadores, os secretários de Fazenda. Não há nenhum movimento contra os governadores ou a favor da Petrobras. É um movimento para resolver um problema sério no Brasil, para encontrarmos a melhor alternativa que atenda a todos”, disse Lira.“Precisamos discutir isso sem nenhum tipo de prejuízo dos Estados”, afirmou o presidente da Câmara.
Um dia antes, durante evento ao lado do presidente Jair Bolsonaro, Lira culpou os impostos estaduais pela alta dos combustíveis e cobrou uma cota de sacrifício dos governadores para resolver o problema.
Depois da irritação generalizada com o reajuste de 8,9% do preço do diesel pela Petrobrás, Lira convocou uma reunião de emergência com líderes da base da Câmara e esperava apresentar hoje mesmo a proposta do projeto de lei complementar para definir um valor fixo sobre o litro consumido para a cobrança do ICMS.
Alternativas em discussão
Lira reconheceu que ainda não há uma definição de mérito sobre o que poderá ser feito, mas avisou que tem pressa para encontrar um caminho para ser votado pela Casa.
Segundo o presidente da Câmara, há três alternativas na mesa de negociação. Além de fixar um valor fixo para o ICMS, outra proposta prevê criação de um fundo de estabilização para amortecer variações abruptas do preço dos combustíveis, que é impactado não só pelo preço internacional de petróleo como pela alta do dólar.
A ideia é que esse fundo seja formado pelos dividendos pagos pela Petrobrás à União ou com gás retirado do pré-sal. No caso da disparada dos preços no mercado internacional, esse fundo bancaria a diferença para que a Petrobrás mantenha o preço sem reajuste.
Essa ideia é antiga, mas proposta nunca saiu do papel porque sempre esbarrou nas restrições fiscais das contas públicas. Para Lira, essa proposta não agride a política de preços da Petrobrás.
Sem atacar os governadores, Lira fez questão de ressaltar que alguns Estados podem seguir o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), que reduziu o ICMS dos combustíveis. A medida, segundo ele, ajudaria na contenção dos preços.
“Estamos dispostos a dialogar com o Congresso para construir alternativas. Mas nunca houve um chamamento aos governadores para construir as soluções”, disse Leite ao Estadão. Ele mesmo sofreu críticas dos colegas por ter reduzido a alíquota do ICMS.
Em reunião nesta quarta-feira, o Comitê Nacional de Secretários de Fazenda Estaduais, Comsefaz, discutiu o problema. “A medida de mexer em tributo, qualquer seja ele, é paliativa, porque a variação dele acontece com a própria oscilação do preço do combustível”, disse André Horta, diretor institucional do Comsefaz.
Segundo ele, a maioria dos Estados têm reafirmado que, se não houver mudança na política de preços da Petrobrás,haverá uma prorrogação de uma crise para a economia brasileira.
A advogada tributarista, Carolina Gontijo, conhecida como Duquesa de Tax, considera o projeto que está na pauta de votação muito difícil de ser implementado, sobretudo, na parte que define que o preço não pode ser superior ao apurado pelo governo federal. “Vai virar uma loucura para apurar”, disse.
Para ela, tecnicamente é possível definir um valor fixo como faz o governo federal, mas os Estados não vão querer abrir mão dessa receita. “Os Estados vão questionar, é um tributo deles”, disse.
Hoje, o ICMS se baseia no Preço Médio Ponderado ao Consumidor Final (PMPF), que é uma média de preços praticados na bomba ao consumidor final. Quando o preço do combustível fica mais caro, o ICMS recolhido acaba sendo maior. O preço pode subir, sem que a alíquota tenha sido alterada pelos governadores.