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The Economist: Por que a inflação deve continuar acima do padrão pré-pandemia

Mesmo com menos transtornos na cadeia de suprimentos, o crescimento salarial e as expectativas sobre a alta dos preços estão aumentando

Por The Economist
Atualização:

As más notícias a respeito da inflação continuam chegando. Nos países ricos, ela está acima de 9% ao ano e não ficava tão alta desde a década de 1980 – e nunca houve tantas “surpresas com a inflação”, com os dados se mostrando superiores ao que foi previsto pelos economistas. Isso, por sua vez, está afetando fortemente a economia e os mercados financeiros. Os bancos centrais estão aumentando as taxas de juros e encerrando programas de compra de títulos, devastando as ações. Em muitos países, a confiança do consumidor está atualmente ainda menor do que nos primeiros dias da pandemia de covid-19. Indicadores de diversos setores, desde a habitação até a produção industrial, sugerem que o crescimento econômico está desacelerando de forma acentuada. O que acontecerá com os preços ao consumidor nos próximos meses e anos é, portanto, uma das questões mais importantes para a economia global. Muitos analistas esperam que a inflação anual em breve diminua, em parte porque os preços das commodities devem cair na comparação ano a ano, após aumentos significativos em 2021. Em suas projeções econômicas mais recentes, o Federal Reserve, por exemplo, espera que a inflação anual nos Estados Unidos (medida pelo índice de despesas de consumo pessoal) caia de 5,2%, no final deste ano, para 2,6% até o final de 2023. É perdoável não levar essas previsões tão a sério. Afinal, a maioria dos economistas não foi capaz de ver a onda inflacionária chegando, e, depois, previu erroneamente que ela desapareceria depressa. Em um artigo publicado em maio, Jeremy Rudd, do Fed, fez uma observação provocadora: “nossa compreensão de como a economia funciona – assim como nossa capacidade de prever os efeitos de crises e ações políticas – não é, na minha opinião, melhor hoje do que era na década de 1960”. A futura trajetória da inflação está, em grande parte, cercada por incertezas. 

Alimentos mais caros; economistas acreditam que a inflação irá desacelerar até 2023, mas a maioria deles não foi capaz de prever a onda inflacionária global Foto: Taba Benedicto/ Estadão

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Três pontos-chave

De fato, alguns indicadores apontam para uma pressão maior sobre os preços em um futuro próximo. A consultoria Alternative Macro Signals trabalha com milhões de artigos de notícias em vários idiomas por meio de um modelo para criar um “índice de pressão de inflação de notícias”. Os resultados, que são mais oportunos que os números oficiais da inflação, medem não apenas a frequência com que as pressões sobre os preços são mencionadas, mas também se o fluxo de notícias sugere que elas estão se acumulando. Tanto nos EUA como na zona do euro, o índice ainda está bem acima de 50, indicando que as pressões continuam a subir.

As preocupações com a inflação podem apontar para três outros indicadores que sugerem ser improvável que o mundo rico retorne tão cedo ao padrão anterior à pandemia de crescimento de preços baixo e estável: o aumento salarial crescente e as expectativas de inflação tanto dos consumidores como das empresas.  Se prolongados, juntos, esses fatores poderiam contribuir para o que o Banco de Compensações Internacionais (BIS, na sigla em inglês), o banco central dos bancos centrais, descreveu em um relatório publicado em 26 de junho como um “ponto crítico”. Além disso, advertiu o BIS, “uma psicologia inflacionária” poderia se espalhar e se tornar “arraigada”.

Aumentos de salários

Há evidências crescentes de que os trabalhadores estão começando a negociar por salários mais altos. Isso poderia criar outra rodada de aumentos de preços conforme as empresas repassam as despesas extras. Uma pesquisa do Banco da Espanha sugere que metade dos acordos de negociação coletiva assinados para 2023 contém “cláusulas de indexação”, o que significa que os salários estão automaticamente vinculados à inflação, uma alta em comparação aos 20% antes da pandemia. 

Na Alemanha, o sindicato IG Metall solicitou um aumento salarial de 7% a 8% para quase 4 milhões de trabalhadores no setor de metais e de engenharia (provavelmente ele conseguirá cerca de metade disso). Na Grã-Bretanha, os trabalhadores ferroviários entraram em greve enquanto demandavam um aumento de 7%, embora não esteja claro se eles vão alcançar o objetivo. Tudo isso tornará o crescimento salarial um tema ainda mais atual. Um índice que monitora o grupo de países do G-10, compilado pelo Goldman Sachs, já está subindo quase verticalmente. Uma medida da pressão salarial da Alternative Macro Signals está se movimentando de modo semelhante.  E os pisos salariais também estão subindo. A Holanda está propondo um aumento para o salário mínimo. No início deste mês, a Alemanha aprovou uma lei aumentando seu mínimo em 20%. A agência de relações industriais da Austrália aumentou o piso salarial em 5,2%; mais que o dobro do aumento do ano passado.

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Expectativas dos consumidores

O crescimento salarial mais rápido, em parte, reflete as expectativas mais altas do público para futuros aumentos de preços – a segunda razão para se preocupar que a inflação possa se mostrar difícil. Nos EUA, as expectativas de curto prazo estão aumentando depressa. Os canadenses dizem estar se preparando para uma inflação de 7% no próximo ano, o maior número de qualquer país rico. 

Até mesmo no Japão, lugar onde os preços raramente sofrem alterações, as crenças estão mudando. Um ano atrás, uma pesquisa do banco central japonês descobriu que apenas 8% das pessoas acreditavam que os preços subiriam “significativamente” ao longo do próximo ano (os preços ao consumidor, de fato, aumentaram apenas 2,5% no ano até abril). Agora, no entanto, 20% das pessoas supõem que isso vai acontecer.

Expectativas das empresas

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O terceiro fator diz respeito às expectativas das empresas. No setor de varejo, elas estão em uma máxima histórica em um terço dos países da União Europeia. Uma pesquisa do Bank of England sugere que os preços das roupas para as coleções de outono e inverno da Grã-Bretanha serão de 7% a 10% maiores que há um ano. 

O Fed de Dallas encontrou evidências preliminares de que os consumidores estão menos dispostos a tolerar aumentos de preços do que antes. Um entrevistado do setor de aluguel e leasing reclamou que “está ficando mais difícil repassar os aumentos de preços de 20% a 30% que recebemos dos fabricantes”. Mas isso apenas aponta para um nível mais baixo de inflação alta. A grande esperança de uma inflação mais baixa está relacionada ao preço dos bens. Aumentos rápidos nos preços de carros, geladeiras e itens semelhantes, ligados em parte aos transtornos nas cadeias de suprimentos, motivaram o aumento inflacionário inicial no ano passado. Agora há alguns indícios de uma mudança.  O custo para enviar algo de Xangai para Los Angeles caiu 25% desde o início de março. Nos últimos meses, diversos varejistas gastaram muito com estoques para manter suas prateleiras cheias. Vários agora estão reduzindo os preços para atualizar o estoque. Nos EUA, a produção de automóveis está finalmente melhorando, o que poderia reverter alguns dos aumentos de preços ultrajantes para veículos usados vistos no ano passado. Em teoria, a queda dos preços dos bens poderia ajudar a apagar as chamas inflacionárias no mundo rico, aliviando a crise de custo de vida, dando aos bancos centrais espaço para respirar e não deixando os mercados financeiros afundarem. Mas, com indicadores suficientes de preços futuros apontando para a direção contrária, as chances de isso acontecer aumentaram. Não se surpreenda se a inflação continuar feroz durante um tempo ainda. / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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