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Três razões para alarmar-se com o Alibaba

Adquirir uma ação do gigante chinês do comércio eletrônico é apostar em um sistema político opaco que detém o monopólio da escolha do que pode ou não prosperar

Por William Pesek
Atualização:
A gigante do e-commerce vai lançar seus papéis sob a sigla "BABA" na New York Stock Exchange (NYSE) Foto: CHANCE CHAN/REUTERS

Jack Ma não exagera quando promove seu negócio de comércio eletrônico, oAlibaba, como uma "empresa que vende tudo". A gigante tecnológica em expansão, cujo capital será aberto esta semana com a maior oferta pública inicial (IPO na sigla em inglês) da história, possui tantos tentáculos em várias indústrias que pode facilmente estrangular concorrentes de pequeno e médio porte. Os reguladores antitruste chineses, que recentemente enquadraram empresas estrangeiras como Microsoft e Toyota, já devem estar de olho também no colosso local.

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O Partido Comunista (PC) chinês, contudo, adora uma história de sucesso, e a de Ma já fez com que investidores globais esquecessem Mark Zuckerberg (fundador do Facebook) e se voltassem para o "Steve Jobs chinês".

Essa mudança de foco ilustra justamente o problema da magnitude da Alibaba. Ma pôde construir seu quase-monopólio online apenas porque o regime permitiu. O empresário elenca as prioridades do Alibaba como "clientes em primeiro lugar, funcionários em segundo, e investidores em terceiro", mas é inevitável pensar que faltou uma categoria: a de seus benfeitores do PC, que deveriam estar em primeiro lugar.

Eis minha pergunta para todos os fundos e instituições que planejam investir dinheiro em troca de ações do Alibaba: como podem confiar nas promessas de Ma quando o espírito de Mao obviamente domina o ambiente?

Futuros investidores aceitariam não apenas a estrutura pouco usual do Alibaba (unificada na figura de Ma), mas também os limites impostos pela China para proprietários estrangeiros - sem mencionar outros aspectos questionáveis do país como a opacidade, a censura e o desrespeito às normas de propriedade intelectual. Render-se aos caprichos de um governo que poderia cair sobre Ma a qualquer momento, por qualquer deslize, é um dos fatores pelos quais não colocaria dinheiro na gigante chinesa.

Outra grande preocupação é a instabilidade da economia chinesa. Para mim, a China é como uma bolha, assim como eram as empresas .com no fim dos anos 1990. Naquele momento, as ações de qualquer empresa de internet com capital aberto decolavam no mercado, independentemente da compreensão dos investidores em relação ao modelo de negócio que estavam comprando. A China.com é uma entidade que não passa desapercebida. O Alibaba é o maior exemplo, com seu apelo megalomaníaco: a empresa oferece aos investidores o mercado consumidor da classe média chinesa a apenas um clique. Com uma ação, é possível viajar pela venda no varejo, mídias sociais, bancos, entretenimento, viagem - escolha o ramo que preferir.

O IPO do Alibaba pode representar, contudo, o pico de crescimento na história da China. A promessa do presidente Xi Jinping de deslocar a economia chinesa do investimento excessivo e exportações para o setor de serviços requer crescimento mais lento nos próximos anos. No momento, Xi está lutando para atingir a meta de 7,5% de crescimento para este ano. Esta semana, o banco central chinês apressou-se em injetar mais US$ 81 bilhões nos maiores bancos do país para que continuem oferecendo crédito.

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Hoje, a China vive a maior queda na produção industrial desde a crise de 2008, assim como nas vendas no varejo e em operações financeiras de investimento. Em agosto, a mais ampla medida de crédito caiu 40%. Se o Produto Interno Bruto (PIB) cai, também diminui o poder de compra da classe média - e por consequência, também as vendas de produtos em comércios eletrônicos como o Alibaba. E se a China sofrer uma crise da dívida pública, como temem alguns analistas, as perspectivas de lucro se tornarão ainda mais incertas.

A terceira razão pela qual não investiria na empresa chinesa, como escrevi no mês passado, é a crescente desigualdade no país, que ameaça as ambições da classe média. O coeficiente Gini praticamente dobrou entre 1980 e 2000. Este ano, a desigualdade de renda na China superou a dos Estados Unidos, e chegou a níveis "severos" de acordo com a Universidade de Michigan. O governo e líderes oficiais temem que o cenário possa desencadear também uma instabilidade social.

Por fim, a promessa do Alibaba se apoia na ideia de que milhões de chineses continuarão a enriquecer e consumir como os americanos. Mas esse cenário depende de muitos fatores, como o controle da corrupção - que concentra riqueza nas mãos da elite chinesa - e o papel das gigantescas estatais, que precisam de inovação. Tudo isso requer um forte desenvolvimento do setor de serviços, que deverá também proporcionar bons postos de trabalho.

Quando se fala em histórias de sucesso, a de Ma se sobressai. O interesse dos investidores na figura do professor de inglês que se tornou o homem mais rico da China não para de crescer. Mas adquirir uma ação do Alibaba é depositar confiança em muito mais do que um homem de negócios de 49 anos. É apostar em um sistema político opaco que detém o monopólio da escolha do que pode ou não prosperar. Tradução de Livia Almendary

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