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Triângulo fatídico

Por Rogério L. F. Werneck
Atualização:

Logo após a eleição presidencial, o desalento com as perspectivas do novo governo se tornou ainda maior do que durante a campanha eleitoral, em face da insistência do Planalto em não reconhecer a necessidade de alterar a política econômica. Particularmente preocupantes, naquele momento, foram as manifestações sobre a condução da política econômica feitas por Aloizio Mercadante, ministro-chefe da Casa Civil, com anuência tácita da presidente. Vale a pena ver de novo, na GloboNews, a espantosa entrevista concedida por Mercadante a Míriam Leitão, no Palácio do Planalto, em 13/11/2014, que deu ensejo ao artigo que publiquei neste mesmo espaço em 21/11/2014. Pouco antes, em reunião com a bancada petista na Câmara, o ministro-chefe da Casa Civil já não deixara dúvida sobre o que apregoava para o novo mandato: "A política econômica do segundo governo não pode ser a que foi derrotada. A nossa prioridade é emprego e renda. A nossa agenda não é a do mercado" (O Globo, 14/11). Uma semana depois, em 21/11, noticiou-se que a presidente Dilma, pressionada por Lula a mudar a política econômica, decidira convidar Joaquim Levy para o cargo de ministro da Fazenda. A notícia foi saudada como sinal de que o governo finalmente se dera conta da necessidade de abandonar o curso desastroso que seguira no primeiro mandato. Com o comando da política econômica entregue a Joaquim Levy, tudo parecia indicar que, afinal, as despropositadas ideias vocalizadas por Mercadante não prevaleceriam. Por 8 meses, o País agarrou-se a essa fantasia. As ilusões começaram a se esvair em 21/7, quando o governo anunciou que abandonara por completo a meta de superávit primário de 1,17% do PIB para 2015. E que, com sorte, talvez pudesse cumprir meta "mais realista", 8 vezes menor, de 0,15% do PIB. Aos mais atentos, não terá escapado esclarecimento importante feito pelo ministro Nelson Barbosa, dias depois, em entrevista sobre a redução da meta fiscal, no Estadão de 24/7: "Toda a equipe econômica, que aliás não se resume aos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, e inclui nesse caso a Casa Civil, está trabalhando conjuntamente para ter reequilíbrio fiscal mais rápido possível". Era o anúncio oficial de que Mercadante passara a integrar a equipe econômica do governo. Nelson Barbosa não perdeu a oportunidade de insistir no mesmo ponto, na sua entrevista a Míriam Leitão, na GloboNews, na semana passada. Para tentar relativizar seus desentendimentos com o ministro Joaquim Levy, voltou a apelar para a geometria variável da equipe econômica. Por mais de uma vez, enfatizou que a proposta orçamentária deficitária encaminhada ao Congresso era "de toda a equipe econômica", desdobrada nas equipes do Planejamento, da Fazenda "e também da Casa Civil". Nas últimas semanas ficou claro que essa reconfiguração deixou o ministro da Fazenda em posição muito desfavorável. A expectativa de que a disputa de poder dentro da equipe econômica estaria pautada pelo velho embate bilateral Fazenda-Planejamento se revelou infundada. Levy constata agora que passou a ocupar um dos vértices de um triângulo, em que os outros dois estão ocupados por ministros que dele divergem e que contam com respaldo inequívoco da presidente. Mercadante assumiu, afinal, o papel que, em novembro, se temia que pudesse vir a assumir. E, mesmo hostilizado por Lula e por grande parte do PT, antagonizado pelo PMDB e às voltas com uma possível investigação no STF, parece ter consolidado sua posição no Palácio, como alter ego de Dilma, num momento em que a presidente, isolada e fragilizada, se vê cada vez mais acuada no bunker do Planalto. Para todos os efeitos, é como se o terceiro vértice do triângulo estivesse ocupado pela própria presidente. É a volta à ingerência direta e ostensiva de Dilma na condução da política econômica. A desastrada precipitação da perda do grau de investimento é só o prenúncio do que vem por aí.* Rogério L. F. Werneck é economista e doutor pela Universidade Harvard. É professor titular do Departamento de Economia da PUC-Rio

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