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Turismo e inclusão social

Por Paulo R. Haddad
Atualização:

Na última década, o Brasil realizou um conjunto grandioso de projetos de investimento em turismo, liderado pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur) no Nordeste. A expectativa é de que esses projetos possam contribuir para aliviar a pobreza nas áreas em que se localizam, a par do inquestionável processo de crescimento econômico que nelas desencadeiam. A preocupação com essa questão deriva do fato de que são frequentes as experiências de investimentos em resorts turísticos altamente subsidiados com recursos públicos que se constituem muitas vezes em verdadeiros enclaves econômicos nas localidades onde se situam. Nelas, os investidores se apropriam do capital natural sem impactar significativamente as condições de vida das populações pobres residentes no seu entorno espacial ou sem se preocupar em apoiar programas de desenvolvimento de fornecedores locais. Não há dúvida de que os novos investimentos em atividades turísticas nas áreas periféricas do País contribuíram para resultados muito positivos nas nossas contas externas, no nível geral de emprego, nas taxas de crescimento do PIB, etc. Mas ainda resta dúvida sobre os benefícios que teriam aportado para os habitantes dessas áreas. Será que, na concepção e na implementação desses projetos de investimento, não estaria embutido um conflito entre os critérios de eficiência econômica e de equidade social? A análise das experiências dos ciclos de expansão de diferentes economias nacionais e regionais no pós 2ª Guerra Mundial não revela a existência de nenhuma correlação geral e sistemática entre o processo de crescimento econômico e a distribuição de renda e de riqueza neste processo. Constatou-se que a compatibilidade entre o crescimento econômico e o desenvolvimento social não se processa espontaneamente. O desenvolvimento social não se revelou como um subproduto cronológico do crescimento econômico. De fato, a experiência histórica vem demonstrando que a simples mobilização intensiva dos fatores de produção pode reproduzir, agora sim, de forma espontânea, as condições sociais iniciais que lhe deram sustentação. Em princípio, não se pode afirmar que os critérios de eficiência econômica e de equidade social (ou de distribuição de renda e de riqueza) que orientam a seleção e a prioridade de projetos de investimentos sejam mutuamente exclusivos. Um programa ou projeto de investimento, como o de melhoria da competitividade de um arranjo produtivo local de turismo, pode se enquadrar no critério de eficiência e no critério de distribuição, pois, de um lado, aumenta os fluxos de comercialização, as margens de lucro e, enfim, a competitividade setorial e, ao mesmo tempo, pode beneficiar a formação de mão de obra local em áreas menos desenvolvidas. O que interessa ressaltar é a ênfase ou a intencionalidade dada ao programa ou projeto. É preciso, pois, definir os procedimentos operacionais por meio dos quais é possível combinar a eficiência empresarial ou microeconômica dos investimentos em turismo com a busca do desenvolvimento humano das populações das áreas em que se localizam. Há, neste ponto, duas instituições que têm registrado detalhadamente as experiências internacionais bem-sucedidas nessa direção: o projeto Pro-Poor Tourism (PPT), financiado pelo Department for International Development (Dfid) do Reino Unido, e a Organização Mundial do Turismo (OMT). O próprio Ministério do Turismo considera que as propostas mais adequadas de políticas públicas do setor devem ter, como ponto de partida, o estabelecimento de portas de saída para a pobreza. Não faltam experiências em que mirar nem concepções adequadas de turismo sustentável nas burocracias especializadas ou até mesmo capacidade de planejamento nos quadros técnicos dessas burocracias para desenhar políticas, programas e projetos que articulem os investimentos em capital físico, humano e social em torno das atividades turísticas. Entretanto, como se trata de investimentos que envolvem os três níveis de governo, complexas relações entre os interesses público e privado, além de intensa transversalidade nas burocracias públicas, talvez o nó górdio da sua implementabilidade esteja na fragilidade ou na própria ausência da função de coordenação geral no processo de planejamento do governo federal. *Paulo R. Haddad, professor do IBMEC-MG, foi ministro do Planejamento e da Fazenda no governo Itamar Franco

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