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UE não quer nem esperar a posse de Obama

Europa propõe ?rédea curta? para o sistema financeiro daqui a 100 dias

Por Andrei Netto e PARIS
Atualização:

Os 27 chefes de Estado e de governo da União Européia (UE) chegaram ontem à tarde, em Bruxelas, a um acordo sobre cinco propostas de reforma do sistema financeiro internacional. As proposições, que incluem a criação de colégios globais de supervisão de bancos, companhias seguradoras, agências de notação, hedge funds e paraísos fiscais e a reformulação completa do Fundo Monetário Internacional (FMI), serão levadas à mesa, hoje, em São Paulo, na reunião do G-20 financeiro. Caso haja acordo, elas serão discutidas na Cúpula de Washington, em 15 de novembro. "O novo sistema financeiro internacional deve ser fundado sobre os princípios da transparência e da responsabilidade", diz o documento assinado ontem pelos líderes políticos da UE. Nesse sentido, "a cúpula internacional de 15 de novembro deve ser o evento fundador da reforma do sistema financeiro internacional", com "decisões reais e rápidas". As medidas foram acordadas após três horas e meia de discussões e são, em linhas gerais, as adotadas pela Europa em na última Cúpula da UE, em 15 e 16 de outubro. A proposta de maior impacto prevê a criação de colégios globais de supervisores, que permitirão a troca de informações entre os dirigentes das instituições nacionais, como os bancos centrais. Já a supervisão de agências de notação deve passar a ser feita pela Comissão de Valores Mobiliários de cada país. A idéia da proposta da UE é que nenhuma instituição, mercado ou país escape da regulação e da supervisão internacionais. Para tanto, as autoridades nacionais disporão de novas ferramentas de controle das operações de bancos, hedge funds e companhias de seguros, mesmo em paraísos fiscais. Uma dessas ferramentas seriam os balanços mais transparentes, obtidos com o fim da regra do "valor justo", que permite a atualização do valor da compra de ativos a cada balanço trimestral de uma empresa. O cálculo da valorização dos ativos se baseia no "mark-to-market", uma metodologia contábil utilizada sem padronização entre as companhias que teria facilitado a valorização artificial das papéis das instituições financeiras nos Estados Unidos, descolando o valor dos títulos da atividade econômica real e estimulando a bolha imobiliária. Os líderes políticos europeus também chegaram a um acordo sobre a criação de códigos de conduta das instituições financeiras, que restrinjam, por exemplo, a política de remuneração de executivos. O objetivo é desestimular a tomada de riscos excessivos pelos diretores de grandes instituições financeiras. Por último, a UE propõe a refundação do FMI, que passaria a ter como missão a prevenção de crises e não só o socorro financeiro e a intervenção em países em crise. A instituição, hoje sob o comando de Dominique Strauss-Kahn, receberia mais recursos, em volume não especificado. "Alguns defendem que o FMI seja o Banco Central dos bancos centrais, outros que seja um fundo de intervenção", explicou o presidente da França e presidente em exercício da UE, Nicolas Sarkozy. "Mas todos estamos conscientes de que é preciso repensar os papéis das organizações internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, que se multiplicaram e perderam o foco." A proposta prevê que as medidas sejam implementadas em até 100 dias - a contar da cúpula - e sejam revisadas em uma nova reunião internacional, em fevereiro. Sarkozy e o presidente da Comissão Européia, José Manuel Durão Barroso, saudaram o consenso europeu sobre a regulação global e destacaram as proposições do primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown, e da chanceler da Alemanha, Angela Merkel. "Há uma posição comum, muito detalhada, uma visão da UE para a refundação do sistema financeiro", disse o francês, ressaltando: "Não queremos passar da ausência de regulação à regulação excessiva". Durão Barroso pediu que a Cúpula de Washington seja encerrada com medidas efetivas. "A Europa passará uma resposta clara, forte e comum, com proposições concretas", enfatizou. Já Sarkozy frisou que a crise financeira não pode aguardar pela posse do presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama. "Lamento, mas o mundo é multipolar. No ano que vem, Alemanha e Reino Unido vão às urnas. Sempre vai haver uma eleição no planeta." OS CINCO PONTOS DA EUROPA Colégios globais de supervisores : Submeter as agências de notação a regras de governança e a um registro em um órgão competente, que se encarregará de supervisionar suas atividades. A UE propõe, para tanto, a criação de colégios globais de supervisores, a exemplo do que criou em outubro Normas contábeis e fim do ''valor justo'': Rever a aplicação da regra do ''valor justo'', a fim de melhorar sua coerência com as ''regras prudenciais'', convergindo as normas contábeis Supervisão total: Impedir que qualquer instituição, qualquer mercado ou qualquer país escape da regulação e da supervisão internacionais. Hoje, agências de notações, hedge funds e instituições financeiras que operam em paraísos fiscais, por exemplo, não são fiscalizadas pelas autoridades monetárias nacionais Códigos de conduta: Criar códigos de conduta das instituições financeiras que evitem a tendência de tomada de riscos excessivos por parte de seus gestores. Na prática, haverá restrições sobre os métodos de remuneração de executivos. Os órgãos supervisores deverão avaliar o perfil de risco das instituições financeiras Novo FMI: Confiar ao Fundo Monetário Internacional (FMI) a responsabilidade de, ao lado do Fórum de Estabilidade Financeira, recomendar medidas para restaurar a confiança e a estabilidade. O FMI terá como missão a prevenção de crises, e apenas a ajuda a países em dificuldade. Além disso, suas ferramentas de intervenção e seus recursos ''devem ser aumentados''

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