No início da semana, em uma conferência, a principal executiva do Facebook na Europa, Oriente Médio e África, Nicola Mendelsohn, fez uma afirmação surpreendente: em cinco anos o conteúdo no Facebook será primordialmente vídeo. Cada vez escreve-se menos na rede social, explicou ela. Para a executiva, “a melhor forma de contar histórias é o vídeo, pois traz muita informação de forma rápida”.
Até 2021, ao abrir a maior rede social do planeta, veremos uma torrente de vídeos com quase nenhum texto.
Mas será mesmo?
Podemos encontrar pistas na Coreia do Sul. É o país mais conectado do planeta. Em nenhum outro canto do mundo a internet atinge velocidades tão rápidas por um custo tão baixo. O Wi-Fi público predominante nas ruas de Seul faz com que as melhores conexões 4G pareçam piada. É assim faz anos.
A velocidade faz diferença. Os sul-coreanos vivem com seus smartphones à mão e conversas em vídeo são tão habituais quanto nossa troca de áudios via WhatsApp. Assistem séries e filmes no metrô. Uma das febres do país é o muk-bang: são vídeos de moças que fazem imensas refeições ao vivo. Mesmo.
Milhares de pessoas, assistem pela internet, toda noite, jovens moças fazendo refeições barbaramente calóricas, com muitos barulhos e gemidos de prazer. (Antropólogos explicam que, numa cultura obcecada com magreza, o muk-bang é um tipo de consolo.)
Cada país com seus peculiares hábitos digitais. Internet farta, na Coreia do Sul, resultou em amplo consumo de vídeo. É possível que a aposta do Facebook passe por aí: a melhoria na infraestrutura digital pode nos levar a um cenário assim.
Mas não é só isso. O Facebook, assim como o Google e tantas outras empresas de internet, tem um negócio claro. Constrói audiências, mantém seus usuários lá dentro e expõe publicidade. O programa que decide o que aparecerá na frente de cada um de nós é cuidadosamente regulado para nos manter ligados.
Os incentivos são vários. Quando a estratégia da empresa busca incentivar conversas entre pessoas, a ferramenta de sugestões entra: você faz aniversário de amizade com fulano hoje, diz. Ou: veja as fotos que você acaba de tirar, não quer publicar uma? Nenhuma sugestão é à toa. Todas trabalham para nos manter conectados.
A publicidade em vídeo é a mais rentável e o Facebook está chegando atrasado. Através do YouTube, o Google é rei. Via Periscope, o Twitter oferece uma ferramenta para entrar ao vivo já há alguns anos. Alcançar a concorrência exige esforço e a rede de Mark Zuckerberg, ao lançar seu Facebook Live, apostou em táticas de velha mídia. Contratar estrelas como o chef escocês Gordon Ramsey ou o guru indiano Deepak Chopra. Segundo o Wall Street Journal, o site Buzzfeed recebeu US$ 3 milhões para entrar ao vivo em vídeo por um ano. O jornal The New York Times assinou um contrato equivalente de criação de conteúdo para a plataforma.
A afirmação da executiva, portanto, não é apenas a constatação de uma tendência de comportamento. É a identificação de um nicho rentável e o Facebook trabalhando para empurrar seus usuários para lá.
Vídeos certamente farão parte cada vez maior de nosso cotidiano digital. Mas não devem expulsar textos e áudio da equação. Contrariando Mendelsohn, a melhor forma para passar muita informação em pouco tempo é o texto. Além disso, texto é fácil de buscar. Vídeo, não. E o áudio é excelente para aqueles momentos em que precisamos da atenção dos olhos, mas os ouvidos estão livres.
Há espaço para todos na internet.