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Um marco na história do capitalismo

Por Guilles Lapouge
Atualização:

A indústria Peugeot está salva. Exceto por algum acidente improvável na última hora, a "companhia do leão" escapará da guilhotina que a assombrava há seis meses. Ontem, um conselho de supervisão aprovou um aumento de capital, mas o acordo final só será assinado no dia 26 de março, com a vinda à França do presidente da China, Xi Liping. A participação do presidente chinês na operação confirma que a Peugeot entrará numa nova era e assinalará um profundo rompimento na história da França e do capitalismo. A Peugeot é uma companhia emblemática do capitalismo do século 19 e da "fibra familiar" deste capitalismo. Foi o imperador Napoleão que catapultou a família Peugeot para a indústria. Para vestir os numerosos soldados que voltavam 'congelados' da Rússia, pediu à Peugeot que abrisse uma fábrica de tecidos de algodão, e foi assim que começou a aventura. Os Peugeot não construíam veículos, mas calções e camisas para soldados. Em seguida, a empresa se diversificou. Lançou-se na siderurgia atendendo à indústria relojoeira, mais tarde passou a produzir lâminas para serras. Em 1840, ocorreu o "grande salto". A Peugeot inventou moinhos de café que imediatamente se tornaram famosos. Ao mesmo tempo, fabricou estruturas de aço para as armações usadas sob as saias das damas da alta sociedade. Depois de alguns anos se dedicando à produção de triciclos a vapor, a família Peugeot inventou seu primeiro automóvel em 1880, um dos primeiros do mundo. Foi uma paixão imediata. Um anúncio publicado nos jornais apresentava um Peugeot acompanhado pela legenda: "Chamem-me 'O Indestrutível'". A Peugeot já voava de triunfo em triunfo, apesar de alguns sobressaltos em razão das crises econômicas. O veículo Peugeot tornou-se o símbolo dos "anos loucos": às margens do Mediterrâneo, entre Nice, Monte Carlo e logo Saint Tropez, rapazes elegantes e belas jovens com os cabelos ao vento, viajavam a velocidades proibidas ao volante dos seus Peugeot. A Segunda Guerra Mundial transcorreu com dificuldade, então vieram a renovação, as vitórias nas grandes competições automobilísticas, a prosperidade. Recentemente, a Peugeot entrou em crise. Suas tradições, seus métodos já não serviam para o mundo novo para o qual as grandes indústrias geradoras de riqueza migravam, e onde a "pós-modernidade" subverteu todas as regras do capitalismo e da indústria. Começava um período negro, com um desastre financeiro, durante a última crise econômica, a descida ao abismo, e as demissões em massa. Ficou claro que o antigo capitalismo familiar já não se enquadrava num mundo "globalizado". Há um ano, a empresa lutava para sobreviver. Ontem, o conselho de administração confirmou a metamorfose: um maciço aumento de capital e o fim do controle familiar. Até aqui, a família Peugeot reinava sobre a montadora com 25,4% do capital e 38% dos direitos de voto. A partir de agora, três acionistas deterão cada um 14% do grupo: a família Peugeot, o Estado francês e a chinesa Dongfeng. O futuro conselho de administração da companhia reunirá 14 administradores. Os Peugeot, a Dongfeng e o Estado francês deterão, cada um, dois cargos, Esta é a nova estrutura da Peugeot: o simples enunciado estabelece que uma das empresas mais simbólicas deste obsoleto "capitalismo familiar" do século 19 e parte do século 20, chegou ao fim de sua aventura. Outra se inaugura hoje, igualmente apaixonante. A segunda grande inovação é o fato de que a Peugeot foi inicialmente uma companhia destinada ao mercado francês, depois ao europeu, e então a alguns espaços como a América Latina. Hoje, uma montadora de automóveis deve operar no plano mundial. É por isso que a Peugeot se associa à primeira montadora chinesa, a Dongfeng que produziu 3 milhões de veículos em 2013, e tem um valor de mercado de 8,9 bilhões. Associada a este campeão, a velha companhia nascida no império de Napoleão poderá se lançar à conquista da Ásia, ou seja, à conquista do mundo "pós-moderno". (Tradução de Anna Capovilla) * É correspondente em Paris

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