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Um novo paradigma agrícola

Por Víctor M. Villalobos
Atualização:

Os fenômenos climáticos adversos exigem reação oportuna dos governantes e da sociedade civil. Como diretor-geral da instituição responsável pela cooperação entre os países da região para o desenvolvimento sustentável da agricultura, tenho especial envolvimento com as estratégias necessárias para a adaptação ao novo cenário ambiental. Há que prestar especial atenção nos efeitos das mudanças climáticas nas economias, na estabilidade política e, sobretudo, na segurança alimentar dos cidadãos das Américas do Norte, Central e do Sul e do Caribe. O Brasil também já sente os efeitos do câmbio ambiental. As enchentes no Norte do País e a seca no Sudeste, que já gera conflitos políticos, provam isso. O 5.º Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas apontou que o Sudeste do Brasil, junto com a região de Buenos Aires, na Argentina, e localidades dos Andes serão atingidos por alagamentos mais graves que os do passado recente. As chuvas se acumularão em períodos mais curtos e as secas serão mais intensas. São necessários investimentos na adaptação ao novo contexto.A biotecnologia e a produção em áreas degradadas podem reduzir os impactos do aumento das temperaturas na produção de alimentos, sem avançar sobre áreas preservadas. Neste quesito, o Brasil demonstrou capacidade de estabelecer parâmetros para a conciliação entre a agricultura e o meio ambiente. Cabe à sociedade julgar se tais limites são os ideais. Aos organismos de cooperação técnica, como o que dirijo, cabe recomendar o exemplo brasileiro a outros países. Deve-se evitar o avanço sobre matas virgens. O desmatamento eleva a concentração de gás carbônico na atmosfera, o que reduz o teor de proteína nas sementes, diminuindo a qualidade nutricional dos alimentos. Isso significaria o comprometimento do papel social da agricultura, que é garantir víveres seguros e nutritivos para a população e viabilizar o combate à fome.A cooperação técnica tem multiplicado esforços para a superação dos desafios ambientais. Um exemplo foi o consenso estabelecido entre os ministros da Agricultura das Américas, em setembro do ano passado, na Argentina. As mais altas autoridades políticas do setor em 34 países definiram como a agricultura deve elevar a produção de alimentos e energia sem aumentar a pressão sobre os recursos naturais.O conceito de que o rendimento de uma lavoura deve ser medido também em função da água consumida foi um dos principais preceitos que emergiram no evento, organizado pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). Diante disso, os ministros decidiram que a cooperação internacional deve promover o fortalecimento institucional dos Ministérios da Agricultura para que adotem o tema da gestão integral dos recursos hídricos entre as políticas públicas. Os ministros ainda decidiram direcionar esforços dos órgãos nacionais para: a implementação de sistemas de informação sobre o uso da água; melhorias na produtividade dos recursos hídricos; e fortalecimento dos recursos humanos para levar aos produtores o novo conceito de uso da água.As decisões tomadas na Argentina se basearam no grau de certeza da ciência sobre a elevação das temperaturas e seus efeitos sobre a agricultura. Os avanços científicos e os conhecimentos vernaculares, aliados à transferência de tecnologias e troca de experiências, são os instrumentos mais eficientes da cooperação para se enfrentar esses desafios.Todos esses objetivos somente serão alcançados se as instituições do setor se unirem. Os rendimentos da produção extensiva devem ser mantidos para garantir as commodities alimentares e energéticas que o mundo demanda cada vez mais. Também se deve continuar a inserção de milhares de pequenos produtores ao mercado.São necessários investimentos em inovações que contribuam para o equilíbrio entre a demanda da agricultura e a disponibilidade de recursos hídricos, além da aplicação de recursos para que os pequenos produtores tenham acesso a tecnologias. Se, por um lado, a agricultura é o setor que mais consome água, por outro lado, temos a responsabilidade de protagonizar a solução. *Diretor-geral do IICA

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