PUBLICIDADE

Publicidade

Um passeio pela Wall Street de Oliver Stone, dois anos após a crise

Na continuação do filme de 1987, diretor retrata a falência do sistema financeiro com personagens inspirados em executivos reais

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

"Veja bem, metade dessas pessoas que estão aqui pode ser processada." Oliver Stone, o diretor de cinema, estava sentado à minha frente durante um almoço no Grill Room do Hotel Four Seasons, em Manhattan.Numa mesa num canto da sala estava Stephen Schwarzman, chairman do Blackstone Group; Felix Rohatyn, assessor especial do presidente da Lazard, deixava o local quando cheguei, assim como Barry Diller, chairman do IAC/InterActive Group. E Sanford Weill, ex-chairman do Citigroup - "a origem de todos os males"-, acabara de sair muito apressado, disse Stone com um sorriso irônico.Se há um homem que conseguiu condensar a visão popular de Wall Street e do mundo corporativo americano é Oliver Stone, cujo novo filme, "Wall Street: o dinheiro nunca dorme", estreia nesta semana (inclusive no Brasil). É a continuação de "Wall Street", de 1987. "A ganância, na falta de uma palavra melhor, é boa", dizia o personagem interpretado por Michael Douglas, Gordon Gekko (que retorna na nova versão), resumindo a cobiça por dinheiro e poder que levou o mercado ao colapso.Dois anos depois do ápice da última crise financeira, o país ainda luta com as consequências de um período muito semelhante ao retratado por Oliver Stone duas décadas atrás. E que também se ajustava perfeitamente ao local onde estávamos almoçando, no epicentro do que restou do império dos magnatas, cercados por personagens reais que povoam Wall Street. Por um momento, fiquei um pouco preocupado que Stone não conseguisse engolir sua comida."Wall Street ficou maluca", disse o diretor, um pouco irritado. "Bancos não são mais o que eram. Quando era criança, você tinha uma conta de poupança e rendia 3% ou 4%. Hoje não rende nada e o Goldman Sachs é uma grande holding bancária." Se Wall Street quiser um dia superar a desconfiança que muita gente nutre pelo setor financeiro, terá de conquistar pessoas como Stone, cujo pai trabalhou como corretor para Sanford Weill.Radicalismo.Embora o setor possa considerar o diretor muito radical, seu ponto de vista ganhou impulso em grandes camadas do país, independentemente de partido político ou ideologia. Stone quase desistiu de filmar em Wall Street em 2006 porque achava que poderia passar uma mensagem errada. "Era só riqueza, muita riqueza. Sujeitos como aquele ali fazendo festas de aniversário não me interessam", disse, apontando com a cabeça para a mesa de Schwarzman.Decidiu retomar o tema depois da crise financeira, pois achou que o setor finalmente perdeu um pouco da sua arrogância e um relato ficcional explorando essa fase com mais profundidade expressaria o sentimento nacional. Mas, segundo ele, "o mundo das altas finanças se tornou apenas o cenário de um filme sobre confiança, amor, ganância, traição".Apesar de Stone ter suas próprias convicções sobre Wall Street, ele diz que o filme procura oferecer uma visão mais equilibrada. "É um bando de pessoas de todo o tipo, e é isso que Gekko diz no final do filme: somos todos diferentes uns dos outros. Tem gente boa e gente ruim."O diretor acrescentou que "seria ridículo simplificar as coisas e dizer que Wall Street é o demônio". Fez uma pausa e corrigiu: "talvez o Goldman Sachs seja". "Muitas pessoas que conheço em Wall Street são gente boa. Como meu pai. Ele queria ganhar dinheiro, mas também queria fazer o bem para a sociedade."O primeiro filme tornou-se uma referência que o setor financeiro, curiosamente, acatou. Agora, contudo, a recepção poderá ser menos favorável. Stone não está acusando apenas alguns personagens de caráter duvidoso, mas retratando todo um sistema como moralmente falido. Antes de deixar o restaurante, Schwarzman parou na nossa mesa, mas, ao ver Stone, a conversa acabou. Quando saiu, o diretor parecia abatido. "Esse é o problema destes lugares. Se Henry Kissinger estivesse aqui, o que você faria? Não estenderia a mão? É um problema. É o problema da sociedade de Nova York, está tudo entrelaçado." / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.