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Cientista político e economista

Opinião|Uma semana e tanto

Esta era a semana em que eu planejava me concentrar nos primeiros – ainda que lentos – sinais de recuperação econômica do Brasil. Mas tanta coisa aconteceu nos últimos dias, aqui e no exterior, que o assunto ficou para segundo ou terceiro plano.  Em primeiro lugar, certamente preocupado em entender todos os detalhes de sua primeira viagem internacional como presidente, nada mais nada menos que para o turbulento Oriente Médio, Donald Trump encontrou um tempinho para demitir James Comey, diretor do FBI, em circunstâncias que, mais uma vez, desnortearam seu vice-presidente e seus assessores. O problema tinha algo a ver com as atividades de seu ex-conselheiro de Segurança Nacional, Michael Flynn.

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Atualização:

Depois, em meio às crescentes preocupações quanto à influência russa sobre as eleições americanas de 2016, Trump marcou uma reunião privada com o embaixador e o ministro das Relações Exteriores da Rússia. Na ocasião – filmada apenas por câmeras de emissoras russas, mas imediatamente retransmitida para o exterior –, Trump apareceu saudando os russos com bastante entusiasmo. Mas não parou por aí: ele também lhes revelou informações altamente confidenciais de fontes israelenses. 

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Essa combinação de fatos provocou certo alarido, tanto na opinião pública quanto no Congresso, e logo ocorreu a nomeação de um conselheiro especial, o ex-diretor do FBI Robert Mueller. Sobrou pouca atenção para o fim do Obamacare, as novas reduções de impostos, os investimentos maciços em infraestrutura e o aumento de tarifas, fatores fundamentais para “Make America Great Again”.

Em segundo lugar, no começo da noite do dia 17, o jornal O Globo relatou uma conversa gravada entre o presidente Michel Temer e o dono da JBS, apontando que o presidente autorizou a transferência de recursos para Eduardo Cunha, para comprar seu silêncio. A generosidade da JBS também incluía o senador Aécio Neves, o que causou seu afastamento temporário do cargo. Tudo isso agora está aguardando decisão do STF.

Temer reagiu na tarde de quinta-feira, insistindo que não solicitara fundos da JBS e que permaneceria na presidência. Isso veio depois de uma pesada desvalorização da Bovespa, diante da incerteza dos mercados. Partidos de esquerda protocolaram pedidos de impeachment, e até mesmo aliados de centro indicaram que estavam a ponto de retirar o apoio ao governo. 

Agora, a situação política ficou ainda mais confusa, uma vez que Dilma já foi afastada. Tanto o atual presidente da Câmara dos Deputados, que deveria suceder Temer temporariamente, quanto o presidente do Senado foram citados nas investigações da Lava Jato. Enquanto isso, as gravações estão circulando. Alguns dizem que o conteúdo um tanto inaudível não chega a fornecer provas definitivas da culpa de Temer. Mais que isso, as forças políticas querem evitar uma nova eleição, na qual Lula, ainda elegível, teria consideráveis chances de vitória. Assim como Bolsonaro. Os empresários começaram a pensar em Henrique Meirelles como opção, tentando aproveitar a recuperação econômica para apoiá-lo. 

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Temer, que jamais conseguiu angariar apoio popular, acabou convencendo brasileiros de várias tendências políticas diferentes a tomarem as ruas. Eles exigem o início imediato do processo de impeachment. Uma coisa é certa: os líderes políticos já começaram a debater sobre rumos alternativos. O cenário repete, em grau muito mais intenso, as incertezas que emergiram após a morte inesperada de Tancredo Neves, em 1985.

Nesse ínterim, o Banco Central reagiu aumentando a oferta monetária, permitindo que o real se fortalecesse e que a bolsa recuperasse parte de suas perdas. Uma redução não programada nas taxas de juros não seria surpreendente – depois que os índices de preços caíram de maneira significativa no último mês. 

No passado, agosto costumava ser o mês mais crítico das mudanças dramáticas da presidência do Brasil. Agora, talvez se possa interpretar a crise atual deste maio como evidência do substancial progresso econômico e social brasileiro das últimas três décadas. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU 

Opinião por Albert Fishlow
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