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Uma única palavra: indústrias

Por Harold Meyerson
Atualização:

Em A primeira noite de um homem, filme de 1967 que retratava a inserção de um jovem na sociedade adulta americana - posteriormente rejeitada por ele -, o personagem de Dustin Hoffman, Benjamin, recebe de um desses adultos superficiais e corruptos um sucinto conselho vocacional durante um coquetel para adultos superficiais e corruptos: "Plásticos". O termo, 42 anos mais tarde, adquiriu um sentido que os produtores do filme jamais teriam imaginado. Quando o formando da turma de 1967 do ensino médio -no caso, eu - que considerou tal frase, na época, uma denúncia brilhante da superficialidade americana, assiste à mesma cena hoje, sua reação é pensar: "É mesmo, naquela época os Estados Unidos ainda fabricavam produtos". Nós não os fabricamos mais, pelo menos da maneira como costumávamos fazer. Desde 1987, houve um recuo de 30% na proporção representada pela atividade manufatureira no PIB dos EUA. Antes o principal exportador mundial, o país se tornou o principal importador mundial. Em 2007, exportamos US$ 1,2 trilhão em bens e serviços, mas importamos US$ 1,8 trilhão. No governo Obama e no Capitólio estão em curso propostas que podem começar a pôr fim a essa caricatura. Na semana passada, o presidente anunciou que seriam destinados US$ 2,4 bilhões do Plano de Recuperação a empresas americanas responsáveis pelo desenvolvimento de baterias para carros híbridos e elétricos. A controvertida legislação Waxman-Markey contra a mudança climática contém um dispositivo para garantir um empréstimo de US$ 30 bilhões para a conversão de empresas de autopeças em fábricas abastecidas com fontes energéticas alternativas. O senador Sherrod Brown, democrata de Ohio e principal proponente da retomada da atividade manufatureira americana no Congresso, tem pedido que se torne permanente a isenção fiscal para atividades de pesquisa e desenvolvimento (atualmente, a isenção precisa ser renovada a cada dois anos) e injetado algumas considerações pró-americanas em nossa política comercial. No governo, são debatidas medidas que poderiam aumentar o compromisso com a atividade manufatureira. O declínio nessa atividade representa, por exemplo, um imenso obstáculo para a recuperação econômica. Como já observaram estudiosos e jornalistas, em todas as recuperações desde a Grande Depressão até 1990, quando os consumidores americanos passaram a comprar mais, as fábricas dos EUA reconvocaram funcionários demitidos e começaram a produzir mais. Hoje, quando o governo injeta mais dinheiro no bolso do consumidor, isso significa que as fábricas chinesas reconvocam seus trabalhadores e começam a produzir mais. Significa que os varejistas americanos contratarão mais funcionários de baixo salário, enquanto as fábricas não contratam ninguém, uma mudança que reduzirá a renda média da população. O declínio da atividade manufatureira americana no longo prazo esgotou nossas indústrias de alta tecnologia tanto quanto desgastou nossos setores mais veneráveis. Nossos fabricantes de móveis perderam 60% da capacidade produtiva desde 2000, conforme aponta Richard McCormack, editor da Manufacturing & Technology News, num ensaio publicado no último livro editado por ele, Fabricando um futuro melhor para os EUA. No setor da tecnologia de ponta, apenas uma entre as dez maiores fabricantes mundiais de células fotovoltaicas é americana. Os EUA foram superados pela China no valor das exportações de alta tecnologia em 2004 e desde então a diferença só aumentou. O que torna o declínio da atividade manufatureira americana tão exasperante é não sermos superados por causa da ineficiência: as fábricas americanas estão entre as mais produtivas do mundo, como destaca McCormack. O problema é que, caso único entre as potências industriais, nós atribuímos a tarefa de atrair fabricantes não ao governo federal, mas aos Estados e municípios, que tentam seduzir fábricas e instalações de pesquisas com isenções fiscais e investimentos públicos que são apequenados pelos governos nacionais de outros países. A reversão desse quadro pode ajudar a economia e conferir recompensas políticas a um governo que sente falta delas atualmente. Brown, por exemplo, é um liberal com origens num Estado conhecido pelo predomínio conservador, e é a defesa que ele faz da atividade manufatureira o que lhe conferiu os votos do mesmo eleitorado branco trabalhador cuja relação com Obama está azedando. Em algum momento, a Casa Branca pode perceber que a defesa da manufatura não é apenas uma medida economicamente necessária, mas também uma inteligente política democrata. Além disso, se voltássemos a fabricar produtos, a palavra "plásticos" não desencadearia uma onda de nostalgia. *O autor é editor geral das publicações American Prospect e L.A. Weekly

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