Atenção, atenção. Você que tem plano de saúde ou pretende ter algum irá enfrentar mudanças importantes nas regras do jogo e, também, nos custos dos tratamentos ou dos procedimentos de saúde.
Alcançarão, a partir de 2019, os novos contratos ou a renovação dos existentes, nas modalidades de franquia e de coparticipação. Esses planos estão previstos na lei de 1998, mas só agora a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a instituição xerife do setor, definiu as regras por meio da Resolução 433, de fim de junho e com 180 dias para entrar em vigor.
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Muito associado não presta atenção na modalidade de seu contrato. Como acontece nos seguros de automóvel, nos contratos com franquia, o consumidor arca com os custos dos procedimentos de saúde até determinado valor. A operadora só paga o que ultrapassa esse limite. Nos planos com coparticipação, o segurado paga parte do preço do procedimento, também como predefinido em contrato.
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Essas duas modalidades correspondem hoje a 52% de todos os contratos ativos no mercado de saúde suplementar. Há dez anos, eram 22%. Até agora, alcançavam apenas contratos coletivos, ou seja, planos contratados por empresas, sindicatos, associações ou de categorias profissionais.
Em linhas gerais, além de liberar a negociação de planos de saúde com franquia e coparticipação também para os planos individuais, a resolução impôs um teto para cobranças aos segurados e definiu uma lista de procedimentos que as operadoras devem cumprir integralmente, como os de exames preventivos e procedimentos indispensáveis (por exemplo, hemodiálise e quimioterapia).
Para Ana Candida Sammarco, sócia da área de regulação da saúde do escritório de advocacia Mattos Filho, ainda que tardia, a novidade garante mais segurança jurídica, o que não é pouca coisa. Apenas em 2017, estimativas do Conselho Nacional de Justiça apontam a existência de 1,5 milhão de ações judiciais que envolvem áreas de saúde, das quais cerca de 30% questionam a atuação de operadoras de planos de saúde.
A ANS também não foi muito de enquadrar as operadoras. O máximo a que chegava era recomendar que observassem o limite de 30% (sobre o valor dos procedimentos) nas cobranças do beneficiário dos planos de coparticipação. Ou seja, as operadoras estavam livres para cobrar o que quisessem. Agora, o máximo a ser cobrado do beneficiário é 40% de cada consulta, exame ou terapia.
A ANS espera que as novas regras também ajudem a derrubar os custos crescentes da saúde suplementar, porque o associado e seu médico pensarão duas vezes antes de contratar um procedimento de alto custo. Da forma como funciona o setor de planos de saúde hoje, o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar estima que os custos alcançarão R$ 383,5 bilhões em 2030, 157,3% a mais do que em 2017.
Henrique Lian, diretor da Proteste, associação de defesa do consumidor, e a especialista em Direito do Consumidor Tatiana Queiroz reconhecem avanço na decisão, mas advertem para novos riscos. Ao menos quatro problemas novos podem estar a caminho. Um desses problemas acontecerá se as operadoras deixarem de oferecer planos com cobertura integral, como já aconteceu com os planos individuais. Outro: as novas exigências de coparticipação podem estourar o orçamento do consumidor e elevar as desistências. Ou, então, podem obrigar o associado a adiar exames e terapias, atitude que tende a encarecer os tratamentos. Também desconfiam de que a esperada redução de custos não leve a queda correspondente das mensalidades.
Para o diretor da ANS Rodrigo Aguiar esses riscos são irrelevantes. Mesmo sem a resolução, os planos com coparticipação e franquia já são maioria no mercado e não trouxeram os problemas alegados, diz.
Ele ainda argumenta que, ao assinar o contrato, o consumidor saberá de antemão o máximo que lhe será cobrado, na medida em que os gastos com coparticipação e franquia não poderão ultrapassar o valor pago em mensalidade no acumulado de 12 meses.
O problema mais importante é o de que a resolução não impõe limites às correções de preços. E isso tende a perpetuar práticas de reajustes abusivos nos planos coletivos – cerca de 80% dos contratos. Levantamento da consultoria Mercer Marsh Benefícios mostra que, de 2012 a 2017, o reajuste dos planos empresariais foi de 102,3%.
Enquanto as operadoras continuarem mandando no jogo, é pouco provável avanço relevante no setor. A ANS sabe disso.