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Venda online cresce 480% em maio, mas ainda não sustenta o negócio, diz presidente da C&A

O total de clientes novos no e-commerce da rede chegou a 68% em abril; hoje, das 300 lojas no País, apenas cerca de 13% estão abertas

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Por Talita Nascimento
Atualização:

"Eu vejo que chegaremos em dezembro com toda a operação física funcionando. Acho pouco provável que seja com a força que estávamos em março (antes da pandemia), mas acredito que estaremos poderosíssimos em todos os canais de venda." Essa é a leitura do presidente da C&A, Paulo Correa, sobre como a crise do novo coronavírus deve se desdobrar no decorrer deste ano.

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A empresa teve crescimento exponencial nos canais digitais no segundo trimestre. "Chegamos a ter picos de 800% em vendas. Depois do dia 15 de março, todo dia é Black Friday para nós", diz Correa. Ainda assim, a empresa trabalha com cenários conservadores.

"Por mais que o e-commerce esteja explodindo, ele ainda não segura a companhia. Está longe disso. Por isso, fizemos bem em trabalhar com um cenário mais pessimista do que o que vivemos agora", afirma, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast.

No primeiro trimestre de 2020, a C&A registrou alta de 53% nas vendas online. Em maio, o e-commerce atingiu crescimento de 480%, na comparação com o mesmo período de 2019. As vendas por aplicativo representam mais de 50% do comércio eletrônico da companhia. Elas subiram 174% no primeiro trimestre e, em abril, ultrapassaram crescimento de 600%.

Segundo dados do programa de relacionamento com o cliente da C&A, a porcentagem de clientes novos no e-commerce era de 54% no primeiro trimestre do ano e, em abril, chegou a 68%. Além disso, as vendas de produtos de lojas físicas feitas pela internet representam hoje 55% do faturamento do e-commerce. Antes, não passavam de 3%.

A seguir os principais trechos da entrevista.

Opresidente da C&A Brasil, Paulo Correa. Foto: C&A

O que podemos adiantar do segundo trimestre? Como foi o Dia das Mães na C&A?

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O Dia das Mães obviamente foi muito mais fraco do que no ano passado. Tínhamos cinco lojas abertas, das 300. A C&A tem presença maior em São Paulo, Rio de Janeiro e Nordeste, exatamente os focos da pandemia. Hoje já temos de 13% a 14% do total de lojas abertas. Por mais que o e-commerce esteja explodindo, ele ainda não segura a companhia. Está longe disso. Por isso fizemos bem em trabalhar com um cenário mais pessimista do que o que vivemos agora. A certeza é que o Dia dos Namorados será melhor que o Dia das Mães.

Quais são as condições para reabrir as lojas?

Precisa existir convergência entre decretos estaduais e municipais. Se as autoridades e suas respectivas secretarias de saúde não conseguem chegar a um consenso, significa que há dúvidas na história. Então não vamos arriscar. Além disso, precisamos ter para cada um desses lugares o protocolo de segurança implementado, se não tiver, não abrimos. O problema não é o dia que as lojas vão reabrir, mas quando as pessoas vão se sentir seguras para voltar a frequentar esses espaços. Isso talvez vá demorar meses. Acho difícil que os locais mais centralizados tenham abertura antes do final de junho. Mas o pior de tudo é a falta de coordenação entre as diversas esferas federal, estadual e municipal. Esse é nosso pior problema. Poderia ser muito mais coordenado e, em tese, deveria trazer resultados muito melhores do que os resultados que vimos até agora. Essa descoordenação faz o nosso ciclo ser mais longo do que o de outros países. Isso é lamentável, mas nosso papel é ser o mais responsável possível nesse processo.

Como o plano de investimentos de vocês foi alterado?

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O digital já estava no nosso programa, mas imaginávamos que chegaríamos a uma parcela do faturamento de dois dígitos em três anos. Isso aconteceu em três semanas. A aceleração foi muito forte, mas porque havíamos preparado várias coisas. Já tínhamos o "ship from store" (vendas de produtos de lojas físicas feitas pela internet) em 80 lojas. Aos poucos fomos reabrindo essas lojas no formato dark (quando a loja é fechada ao público, mas funciona como uma espécie de centro de distribuição). Assim, esse formato, que representava 5% do e-commerce, hoje é 55% dele. Tínhamos vários projetos de lojas físicas engatilhados que não pudemos tocar. Esses gastos automaticamente devem escorregar para o ano que vem, o que liberou investimentos. As reformas de lojas também foram postergadas. Tudo isso permitiu acelerar projetos de online. Nosso investimento nessa área vai ser duas vezes e meia, quase três vezes o que era planejado no início do ano. Ninguém imaginava que cresceríamos tanto. Tivemos picos de 800% de crescimento de vendas. Nem na Black Friday foi assim. Desde o dia 15 de março, todo dia é Black Friday.

Mas as margens de lucro não são muito menores no e-commerce?

As margens do online são um pouco menores em razão do espírito promocional mais agressivo desse segmento. Mas a diferença não é tão grande assim e, à medida que você cresce em escala, começa a dissolver essa diferença que existe para a margem do offline.

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Como a C&A vai chegar ao final do ano?

Vamos chegar em dezembro com toda a operação física funcionando. Acho pouco provável que seja com a força que estávamos em março (antes da pandemia), mas acredito que estaremos poderosíssimos no omnicanal (todos os canais de venda). Como nunca poderíamos ter imaginado quando tudo isso começou.

O que o sr. destacaria dos desafios que a crise impôs ao grupo?

Até a crise estávamos vindo progressivamente mais fortes, com crescimento de dois dígitos. Em 48 horas nos vimos obrigados a fechar todas as lojas. A participação do e-commerce nas vendas antes da pandemia era de cerca de 3%. Quando o fechamento das lojas aconteceu, o faturamento despencou para o tamanho que o e-commerce tinha. Obviamente, ter faturamento zero durante duas semanas, desmonta o plano que tínhamos montado em termos de resultados. Montamos um comitê de crise e o primeiro mandato dele era a situação de caixa. Já tínhamos uma operação de crédito em fase final, logo ela foi fechada com uma taxa pré-covid (CDI + 1,09%). Depois fechamos outra de mais R$ 350 milhões (CDI+ 3,45%). Então nossa sustentação ficou garantida. Estávamos trabalhando com o cenário de que nenhuma loja abriria até o final de junho.

E como foi a busca por crédito nessa situação de crise?

Dizer que as medidas do governo facilitaram o crédito para os empresários, na prática, não é o que acontece. O próprio ministro comenta que o dinheiro está empoçado. O nosso cenário era de uma empresa que tinha zero histórico de endividamento. Nosso endividamento era com a matriz e, à medida que saiu o IPO, pagamos. Assim, nossa capacidade e histórico de pagamento tornaram a oferta de crédito mais aberta e disponível que a média. Obviamente o preço mudou com a crise, mas temos tido conversas mais tranquilas com os parceiros. Sei que essa não é a realidade do mercado. Se há patamar de endividamento maior, há mais dificuldade. Se o negócio se trata de uma empresa de pequeno e médio porte, é mais difícil ainda.

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