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Verba de convênios acirra briga pelo poder no Ipea

Dinheiro para eventos acadêmicos e outros fins serve, na prática,[br]para engordar o salário de funcionários de universidades públicas

Por Sergio Gobetti
Atualização:

A disputa nos bastidores pelo dinheiro dos convênios do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) explica boa parte da polêmica envolvendo as mudanças promovidas pela atual diretoria da instituição. Os convênios têm sido utilizados para patrocinar eventos acadêmicos, contratar bolsistas e estudos de professores universitários, mas também, segundo apurou o Estado, como fonte adicional de renda dos pesquisadores do próprio Ipea. Anualmente, o instituto tem transferido cerca de R$ 1 milhão a entidades privadas sem fins lucrativos, contratadas no âmbito da Coordenação Nacional de Pesquisa Econômica. Isso sem contar o repasse de recursos originários das estatais, como Petrobrás e Caixa Econômica Federal, que também servem para patrocínios e consultorias prestadas por instituições e por "empresas de uma pessoa só". Na prática, a maioria das contratações é feita com dispensa de licitação, porque os contratados possuem "notório saber". Isso significa que um diretor do Ipea tem enorme liberdade para escolher quem serão as pessoas a prestar consultoria, além de ter poder para definir os grandes convênios institucionais. Ou seja, a polêmica entre os novos diretores do Ipea e os quatro economistas afastados do instituto (Fabio Giambiagi, Régis Bonelli, Otávio Tourinho e Gervásio Rezende) reflete não só as diferenças ideológicas e de concepção teórica sobre a política econômica, mas também interesses em torno de ganhos e perdas salariais. Tanto é assim que um dos diretores afastados, João de Negri, era ideologicamente muito próximo do ex-presidente do Ipea, o petista Glauco Arbix, coordenador do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP). No caso dos novos diretores do Ipea, o círculo de relações pessoais e institucionais é completamente distinto da antiga diretoria. O presidente do instituto, Márcio Pochmann (Unicamp), e o diretor de Macroeconomia, João Sicsú (UFRJ), têm divergências profundas com os economistas da PUC e da Fundação Getúlio Vargas do Rio (FGV-RJ) e da maioria dos cursos de pós-graduação em economia do País, onde existe uma clara hegemonia do pensamento ortodoxo. Na semana passada, chegou a ser noticiado que o Ipea suspenderia um convênio com a Associação Nacional de Pós-Graduação em Economia (Anpec), provocando reclamações generalizadas nos bastidores da entidade. Na quarta-feira, Pochmann negou que fosse suspender o convênio, mas confirmou que estava discutindo novas parcerias com os reitores das universidades. O Estado apurou que três fundações - Finatec (UnB), José Bonifácio (UFRJ) e Fucamp (UNICAMP) - deverão ser as principais conveniadas daqui por diante. Em tese, as fundações são mais transparentes e alcançam outras áreas do conhecimento, mas representam apenas três universidades - duas delas coincidentemente ligadas à nova cúpula do Ipea. UNIVERSIDADES A remuneração extra de pesquisadores e professores já é uma prática disseminada no meio acadêmico para contornar os baixos salários pagos pelo governo e, especialmente, pelas universidades. Atualmente, um professor com doutorado de uma universidade federal ganha R$ 6 mil brutos e, no Ipea, R$ 9 mil - pouco mais da metade do que ganha um delegado da Polícia Federal com curso de graduação apenas. Para contornar essa restrição salarial, inúmeras universidades públicas passaram a incentivar a criação de fundações privadas, e os próprios professores têm se organizado em cursos de pós-graduação profissionalizantes (pagos) - dentro do espaço público - para ganhar um extra. Resultado: faltam professores nos cursos regulares (gratuitos), porque a maioria está ocupada com suas aulas e consultorias particulares.

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