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Vida de pompa e circunstância

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Por Redação
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Na atual era de estagnação, uma das poucas coisas que não param de crescer são as queixas contra o aumento da desigualdade. O jornalista Robert Frank, que há anos cobre o universo dos biliardários, teme que os ricos americanos estejam “migrando para um país só seu”. Chrystia Freeland, jornalista canadense que entrou para a política, preocupa-se com a ascensão de uma nova classe de “nababos globais”. Charles Murray, o mais soturno dos cientistas sociais americanos, adverte que a sociedade está “rachando ao meio”, com os ricos se encastelando em condomínios murados.

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No entanto, nos degraus mais altos da pirâmide social observa-se agora uma tendência em sentido contrário. Nunca antes tantas pessoas tiveram acesso tão desimpedido aos mimos da plutocracia: jatinhos, iates, carrões e casas que são um luxo só. Talvez não sirva de consolo saber que, com apenas algumas dezenas de milhões na conta bancária, hoje as pessoas podem desfrutar do estilo de vida dos arquimilionários. De qualquer forma, o fato é que, graças a uma combinação de novas tecnologias e iniciativas empresariais, isso está acontecendo.

A vida de um magnata começa com seu primeiro jatinho. Se os iates são dispensáveis (nem todo mundo quer passar semanas em alto-mar, com as mesmas pessoas), os jatos executivos são artigo de primeira necessidade para os aspirantes a bilionário. É um luxo que ajuda a economizar tempo. Mesmo quem voa na primeira classe tem de esperar para embarcar. O proprietário de um jatinho particular chega ao aeroporto na hora que bem entende. Também pode usar a aeronave como escritório no ar, sem ter de se preocupar que informações sigilosas cheguem aos ouvidos de passageiros indiscretos. O voo é mais suave (os jatos executivos costumam voar a quase 14 mil metros de altitude), as poltronas são parecidas com tronos e dá para levar a bordo o bicho de estimação.

A pessoa não precisa mais acumular um patrimônio de centenas de milhões de dólares para ter um avião desses. Com 700 jatinhos, a NetJets hoje é a quinta maior companhia aérea em número de aeronaves e tem acesso a milhares de aeroportos particulares. Sua principal inovação foi aplicar o conceito de propriedade fracionada, ou tempo compartilhado.

A NetJets também é especialista em abrir para seus clientes as portas do universo cultural dos reis Midas do mundo, garantindo-lhes ingressos para disputadíssimas feiras de arte contemporânea, como a Art Basel, ou lhes oferecendo a oportunidade de jantar com celebridades. Além disso, a companhia vem baixando preços. Uma de suas ideias mais recentes é a criação de uma espécie de “bilhete único”: em vez de adquirir uma fração de um jatinho, o cliente compra um cartão pré-pago, que dá direito a determinado número de horas de voo. Um cartão com 25 horas de voo sai por aproximadamente € 155 mil (US$ 164 mil).

A economia compartilhada não nasceu das necessidades dos endinheirados. Mas, em certos aspectos, é perfeita para eles. O mecanismo gira em torno da existência de ativos ociosos. E quem dispõe de mais ativos à toa do que os podres de rico? Quem gosta mais de faturar um dinheirinho extra do que os que passaram a vida toda acumulando recursos? Na outra ponta do mercado, os plutocratas em ascensão constituem inesgotável fonte de demanda por acomodações temporárias e arroubos de luxo. A coisa pode até ter efeitos positivos para a imagem dos usuários. Um executivo abastado que faz uso da NetJets não precisa explicar a seus acionistas por que comprou um jatinho, embora trate como seu o Cessna Citation X, o Gulfstream G550 ou o Embraer Phenom300.

O aplicativo de caronas pagas Uber e o site de compartilhamento de acomodações Airbnb também marcam presença no mercado de luxo. O primeiro oferece passeios de iate em Dubai (UberYacht) e transporte de helicóptero em São Paulo (UberCopter). O Airbnb faz sucesso com apartamentos de luxo em Londres, Hong Kong e no Caribe. O GetMyBoat, de San Francisco, oferece acesso a lanchas, casas flutuantes de luxo, iates e jet-skis em 7,1 mil localidades espalhadas pelo mundo. O Stratajet vende passagens em jatinhos particulares que estarão vazios em uma ou mais pernas do voo. O usuário paga o mesmo, ou até menos, do que pagaria por uma passagem de classe executiva. Um clube de compartilhamento de residências chamado ThirdHome.com permite que pessoas que têm apenas duas ou três casas vivam como se fossem os felizes proprietários de uma dezena delas.

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E não é só o consumo de riquezas que vem se popularizando. A administração do dinheiro também começa a ser compartilhada. Agora qualquer pessoa que disponha de US$ 5 milhões para investir pode fazer isso, graças à proliferação dos chamados “multi family offices”, que atendem a vários clientes.

Agora, bens e serviços que até pouco tempo atrás eram exclusividade de um punhado de grandes magnatas podem ser desfrutados por aspirantes a milionário, graças à mágica da economia compartilhada. É possível que os nababos estejam migrando para um país só seu. Mas o número dos que podem conhecer esse país, ainda que temporariamente, é maior que nunca.

© 2016 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.

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