Os danos causados pelo coronavírus são enormes. A nível mundial, o número de casos confirmados beira 7 milhões, enquanto que o número de mortos chega a 400 mil. Dada a escassez de testes, a Universidade de Miami estimou que o número real de casos talvez seja 16 vezes maior do que aqueles reportados pela Universidade de Johns Hopkins.
O outro lado da tragédia humana é a destruição de empregos, a falência de empresas que operam nos setores mais afetados pelo lockdown, e a pior recessão registrada desde a grande depressão de 1929. Por essas razões, em seu relatório de abril de 2020, o FMI previu que o PIB mundial cairá 3% e que este levará 18 meses até voltar ao nível registrado antes da pandemia.
Vários dados, eventos clínicos e programas de estímulos fiscais e monetários divulgados desde abril me deixam mais otimista em relação ao futuro. As economias avançadas e a China mostram uma queda significativa no número de casos e de mortes, permitindo a reabertura de suas economias. O risco é que ainda não temos nem o volume de testes confiáveis nem os mecanismos de rastreamento adequados para debelar novos focos de infecção.
Os dados de atividade econômica de alta frequência de China, EUA e Europa mostram que o processo de recuperação já começou, o que em grande parte é resultado da reabertura e dos programas de estímulos macroeconômicos. Alguns exemplos são a recuperação da produção industrial, vendas no varejo, consumo de energia, logística, congestionamento de trânsito, mobilidade das pessoas, e viagens.
O valor dos programas de estímulos fiscais e monetários adotados pelas economias avançadas e, em menor grau, nas economias emergentes, é de tal magnitude que é provável que o mundo será capaz de evitar uma depressão econômica. Os bancos centrais têm cumprido à risca o seu papel de prestamista de última estância: eles reduziram as taxas de juros reais abaixo de zero; expandiram os seus balanços para comprar ativos de risco do mercado; e aumentaram as reservas bancárias, o que permite que os bancos possam expandir o crédito.
A atuação dos bancos centrais normalizou o funcionamento dos mercados financeiros e evitou uma grande crise bancária. Ao reabrir os mercados de capitais e de crédito, os bancos centrais ajudaram as empresas a aumentar o caixa. Isso permitirá que as empresas que mais foram afetadas pelo lockdown sobrevivam, o que é vital para reduzir o desemprego.
Mas o maior efeito da política monetária foi a forte recuperação dos mercados financeiros. Em menos de um mês, o índice da Bolsa americana S&P 500 caiu 34%; mas, alimentado pelo excesso de liquidez global, em dois meses o índice S&P 500 se recuperou, ficando só 6% abaixo do seu recorde de 3.393 pontos.
As empresas que se mais beneficiaram do lockdown iniciaram a recuperação da Bolsa americana. Na medida em os primeiros sinais de reativação econômica vieram, o rally da Bolsa se estendeu para os setores que mais sofreram, tais como energia, bancos e viagens. Na sequência, os investidores se redirecionaram para o mercado de renda fixa, reduzindo o prêmio de risco das empresas no segmento de grau de investimento e depois de high yield. O próximo destino dos fluxos de capitais serão os emergentes.
Nesse cenário mais otimista, é provável que a economia mundial cresça gradualmente a partir do 3.º trimestre de 2020 e que o crescimento do PIB mundial chegue a 6% em 2021. Essa recuperação é fundamental para reduzir o risco de instabilidade política advinda de protestos e distúrbios sociais, tais como os que estamos vivendo hoje nos EUA.
Esse cenário positivo ainda é frágil e só vai se consolidar se atuarmos de forma científica para evitar novas ondas de contágio. Isso exigirá que os líderes políticos mundiais cumpram três tarefas.
A primeira é seriedade na gestão pública, respeito às instituições e um espírito de cooperação entre as nações, evitando as perigosas guinadas protecionistas e promovendo o intercâmbio científico para encontrar tratamento e vacinas eficazes para combater o coronavírus. A segunda é investir na área da saúde, aumentando exponencialmente a quantidade e a confiabilidade dos testes e desenvolvendo mecanismos de rastreamento do coronavírus. A terceira é anunciar uma estratégia de saída para reduzir os elevados níveis da dívida pública, limpar o balanço dos bancos centrais e normalizar a política monetária.