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Vouchers

Pelo que mostram as avaliações de programas já existentes, Brasil é um bom candidato para adotá-los

Por José Márcio Camargo
Atualização:

O governo brasileiro anunciou que pretende criar um programa de vouchers para universalizar o acesso a creches de crianças de zero a três anos. O voucher é um vale, concedido pelo governo a uma família, para ser utilizado para comprar um determinado bem ou serviço no setor privado – no caso em pauta, a frequência de seus filhos de zero a três anos em creches privadas.

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A pressuposição é de que a relação custo/benefício de utilizar a capacidade já existente e o potencial de investimento do setor privado para aumentar a oferta de vagas em creches é menor do que a construção de mais creches, contratação de professores, etc. pelo setor público. Entre outras razões, porque, como os provedores do setor privado (creches) estão submetidos à competição entre si e são escolhidos livremente pelos estudantes ou seus representantes (os pais), a expectativa é de que sejam mais eficientes que a provisão pública, cujos provedores estão expostos à manipulação política e estão submetidos a um ambiente não competitivo.

Um possível efeito colateral negativo destes programas é a geração de incentivos para os melhores alunos escolherem as melhores escolas, e vice-versa, deixando os piores alunos, os menos motivados, os menos preparados para as escolas públicas ou para as piores escolas privadas. O resultado seria melhor desempenho ao custo de um persistente aumento da desigualdade.

Programas de financiamento educacional por meio de vouchers foram adotados em países, contextos e desenhos bastante diferentes entre si. Pesquisas têm sido realizadas com o objetivo de avaliar seus resultados, principalmente no que se refere à possível melhora do desempenho dos alunos e ao aumento da desigualdade.

Os resultados das avaliações são dúbios e dependem do público-alvo e do desenho do programa, ao contrário da expectativa de grande parte dos estudiosos. A evidência não indica que dar vouchers aos estudantes seja um mecanismo sistematicamente confiável para melhorar o desempenho educacional dos alunos. Uma parte importante dos estudos sugere que ganhar um voucher não necessariamente tem efeito significativamente diferente de zero no desempenho.

Porém, existem evidências robustas de que os vouchers conseguem seus melhores resultados em países emergentes (Chile, Colômbia e Índia, por exemplo), comparado a países desenvolvidos (Suécia, Holanda e Estados Unidos, por exemplo) e para grupos específicos de estudantes (afrodescendentes nos Estados Unidos e crianças de famílias pobres em países emergentes). A explicação para esses resultados é a maior diferença de qualidade entre as escolas públicas e as escolas privadas frequentadas pelos grupos mais carentes, em comparação com os grupos mais ricos, e dos países emergentes em comparação com os países desenvolvidos. As evidências são também fortes no sentido de que, mesmo nos programas que não geram melhoria no desempenho, é significativo o aumento da probabilidade de que o aluno se gradue no curso que está frequentando.

Os resultados mostram que o desenho do programa é fundamental. Programas focalizados em determinados grupos – como, por exemplo, crianças de famílias pobres –, nos quais, caso exista excesso de demanda, a escolha é feita por sorteio aleatório, e que não permitem a cobrança adicional de mensalidades e o valor do voucher é inversamente proporcional à renda per capita familiar, não mostram evidência de aumento da desigualdade (Colômbia). O oposto ocorre se essas condições são rompidas (Chile).

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Em outras palavras, ainda que as evidências não sejam completamente favoráveis à adoção de vouchers, as avaliações de programas atualmente existentes indicam que este é um experimento com grande probabilidade de ser bem-sucedido, desde que focado em crianças de famílias pobres, em países emergentes e desenhados de tal forma a evitar aumento da desigualdade. Condições que fazem do Brasil um candidato perfeito para adotá-los.

* PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO, É ECONOMISTA CHEFE DA GENIAL INVESTIMENTOS

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