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Jornalista e comentarista de economia

Opinião|Vulnerabilidade ao novo coronavírus e à economia

A vacina não livrará o Brasil apenas do pesadelo da doença, mas também do agravamento das finanças públicas

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Atualização:

Em audiência pública na Comissão Mista do Congresso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, expôs a relação íntima entre a guerra sanitária contra a covid-19 e o desempenho da economia: “Só com a vacina estaremos livres desse pesadelo; antes disso, continuamos vulneráveis”. A vulnerabilidade da sociedade não é apenas ao novo coronavírus; é, também, à economia.

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Trata-se de avaliação bem diferente da que foi feita há dias pelo presidente Bolsonaro, para quem vacina boa tem de necessariamente a ver com a cor do rótulo da ampola: se for chinesa, não presta, sabe-se lá por quê. Não importa para ele se o gato caça ou não a rataiada, mas a cor da pelagem do felino.

Quando desabaram nestas quarta e quinta-feira, os mercados se comportaram como se a segunda onda de covid-19, que atinge fortemente a Europa, passasse a exigir novas medidas de isolamento social também por aqui – como Alemanha e França já decretaram e, provavelmente, os Estados Unidos decretarão logo após as eleições.

Por enquanto, não há sinal de segunda onda no Brasil. Mas, se ela acabar chegando, será inevitável reforçar as medidas de isolamento social. E, nessas condições, a atividade econômica pagará outra vez seu preço, como começa a pagar na Europa.

Nesse sentido, a partir de quando estiver disponível, a vacina não livrará o Brasil apenas do pesadelo da doença, como lembrou o ministro Paulo Guedes, mas, também, de nova paradeira e do agravamento das condições das finanças públicas. Infelizmente, a despeito de algumas declarações de políticos, não há garantia de que a vacina, seja qual for sua procedência, estará amplamente disponível no Brasil ainda neste fim de ano.

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Paulo Guedes, ministro da Economia de Jair Bolsonaro Foto: Ueslei Marcelino/ Reuters

Foi por levar em conta essa vulnerabilidade potencial que o Banco Central entendeu que devesse manter uma política de dinheiro mais solto (e de juros básicos de apenas 2,0% ao ano), sem prazo para revertê-la.

Mas isso não basta. Vai ser preciso atacar a frente fiscal. A maneira mais eficaz de fazer isso é dar andamento firme às reformas administrativa e tributária. Se não houver uma sinalização clara nessa área, a falta de confiança poderá se acentuar, o dólar voltará a empinar e será difícil evitar que a alta dos importados e dos demais produtos cotados em dólares (combustíveis, fertilizantes, derivados de soja, milho e trigo) não seja repassada para os preços finais em reais e volte a puxar pelo custo de vida do consumidor.

Sinalização clara é o que a gente não tem do presidente Bolsonaro. Cada dia fala uma coisa. Com a mesma facilidade com que assina um decreto pela manhã, recua à tarde, como aconteceu na quarta-feira com a privatização do SUS. A sensação de falta de rumo continua forte no País.

O momento é, também, de grande incerteza para todos aqueles que mantêm uma reserva pessoal ou familiar aplicada no mercado financeiro. A inflação do ano vai para a altura dos 3%. No entanto, os juros básicos (Selic) estão parados nos 2,0% ao ano. Ou seja, os poupadores veem a enchente chegar e levar as coisas deles, sem terem para onde arrastar o sofá da sala, sem terem para onde fugir. É mais um fator que puxa pelo aumento das cotações do dólar.

CONFIRA

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» Baixa oscilação

Apesar da forte turbulência nos mercados, a percepção de risco dos títulos do Tesouro do Brasil de 5 anos não sofreu nos últimos dias. Começou outubro à altura dos 250 pontos, mas ficou na casa dos 219,61 pontos nesta quinta-feira, mostrando risco mais baixo. Esse número diz que, para ficar com títulos do Tesouro do Brasil de 5 anos, o investidor internacional exigiu uma remuneração de 2,1961 pontos porcentuais acima da remuneração de referência, que é a do título do Tesouro dos Estados Unidos.

Opinião por Celso Ming

Comentarista de Economia

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