Apesar do bom humor do exterior - e da recepção positiva do texto da PEC dos precatórios pelo mercado - o dólar voltou a ganhar força ante o real, fechando em alta de 0,57%, cotado a R$ 5,5174 - maior valor desde 20 de abril, quando a moeda encerrou cotada a R$ 5,5603. O dia foi marcado pela expectativa dos investidores com dados sobre as economias americana e brasileira, que saem amanhã. Também na espera, a Bolsa brasileira (B3) terminou o dia apenas com variação positiva, em leve ganho de 0,02%, aos 110.585,43 pontos.
O apetite por risco no exterior foi apoiado pela notícia dos Estados Unidos de que há um acordo entre governo e oposição para elevar o teto da dívida, ao menos até dezembro. Em resposta, em Nova York, Dow Jones subiu 0,98%, o S&P 500, 0,83%, e o Nasdaq, 1,05%. Na Europa, a Bolsa de Londres teve alta de 1,17%, Frankfurt, de 1,85%, e Paris, de 1,65%. Já na Ásia, a Bolsa de Tóquio avançou 0,54% e a de Hong Kong, 3,07%.
"Os investidores continuam otimistas de que os EUA não vão dar o calote em sua dívida depois que os democratas aceitaram o aumento do limite da dívida de curto prazo oferecido pelos republicanos", comenta o analista Edward Moya, da Oanda.
Depois de chacoalhar pela manhã, quando correu entre mínima a R$ 5,47 e máxima a R$ 5,5290, a moeda americana apresentou oscilações modestas ao longo da tarde, flutuando ligeiramente abaixo de R$ 5,50. O dólar futuro para novembro subiu 0,38%, cotado a R$ 5,5380. O índice DXY - que mede o desempenho do dólar frente a seis divisas fortes - trabalhava perto da estabilidade, mas em níveis elevados, na casa dos 94,200 pontos. Entre as divisas emergentes, o real e o peso mexicano amargaram as piores performances.
Impediram os ganhos dos ativos brasileiros hoje, a grande expectativa para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de setembro, que deve trazer o maior resultado para a inflação no mês desde 1994, e os dados do mercado de trabalho dos EUA do mês passado.O resultado irá ajudar o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) a definir se começa em novembro - ou não - a redução do programa de compra de ativos, processo chamado de 'tapering'. Ambos os dados saem amanhã.
A economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte, avalia que a principal pressão sobre a taxa de câmbio vem do exterior, diante da expectativa pelo 'tapering', em meio a indicadores positivos da economia americana. "Isso impacta em cheio as moedas emergentes. O tema orçamentário nos EUA pesa pouco, mas, de qualquer forma, aumenta a volatilidade", afirma Consorte.
Para o gerente de câmbio da corretora Ourominas, Mauriciano Cavalcanti, a taxa de câmbio mudou de patamar e deve operar em uma faixa entre R$ 5,45 e R$ 5,55 daqui para frente. "Não vamos ver esse dólar voltar para o nível de R$ 5,30. A cautela é muito grande com os números ruins da economia brasileira", diz Mauriciano, acrescentando que o desgaste adicional de Paulo Guedes, após a revelação de que o ministro da Economia tem conta offshore em um paraíso fiscal, aumenta o desconforto dos investidores.
Consorte ressalta que o "pano de fundo do Brasil" segue muito ruim. Após a decepção com os dados das vendas no varejo em agosto, divulgados ontem, pode haver novas revisões para baixo nas expectativas para o crescimento do PIB. "Tudo isso em um cenário de pressão inflacionária e ambiente político pouco propício para evolução de reformas. O resultado é um dólar acima de R$ 5,50".
Por aqui, o mercado recebeu moderadamente bem o parecer do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) sobre a PEC dos Precatórios, que trouxe várias modalidades de pagamento aos credores, conforme havia sido negociado entre Guedes, e os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL).
O encontro de contas poderá ocorrer, por exemplo, via quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente. Como mostrou o Estadão/Broadcast, a medida abre um espaço de R$ 51 bilhões no teto de gastos. O desenlace da PEC dos Precatórios e a aprovação da reforma do Imposto de Renda no Senado são fundamentais para que haja uma definição sobre o valor do Auxílio Brasil, o programa social que substituirá o Bolsa Família. Nos bastidores, há também negociações para prorrogação do auxílio emergencial.
A avaliação nas mesas de operação, as indefinições no campo fiscal, aliadas ao ambiente de inflação elevada e indicadores fracos de atividade, jogam contra o real, que não deve encontrar espaço para uma melhora significativa em um momento de menor liquidez no mundo.
Bolsa
O Ibovespa andou de lado hoje. Na máxima da sessão, o índice subia quase 0,8%, mas não conseguiu sustentar os ganhos. No mês, o índice cede 0,35%, com perda de 2,05% na semana e de 7,08% no ano. Entre as ações, Petrobras fechou com sinal misto, com a ON em alta de 0,21%, mas a PN em queda de 0,14%, apesar dos ganhos dos contratos de petróleo no exterior.
Em Nova York, o WTI para novembro subiu 1,12%, a US$ 78,30 o barril, enquanto em Londres, o Brent para dezembro avançou 1,07%, a US$ 81,95 o barril. Os contratos foram ajudados pela notícia de que os EUA não devem liberar reservas estratégicas para segurar os preços no mercado internacional. A medida viria para conter os preços do petróleo no exterior, diante das projeções de que o WTI pode bater nos US$ 90 o barril.
A decisão viria também em meio à crise energética que recai sobre os países europeus, que além da escassez, também enfrentam a elevação dos preços do setor, o que pressiona ainda mais a inflação da região. Hoje, o governo russo afirmou que pode elevar a oferta de gás para a Europa, para conter os preços. Um porta-voz do governo disse que existe potencial para isso, a depender da demanda, dos contratos e dos acordos comerciais.
Além das ações de commodities, especialmente mineração, com Vale ON em alta de 2,98%, a retomada ainda que parcial em siderurgia, com Gerdau PN em alta de 1,63%, e em utilities, com ganho de 1,71% para Eletrobras PNB, se impunha ao dia negativo para os grandes bancos com Bradesco PN em baixa de 2,50%, Banco do Brasil ON, de 1,04%, e Itaú PN, de 2,12%, ajudaram a limitar as perdas do Ibovespa.
Destaque hoje para a recuperação em Banco Inter, com a Unit em alta de 12,06% e a PN, de 11,67%, após "a empresa contratar Bank of America, Bradesco BBI, JP Morgan e Itaú BBA para assessorá-la em reorganização societária", observa em nota a Terra Investimentos. A empresa está de saída da B3 rumo à Bolsa de Nova York. /LUÍS EDUARDO LEAL, ANTONIO PEREZ, MAIARA SANTIAGO E IANDER PORCELLA