16 de março de 2022 | 19h19
A guerra no Leste Europeu e os novos surtos de coronavírus na China devem prolongar a inflação no Brasil e no mundo. Assim, a renda fixa - em especial os títulos pós-fixados atrelados ao CDI, Selic e IPCA - continuarão a ter o seu destaque ao longo do ano, principalmente para os investidores que não querem ver grandes oscilações patrimoniais. Já os prefixados exigem mais cautela.
“A pressão inflacionária está atingindo principalmente os produtos que têm o petróleo como matéria-prima e também insumos e commodities que são exportados pela Rússia e pela Ucrânia. Além disso, o governo chinês colocou algumas cidades em lockdown por surtos pontuais de covid, e isso pode causar interrupções nas linhas de produção e na oferta de determinados produtos”, explicou Rodrigo Beresca, analista de Soluções Financeiras da Ativa Investimentos. Soma-se a isso o fato de que o ano eleitoral no País pode estimular medidas populistas por parte do governo, com impactos negativos às contas públicas.
Nesta quarta-feira, 16, o Copom elevou a taxa básica de juro em 1 ponto porcentual, deixando a Selic a 11,75% ao ano. A expectativa de inflação para este ano disparou a 6,45% no Boletim Focus mais recente, muito acima do teto da meta, de 5%.
Nos cálculos do professor de Finanças da FGV-SP Fabio Gallo, a poupança é o único investimento de renda fixa que não deve ter ganhos que batam a inflação. Ele considerou um aporte de R$ 1 mil a ser sacado daqui a um ano.
"Quando fazemos as recomendações de renda fixa, olhamos não só o hoje, mas também o futuro. Nós temos essa tendência de alta da taxa básica de juros e por isso é interessante ter uma parcela da carteira em pós-fixados atrelados ao CDI e à Selic, porque esses ativos vão acompanhar o movimento de alta da taxa de juros. E são os ativos mais conservadores, que oscilam menos", explica Camilla Dolle, head de renda fixa da XP. Esses títulos são recomendados para objetivos de curto prazo.
Na Ativa Investimentos, a aposta é de que a Selic vai atingir o seu pico em junho, aos 13,25% ao ano e permanecer assim em 2022. A queda gradual deve começar a acontecer somente a partir do ano que vem.
Os investidores com objetivos de médio e longo prazo podem fazer aportes em títulos atrelados à inflação, recomenda Rob Correa, analista de investimentos CNPI.
Já os títulos prefixados são mais arriscados. Isso porque, explicou Vinicius Romano, especialista em renda fixa na Suno Research, a rentabilidade desse título fica “travada” na hora do aporte. Se a Selic subir, esse investimento pode ficar desvalorizado; se a Selic cair, aí já há possibilidade de ganho - mas não é esse cenário que se delineia no momento.
O analista de investimentos da Nova Futura Investimentos, Matheus Jaconeli, vê possibilidades de ganhos no setor bancário, de saúde e em empresas com poucas dívidas.
“Alguns bancos ainda estão descontados (com ações mais baratas do que elas realmente valem). O setor de saúde também, e, agora com os protocolos sendo flexibilizados, as pessoas devem voltar a fazer mais exames e cirurgias.”
O minério de ferro também pode ser uma boa aposta, na opinião dele. “No segundo semestre, teremos a reunião do Partido Comunista Chinês, e o governo vai querer entregar um crescimento interessante para o país. Então, se tivermos a redução dos casos de covid por lá, o setor de minério pode ser também uma aposta”, disse Jaconeli.
Na outra ponta, empresas de consumo cíclico devem sofrer, pois, parte do orçamento fica comprometida com inflação, e as pessoas postergam esse tipo de gasto para poder comprar o que é essencial.
Apesar de nos últimos dias o dólar ter tido um movimento de alta, a moeda americana ainda está cotada a um preço mais baixo que no início do ano. Na opinião de Jaconeli, da Nova Futura, esse alívio no câmbio é momentâneo já que, no horizonte, está a percepção de risco com o governo querendo intervir na Petrobras e ampliar o auxílio emergencial, medidas que aumentam a percepção de risco e afugentam o investidor. Ademais, o aumento de juros nos Estados Unidos tornam mais atraentes os títulos americanos, considerados mais seguros.
Rodrigo Beresca, da Ativa, explica como os produtos reagem ao atual cenário econômico. E a plataforma de soluções financeiras Economatica mostra o retorno que cada índice teve em um ano, descontada a inflação.
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16 de março de 2022 | 19h14
Atualizado 16 de março de 2022 | 21h52
BRASÍLIA - Com a inflação sem dar trégua e a guerra no Leste Europeu pressionando ainda mais os preços de alimentos e combustíveis, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) elevou a taxa básica de juros pela nona reunião consecutiva nesta quarta-feira, 16. Com um aumento de 1,00 ponto porcentual, a Selic chegou a 11,75% ao ano, o maior patamar desde abril de 2017 (12,25%).
Mesmo com os choques causados pela invasão russa na Ucrânia, o Copom manteve a promessa de tirar o pé do acelerador. Nas últimas três reuniões, o colegiado havia aumentado a Selic em 1,5 ponto porcentual em cada uma. Após ter chegado à mínima histórica de 2,00% ao ano durante a pandemia, a taxa básica já acumula um ajuste de 9,75 pontos desde março passado.
BC se reúne para decidir taxa básica de juros desfalcado e sob pressão por inflação em alta
A última vez que houve nove aumentos seguidos (um ano de aperto) foi entre abril de 2013 e abril de 2014. Na época, o avanço foi mais modesto, de 7,25% para 11,00%, ou 3,75 pontos porcentuais, nas vésperas da campanha de reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). O ritmo de alta dos juros deste ciclo já é o maior desde 1999, quando, durante a crise cambial, o BC aumentou a Selic em 20 pontos porcentuais de uma só vez.
O colegiado também avisou que continuará subindo a taxa. Para a próxima reunião, no começo de maio, a sinalização é de nova alta de 1,00 ponto, levando a Selic para 12,75%. O BC pregou cautela, mas deixou claro que, sob a incerteza ampliada com a guerra, poderá estender o aperto monetário o quanto for necessário para trazer as expectativas de inflação, principalmente de 2023, para perto da meta.
“O Copom avalia que o momento exige serenidade para avaliação da extensão e duração dos atuais choques. Caso esses se provem mais persistentes ou maiores do que o antecipado, o Comitê estará pronto para ajustar o tamanho do ciclo de aperto monetário”, afirmou o BC, após a reunião.
O aviso de que os juros terão mais um aumento de 1,00 ponto porcentual em maio mostra que o BC está comprometido a fazer o que for preciso para trazer a inflação de volta ao centro da meta no ano que vem. A avaliação foi feita pela economista-chefe do Santander, Ana Paula Vescovi, após leitura do comunicado do Copom.
Conforme a economista, que foi secretária do Tesouro no governo Michel Temer, a atuação dos bancos centrais diante da escalada das commodities após a guerra na Ucrânia é para inibir os efeitos secundários do choque de oferta. No Brasil, o BC vai na mesma direção, e deve deixar a porta aberta, conforme expectativa de Vescovi, para mais um aumento de 0,5 ponto porcentual após a reunião de maio, para quando o Copom já indicou que levará a Selic para 12,75%.
Segundo a economista-chefe do Santander, o movimento do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) de começar a subir os juros ontem, indicando mais seis aumentos dos fed funds até o fim do ano, coloca pressão sobre a Selic.
A avaliação dela é de que o ciclo de alta da Selic termina com a taxa a 13,25%, o que deve ser suficiente para que a inflação possa convergir ao centro da meta de 2023 (3,25%).
O Brasil se consolidou como sede de uma das maiores taxas de juros reais (descontada a inflação) do mundo. Cálculos do site MoneYou e da Infinity Asset Management indicam que o juro real brasileiro está agora em 7,10% ao ano. É o segundo juro real mais alto, entre as 40 economias mais relevantes. Só fica atrás da Rússia, que recentemente teve de elevar sua taxa nominal de 9,5% para 20% e estabelecer o controle de capitais, sob a guerra. / COLABOROU EDUARDO LAGUNA
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