Aos três meses de crise sanitária e de ebulição política, soma-se à esperança do enfrentamento técnico do coronavírus a expectativa de alguma estabilidade para que os consumidores voltem a planejar seus gastos. Perguntamos a André Friedheim, presidente da Associação Brasileira de Franchising (ABF), qual é a perspectiva para o setor de franquias. Ele diz que é esperado que no segundo semestre a situação, pelo menos, pare de piorar. E, assim, 2021 pode voltar a mostrar resultados positivos.
Quais os impactos mais significativos da crise no universo das franquias?
Nosso estudo mais recente, do mês de abril, mostra uma queda média no faturamento de 48,2% das redes de franquia. Essa queda se deve, basicamente, às políticas de isolamento social, principalmente o fechamento dos shoppings – as redes de franquia representam cerca de 30% das lojas das praças de alimentação e das lojas-satélites. Em maio e junho, começamos a sentir também um maior retraimento por parte do consumidor, seja pela situação de insegurança, seja pela perda de renda. No entanto, é importante ressaltar que temos alguns segmentos um pouco fora dessa curva: supermercados e farmácias passaram por picos de demanda; limpeza e conservação, por questões sanitárias, e B2B, que tem contratos mais longos, também apresentaram melhores resultados. Em abril, o setor fechou 0,5% de unidades, muito menos do que negócios isolados, mostrando que, embora não estejamos imunes, a franquia tem consideravelmente menos riscos, por dar acesso a negócio, produto ou serviço formatado e testado, ao compartilhamento de recursos e estratégias e, principalmente, à orientação de um empresário mais experiente, o franqueador.
A sobrevivência tem mais a ver com o ramo de atividade ou com a gestão?
Os dois aspectos têm importância. De um lado, estão sofrendo mais ramos que não tinham se digitalizado suficientemente ou de baixa diferenciação e grande concorrência. De outro, uma má administração de caixa, demora na tomada de decisões e não acompanhamento de indicadores e do comportamento do consumidor também colocaram negócios em risco. Deve ser feita uma análise dupla.
Quais são as dicas práticas para este momento?
A principal é ter uma agenda/plano de sobrevivência do negócio no curto e médio prazo. Isso inclui foco na gestão de caixa, redução de custos, busca por novos canais de vendas e parceiros, principalmente os digitais, e atração de consumidores. Rever processos e práticas para que sejam mais ágeis e passíveis de medir resultados ajuda muito, porque o cenário muito instável demanda ajustes constantes.
No médio prazo, o senhor acha possível falar em retomada segura?
Nos próximos seis meses, a expectativa é de que haja uma estabilização, que a questão das restrições ao comércio de rua e dos shoppings esteja mais consolidada e assimilada pela população e que o tráfego de pessoas vá se recuperando, assim como os hábitos de consumo. Apesar da situação, o desejo de compra reprimido é muito grande e não apenas em alimentação e turismo, mas também nas áreas de saúde, beleza, bem-estar, moda. Com isso, esperamos que o setor volte ao positivo em 2021, sendo que o segundo semestre de 2020 já será melhor.
Como se informar sobre gestão de negócio, em meio a tantas incertezas?
Duas boas referências são escolas de negócio, nacionais e internacionais, e associações setoriais e de apoio, como o Sebrae. Só aí o empreendedor já encontra um universo de informação chancelada pela pesquisa acadêmica ou pela prática. Por causa da quarentena, muitos cursos e conteúdos foram disponibilizados gratuitamente. A imprensa também cumpre um papel fundamental ao disseminar essas informações e buscar a ligação com os casos reais. Por fim, os eventos digitais têm proliferado muito e com grandes empresários e especialistas. É um verdadeiro termômetro do mercado.
Há espaço para negócios que não investirem na responsabilidade social e ambiental?
Dentre as muitas lições da pandemia, essa talvez tenha sido a principal: quem tem um firme propósito tem mais chances de manter suas operações. O aspecto social está intimamente ligado a isso. Não por acaso, vimos várias redes se engajando em campanhas e iniciativas de impacto socioambiental mesmo em um período tão desafiador.
Mitos e Verdades
"Abrir franquia é mais fácil que empreender sozinho"
VERDADE: É mais fácil principalmente por causa do suporte que a pessoa recebe da rede.
"É fácil empreender"
MENTIRA: É um risco que faz sentido se alinhado com o propósito do investidor.
"Franqueador e franqueado precisam ‘combinar’"
VERDADE: A natureza do negócio faz com que sejam interdependentes.
"O franqueado é funcionário do franqueador"
MITO: Ele precisa seguir regras da rede, mas tem autonomia.
"Franquias de sucesso são investimento mais seguro"
VERDADE: Elas têm um modelo de negócios robusto.
"Vou abrir franquia e trabalhar pouco"
MITO: Tem de colocar energia. No início, os turnos têm em média 12 e até 16 horas. (Livia Andrade; fonte: Thelma Rocha, professora da ESPM)