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A guerra entre Bruxelas e a Costa Oeste dos EUA

Há anos os grandes grupos mundiais tratam com desprezo as queixas europeia

Por Gilles Lapouge
Atualização:

Margrethe Vestager é uma cidadã dinamarquesa. Mora em Bruxelas, pois é a comissária da concorrência da União Europeia (UE). Não é de falar muito, mas quando fala, sai de baixo! A plateia treme.

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Como tremeram, por exemplo, nesta semana, os financistas do Gafa, sigla sob a qual se abrigam os gigantes norte-americanos da informática Google, Apple, Facebook e Amazon. 

Vestager lembrou algumas verdades a dois desses gigantes - Apple e Amazon. A comissária informou que a Amazon recebeu subsídios ilegais da parte de Luxemburgo e terá assim de devolver € 250 milhões ao grão-ducado. 

Em 2003, foi assinado um acordo fiscal entre Amazon e Luxemburgo, que permitiu à Amazon deixar de pagar durante oito anos (de 2006 a 2014) a maior parte dos impostos sobre seus negócios na UE. Deixemos de lado os detalhes do montante fiscal, de uma complexidade extrema, para chegar à conclusão: a Amazon, durante oito anos, beneficiou-se de taxas fiscais de apenas 7,5%.

Em seguida, Vestager dirigiu o fogo ao segundo gigante, a Apple. Nesse caso, não se trata de Luxemburgo, mas da Irlanda, país no qual a Apple usufrui de vantagens fiscais exorbitantes. No ano passado, a Comissão Europeia havia determinado a Dublin que recuperasse € 13 bilhões em isenções fiscais usufruídas pela Apple. Um ano depois, sabem quanto foi devolvido? Zero. Madame Vestager não está nada contente. Passou um sabão nos executivos da Apple.

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Está claro que os europeus começam a se irritar. Há anos os grandes grupos mundiais, especialmente da Costa Oeste americana, tratam com desprezo as queixas europeias. E há anos a Europa não ousava responder à altura às grosserias. Mas os tempos mudaram. Hoje a UE está bem mais audaciosa. Ela fustiga o Gafa. 

No momento, ainda que a arrogância da Apple e da Amazon pareça continuar intacta, os gigantes americanos baixaram o tom do desprezo para com a União Europeia. Será que de repente caíram na real e passaram a se envergonhar das antigas práticas? Nem tanto. Esse pessoal é arrogante de nascença e não tem nenhuma vontade de se tornar mais polido. Entretanto, quando a conjuntura fica desfavorável a eles conseguem se esforçar e até sorrir de vez em quando, mostrar-se corteses. 

Vivemos hoje, sem dúvida, um desses momentos decisivos. Os grandes clientes do mundo digital estão diminuindo. O mercado americano está perto da saturação. A China, ao contrário da Europa, dotou-se de empresas capazes de resistir às americanas, como Alibaba (internet) e Tecent (videogames). Em consequência, está mais fechada que nunca.

O mercado europeu está em boa forma. A retomada econômica é vigorosa. A Europa, consciente de que atravessa uma conjuntura favorável, ousa mostrar a cara e desafiar os monstros do Gafa. E já com alguns sucessos. A Amazon, por exemplo, está enviando “embaixadores” mais amáveis à França. Cordialmente, eles abrem novos entrepostos logísticos e propõem alianças a grandes distribuidores franceses, do Carrefour ao sistema U. 

Não dá, é claro, para se confiar no pessoal do Gafa. Mesmo que eles escondam as garras quando os ventos estão contra, sua ânsia de poder e hegemonia permanece intacta. Podemos, pois, esperar que logo retomem a ofensiva contra os europeus que tiveram a indelicadeza de exigir que os americanos sejam tratados, no plano fiscal europeu, com o mesmo rigor que os próprios europeus. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

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*E-MAIL: GILLES.LAPOUGE@WANADOO.FR

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